África do Sul: Crescem manifestações contra estrangeiros
Milton Maluleque (Joanesburgo)
30 de setembro de 2020
"Sul-africanos primeiro" deu o mote a vários protestos xenófobos convocados no Twitter, na terra de Nelson Mandela. Manifestantes acusam estrangeiros de serem responsáveis por tráfico humano e abuso de drogas.
Publicidade
As manifestações pacíficas contra estrangeiros que estão a ter lugar nos últimos dias na África do Sul são sinais de que novos ataques xenófobos poderão ocorrer brevemente no país, defendem analistas.
Estas manifestações acontecem numa altura em que crescem nas redes sociais alegações de que estrangeiros estão engajados no tráfico humano na África do Sul. Estas acusações são rejeitadas pela polícia, que classifica de exagero os dados veiculados nas redes sociais.
As demonstrações foram convocadas através do Twitter com o uso da "hashtag" #PutSouthAfricansFirst, "Sul-africanos primeiro". Na semana passada, o líder do movimento Ação para a Mudança, Simon Nhlapo, exigiu o pedido de desculpas pelas alegadas "atrocidades" cometidas por nigerianos na África do Sul.
Nhlapo estava entre os manifestantes, que entoando canções xenófobas, marcharam até a embaixada nigeriana, em Joanesburgo, acusando estrangeiros de serem responsáveis pelo tráfico humano, abuso de drogas, violência contra mulheres e problemas no acesso a serviços básicos.
"As mães sul-africanas todas as noites dormem com lágrimas nos olhos, isto porque as suas filhas são exploradas como prostitutas pelos nigerianos", argumenta o líder do movimento.
Ódio e violência contra migrantes na África do Sul
04:50
Opinião pública manipulada?
A África do Sul regista um histórico do uso da internet para a manipulação da opinião pública em torno da raça, etnia e origem. E estas campanhas acontecem com frequência quando altas figuras políticas são implicadas em atos de corrupção, defende o Consórcio para Refugiados e Imigrantes.
Publicidade
Nilton Martins, moçambicano radicado na África do Sul há várias décadas, diz-se aterrorizado pelo sentimento anti-estrangeiros no país, que tende a aumentar nos últimos tempos.
"A gente já vem sofrendo discriminações a nível nacional, então não há nada que possa fazer, na minha opinião, a não ser migrar-se do país e arranjar outro local onde as condições de vida sejam mais seguras", analisa.
Sul-africanos defendem repatriamento
"O povo está a mudar, o país está mudado, não tenho um meio alternativo de como me safar, porque acho que não tem volta", conclui o moçambicano.
Em 2018, um inquérito levado a cabo pelo Conselho de Pesquisa de Ciências Humanas constatou que grande parte dos sul-africanos detinham pensamentos negativos acerca dos estrangeiros, e a solução comum para o fim da xenofobia era o repatriamento dos migrantes.
A próxima marcha está agendada para 16 de outubro e terá como destino os Ministérios do Trabalho e do Interior para forçar o Governo a "apertar" o cerco contra imigrantes.
Protesto contra o racismo nos cinco cantos do mundo
A morte de George Floyd move pessoas em todo o mundo. Apesar das restrições devido à pandemia da Covid-19, centenas de milhares de manifestantes decidiram sair às ruas e protestar contra o racismo sistémico.
Foto: picture-alliance/AP Photo/T. Hadebe
Lisboa: Agir agora!
Embora a manifestação não tenha sido autorizada, a polícia permitiu que os participantes avançassem. Em Portugal, também há violência policial contra a população negra. Em janeiro de 2019, quando centenas de pessoas se manifestaram espontaneamente, após um incidente no bairro da Jamaica, a polícia disparou balas de borracha.
Foto: picture-alliance/NurPhoto/J. Mantilla
Paris: Protesto no "Champ de Mars"
Nos últimos dias a polícia francesa tem dispersado manifestantes com gás lacrimogéneo nas manifestações nas proximidades da Torre Eiffel e em frente à embaixada dos EUA. No entanto, milhares de pessoas saíram à rua - mesmo para além de Paris - contra o racismo. A violência policial contra a população negra é particularmente generalizada nos subúrbios.
Foto: picture-alliance/Photoshot/A. Morissard
Manifestação apesar da proibição
A Bélgica, assim como a maioria dos países europeus, tem uma quota-parte na exploração e subjugação colonial de outros continentes. A atual República Democrática do Congo foi, em tempos, propriedade privada do Rei Leopoldo II, que estabeleceu um regime racista. Em Bruxelas, Antuérpia e Liège, houve manifestações contra o racismo, apesar das proibições impostas devido à Covid-19.
Foto: picture-alliance/abaca/B. Arnaud
Munique: Baviera colorida
Uma das maiores manifestações da Alemanha teve lugar em Munique, onde se reuniram 30.000 pessoas. Colónia, Frankfurt e Hamburgo também foram palcos de grandes manifestações. Em Berlim, a polícia teve de bloquear temporariamente as estradas de acesso à Alexanderplatz, porque havia demasiadas pessoas.
Foto: picture-alliance/Zumapress/S. Babbar
Viena: 50 mil contra o racismo
Na capital austríaca de Viena, reuniram-se 50 mil pessoas, segundo a polícia local. Esta foi uma das maiores manifestações dos últimos anos, incluindo o escândalo de Ibiza e a espetacular implosão da coligação de governo de direita em 2019.
Foto: picture-alliance/H. Punz
Sófia: Oposição ao racismo
Como a maioria dos países europeus, a Bulgária proíbe a realização de agrupamentos com mais de dez participantes. No entanto, centenas reuniram-se na capital da Bulgária, Sófia. Juntas, gritaram as últimas palavras de George Floyd antes de morrer: "Não consigo respirar", mas também chamaram a atenção para o racismo na sociedade búlgara.
Foto: picture-alliance/AA
Turim: Protesto com máscara
Esta mulher em Turim agrafou a sua preocupação política à mascára necessária num dos países mais afetados pela Covid-19: "As vidas negras também contam em Itália". As manifestações, incluindo em Roma e Milão, serão os maiores aglomerados registados desde o início das medidas de combate ao coronavírus. A Itália é um dos principais países de acolhimento de emigrantes africanos da União Europeia.
Foto: picture-alliance/NurPhoto/M. Ujetto
Cidade do México: Floyd e Lopez
No México, não é apenas a morte de George Floyd que está a perturbar o país, mas também o destino semelhante do pedreiro Giovanni Lopez. Foi detido em maio, no estado ocidental de Jalisco, porque não estava a usar máscara. Presume-se que morreu vítima de violência policial. Após a publicação de um vídeo da operação, os manifestantes mexicanos intensificaram os protestos.
Foto: picture-alliance/Zumapress
Sydney: Racismo contra os aborígenes
O rali em Sydney começou com uma cerimónia tradicional de fumo. Aqui, a solidariedade dos pelo menos 20.000 participantes foi dirigida não só a George Floyd, mas também aos australianos da população aborígene, que também foram vítimas de violência policial racista. Os manifestantes exigem que ninguém continue a morrer sob custódia policial.
Foto: picture-alliance/NurPhoto/I. Khan
Pretória: Com o punho levantado
O punho levantado no ar é um símbolo do movimento "Black Lives Matter". Mas o gesto é muito mais antigo. Quando o regime do apartheid na África do Sul libertou Nelson Mandela da prisão, em fevereiro de 1990, ele levantou o punho no seu caminho para a liberdade, tal como este manifestante em Pretória. Na África do Sul, os brancos continuam a ser frequentemente favorecidos.