Jacob Zuma exige "juiz imparcial" em comissão anticorrupção
Milton Maluleque (Joanesburgo)
16 de novembro de 2020
Antigo chefe de Estado sul-africano compareceu esta segunda-feira (16.11), após vários adiamentos, perante a comissão Zondo, que investiga a corrupção no Estado durante os mandatos presidenciais de Jacob Zuma.
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A equipa de advogados de Jacob Zuma submeteu à comissão de inquérito Zondo um requerimento de mais de 100 páginas, solicitando formalmente que o seu presidente, o juiz Raymond Zondo, peça escusa da auscultação do ex-Presidente da África do Sul por conflito de interesse.
O requerimento faz alusão à assessoria prestada pelo atual vice-presidente do Tribunal Constitucional e presidente da comissão de inquérito batizada com o seu apelido, a Zuma e ao Congresso Nacional Africano (ANC) quando este ainda era advogado de uma firma na cidade de Durban nos anos 1990.
Para além de ter sido membro do ANC, alega-se ainda que o juiz Zondo tenha um filho com a irmã de uma das esposas de Jacob Zuma, um relacionamento que terminou há vários anos, o que, segundo os advogados, coloca em causa a imparcialidade do juiz.
Raymond Zondo, no entanto, desvaloriza as alegações: "Enquanto eu ainda estava no consultório privado como advogado, interagi com a liderança do ANC em KwaZulu-Natal incluindo o senhor Zuma, em casos relacionados com o ANC e casos civis, entretanto o senhor Zuma nunca foi meu cliente em sua capacidade pessoal".
Defesa condena "castigo"
Desde que a comissão de inquérito foi instaurada, a 21 de agosto de 2018, pelo Presidente Cyril Ramaphosa, das 257 testemunhas ouvidas mais de 30 mencionaram o Presidente Zuma, daí que o seu testemunho é de maior importância. No entanto, desde julho de 2019 que o ex-Presidente se recusa a comparecer, alegando questões de saúde ou da sua participação em outros processos judiciais.
Um dos advogados da equipa de Zuma, Muzi Sikhakhane, alegou que o seu cliente sofre não só por ter sido demitido por acusações de envolvimento em escândalos de corrupção e substituído por Cyril Ramaphosa em 2018, mas também pelas insinuações levantadas ao longo do inquérito.
˝Quando o senhor Zuma está sentado e a acompanhar a partir de casa as alegações de que os seus anos como Presidente foram nove anos perdidos, digo que os seus comentários, na sua ausência, fazem com que ele sinta que o fórum serve para o castigar e concordar com as pessoas que tem o objetivo de o denegrir e de forçar o projeto de o destruir como símbolo político na sociedade", sublinhou.
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Milhões gastos na investigação são "gota no oceano"
A antiga Provedora de Justiça Thuli Madonsela recomendou a criação de uma comissão de inquérito para investigar o Presidente Jacob Zuma, suspeito de ter favorecido a delapidação dos bens do Estado através de atos ilícitos, ao favorecer o trio de irmãos Gupta, de origem indiana, que são sócios de negócios de Duduzane Zuma, filho do ex-chefe de Estado.
Os trabalhos desta comissão devem terminar a 31 de março do próximo ano, mas multiplicam-se as críticas devido aos milhões de Rands, moeda local, gastos ao longo destes dois anos.
Para o constitucionalista Paul Hoffman, no entanto, "os milhões gastos nos peritos, no pagamento da renda do espaço e nos investigadores são uma gota no oceano se compararmos com os triliões que foram saqueados e que podem ser recuperados caso uma investigação eficaz venha a ter lugar".
Jacob Zuma, responde também a um processo de corrupção na compra de armamento orçado em cerca de 2.5 mil milhões de dólares, ao receber subornos do grupo francês Thales na década de 1990.
Famílias influentes em África
Para muitos, a política continua a ser um negócio de família: o filho recebe a Presidência de herança, a filha dirige a empresa estatal, a esposa torna-se ministra. Há vários exemplos.
Foto: picture-alliance/dpa
Filha milionária
Isabel dos Santos, a filha mais velha do Presidente angolano, é uma das dez pessoas mais ricas de África. Do império da empresária constam a maior empresa de telecomunicações do país e uma cadeia de hipermercados. Além disso, dos Santos lidera a petrolífera angolana Sonangol. O irmão José Filomeno dirige o Fundo Soberano de Angola, que gere mais de cinco mil milhões de dólares.
Foto: picture-alliance/dpa
O meu pai decide…
Teodoro Nguema Obiang Mangue é vice-Presidente da Guiné Equatorial – e o filho do chefe de Estado. O pai, Teodoro Obiang Nguema Mbasogo, dirige o país desde 1979. O seu enteado, Gabriel Mbaga Obiang, é ministro das Minas e Hidrocarbonetos. A petrolífera estatal GEPetrol é controlada pelo cunhado do Presidente, Nsue Okomo.
Foto: Picture-alliance/AP Photo/F. Franklin II
O meu filho, o guarda-costas
Muhoozi Kainerugaba é o filho mais velho do Presidente do Uganda, Yoweri Museveni, que está desde 1986 no poder. Ele é um oficial superior no Exército ugandês e comanda a unidade especial responsável pela proteção do chefe de Estado. A mulher de Museveni, Janet, é ministra da Educação e do Desporto. O cunhado, Sam Kutesa, é ministro dos Negócios Estrangeiros.
Foto: DW/E. Lubega
Uma irmã gémea influente
Jaynet Désirée Kabila Kyungu é filha do ex-Presidente congolês, Laurent Kabila. Agora, é o seu irmão gémeo, Joseph Kabila, que governa o país. Jaynet está no Parlamento; além disso, tem uma empresa de comunicação. Os "Panama Papers" revelaram que ela foi co-presidente de uma empresa offshore que terá tido participações no maior operador móvel no Congo.
Foto: Getty Images/AFP/J. D. Kannah
De secretária a primeira-dama
Grace Mugabe é a segunda mulher do Presidente zimbabueano, Robert Mugabe. Começaram a namorar enquanto ela ainda era a sua secretária. Entretanto, Grace é presidente da "Liga das Mulheres" do partido no poder e tem bastante influência. Grace, de 51 anos, é vista como a sucessora do marido, de 92 anos, embora ela tenha afastado essa hipótese.
Foto: picture-alliance/AP Photo/T. Mukwazhi
A ex-mulher ambiciosa
Nkosazana Dlamini-Zuma foi a primeira mulher eleita como presidente da Comissão da União Africana. Antes, foi ministra dos Negócios Estrangeiros no Governo do Presidente sul-africano Thabo Mbeki. Foi também ministra do Interior no Executivo do ex-marido, Jacob Zuma. O casamento desfez-se antes de Dlamini-Zuma ocupar esses cargos ministeriais.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Prinsloo
A empresa familiar, o Estado
Nas mãos da família do Presidente da República do Congo, Denis Sassou Nguesso, estão numerosas empresas estratégicas e altos cargos na política. O irmão Maurice é dono de várias empresas, a filha Claudia (na foto) dirige o gabinete de comunicação do pai e pensa-se que o filho Denis Christel esteja já a ser preparado para assumir a Presidência.
Foto: Getty Images/AFP/G. Gervais
Autorizado: Presidente Bongo II
O autocrata Omar Bongo Ondimba governou o Gabão durante 41 anos até falecer, em 2009. Numas eleições polémicas, em que bastou uma maioria simples na primeira volta, o filho do ex-Presidente, Ali Bongo, derrotou 17 opositores. Ele foi reeleito em 2016. A família Bongo já governa o país há meio século.
Foto: Getty Images/AFP/M. Longari
Tal pai, tal filho
Dos cerca de 50 filhos do ex-Presidente do Togo Gnassingbé Eyadéma, Faure Gnassingbé foi o único a enveredar pela política. Entretanto, governa o país. Os pais dos atuais chefes de Estado do Quénia e do Botswana também já tinham estado na Presidência.