Depois de a Europa ter endurecido a sua política de migração, cada vez mais migrantes africanos tentam fugir em direção aos EUA. Redes de tráfico tornaram-se "mais inteligentes".
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No início de julho, as autoridades do México informaram que o número de migrantes africanos no país triplicou. Já são quase duas mil pessoas e a maioria provém de países em crise, como os Camarões e a República Democrática do Congo. Porém, todos têm um objetivo comum: chegar aos Estados Unidos da América.
No Uganda também há muitos africanos que tencionam embarcar em aviões para percorrer meio mundo. É o caso de um eritreu de 23 anos que falou com a DW África em Kampala e, por razões de segurança, preferiu não se identificar. Ele fugiu do serviço militar na Eritreia em setembro passado.
"Não acredito que algo vá mudar na Eritreia nos próximos anos. Pelo contrário, desde a abertura da fronteira, tornou-se ainda pior. Deixámos de ter esperança", lamenta.
Após duas guerras e décadas de conflito, a Eritreia e a Etiópia assinaram um tratado de paz, em julho do ano passado. A fronteira entre os dois países vizinhos foi aberta em setembro. O jovem eritreu de 23 anos fugiu, então, a pé para a Etiópia. Mas encontrou campos de refugiados sobrelotados.
"Rota mais conhecida, praticamente encerrada"
Até agora, a maioria dos eritreus fugia pela Etiópia ou pelo Sudão através do deserto até à costa da Líbia. De lá, arriscam-se na perigosa viagem pelo Mediterrâneo até à Europa. No entanto, esta rota está agora praticamente encerrada: "Os sudaneses capturam os eritreus e deportam-nos. Simplesmente porque querem mostrar à União Europeia que estão a combater a migração ilegal", explica Zecarias Gerrima, vice-diretor da ONG "Africa Monitors", com sede no Uganda.
Isto, apesar de autoridades sudanesas saberem "muito bem que não é seguro para os eritreus retornarem. Enviam-nos para a morte", acrescenta Gerrima.
Desde que mais de um milhão de refugiados chegou à Europa em 2015, a União Europeia assinou acordos com muitos países ao longo das rotas de fuga tradicionais. Os guardas fronteiriços do Sudão, por exemplo, foram treinados para controlar melhor o fluxo de pessoas. Os críticos dizem que o bloco europeu contratou os governos africanos como seguranças.
Mas os planos da União Europeia funcionaram. Há muito menos refugiados a chegar à Europa. Em 2018, cerca de 15 mil eritreus pediram asilo na União Europeia, enquanto que em 2016 este número era duas vezes maior.
Longa odisseia
No entanto, o número de pessoas que fogem da Eritreia não reduziu - pelo contrário: só no Uganda, pelo menos 200 mil refugiados chegaram da Eritreia desde 2018. A maior parte dos que fogem chegam ao Uganda de autocarro depois de cruzar o Quénia. Os responsáveis pelo transporte ganham até 1.500 dólares.
Há pouco tempo, a organização não-governamental de Zecarias Gerrima verificou que as rotas estão a mudar. Agora, os migrantes não se arriscam de barco para cruzar o Mediterrâneo, mas estão a percorrer o mundo de avião. Muitos querem ir para a América do Norte.
Segundo Zecarias Gerrima, os migrantes "voam de aeroportos africanos primeiro para a América do Sul" e "depois seguem para a América Central, principalmente a pé". A rota é feita tentando evitar os postos de controlo dos países. Por isso, a viagem "pode levar um, dois, até mesmo seis meses ou anos", ressalta o diretor da ONG.
África: Nova rota de fuga de migrantes é pelo ar
Negócio lucrativo
Mas esta rota é cara, afirma Zecarias Gerrima.
Os traficantes que já trabalharam no Sudão e na Líbia também se estabeleceram no Uganda. A corrupção desenfreada nos órgãos de migração facilita a obtenção de passaportes e outros documentos. Através de redes de tráfico, os migrantes conseguem os vistos necessários para chegar aos países sul-americanos. A viagem pode custar até 30 mil dólares.
É um bom negócio para os traficantes de pessoas. O órgão responsável pela migração no Uganda diz ter suspeitas que o país esteja a ser usado por redes de tráfico, mas não tem informações precisas.
A política migratória da União Europeia, que pretendia combater as redes de tráfico de pessoas em África, acabou por reforçá-las, "tornando-as mais inteligentes", refere Zecarias Gerrima, da ONG "African Monitors".
Milhares de migrantes atravessam Níger rumo à Europa
São jovens oriundos da África Ocidental e fazem tudo para chegar à Europa. Estão mesmo dispostos a arriscar a vida, atravessando o deserto, rumo ao Mediterrâneo. Mas nem todos são bem sucedidos.
Foto: DW/A. Cascais
Apoio aos "menos bem sucedidos"
Em Niamey existe um centro de acolhimento da Organização Internacional para as Migrações (OIM). Aqui são acolhidos os jovens "revenants", que não conseguiram atravessar o deserto e se veem obrigados a regressar aos seus países de origem. A OIM, que faz parte do sistema das Nações Unidas, dá-lhes abrigo provisório, alimentação e apoio na obtenção de passaportes e outros documentos.
Foto: DW/
À espera do regresso a casa
Os jovens que procuram apoio no centro da OIM vêm dos mais diferentes países: Guiné-Conacri, Mali, Senegal, Gâmbia ou Guiné-Bissau, movidos sobretudo por objetivos económicos. Muitos tiraram cursos superiores, mas não arranjam trabalho. Muitas famílias apostam na emigração de pelo menos um filho. Caso esse filho seja bem sucedido poderá eventualmente apoiar economicamente o resto da família.
Foto: DW/A. Cascais
Frustrados por terem falhado a Europa
Muitos investiram todas as suas economias, pediram dinheiro a familiares e perderam tudo. Agora esperam pelo regresso aos seus países com a sensação de terem sofrido grandes derrotas pessoais. Os assistentes sociais falam de casos em que os jovens não se atrevem a voltar ao seio das suas famílias, "por sentirem vergonha". Precisam de apoio psicológico, mas esse apoio não existe.
Foto: DW/A. Cascais
Otimismo apesar das derrotas
Alguns dos migrantes sofrem lesões e contraem doenças durante a travessia do deserto, mas mesmo assim não perdem o ânimo. Em muitos casos, os jovens tentam várias vezes, ao longo da vida, atingir a terra prometida: a Europa. Muitos nunca o conseguem, mas não perdem o otimismo. Em 2016, a OIM prestou apoio a mais de 6 mil "revenants" - migrantes que não foram bem sucedidos no Níger.
Foto: DW/A. Cascais
Espancado na Líbia
Dumbya Mamadou, de 26 anos de idade, oriundo do Senegal, conseguiu atingir a Líbia, depois de uma "odisseia de 5 dias e 5 noites" pelo deserto do Níger. Mas na Líbia foi maltratado. "Os líbios apontaram-me armas e espancaram-me, não têm respeito pelo ser humano", afirma o jovem. Dumbya volta ao seu país de origem com um sentimento de derrota: "Queria estudar na Europa, agora não sei o que fazer".
Foto: DW/
Roubado no Burkina Faso
Mamadou Barry, de 21 anos, oriundo da Guiné-Conacri, tinha um sonho: aplicar em França os seus conhecimentos de marketing e os seus talentos musicais. Mas a viagem rumo à Europa correu-lhe mal. "Fui roubado no Burkina Faso, o primeiro país pelo qual passei", conta. Mesmo assim, Mamadou aprendeu uma grande lição para a vida: "coisas que nunca teria aprendido se nunca tivesse saído de Conacri".
Foto: DW/A. Cascais
Rap contra a frustração
Mamadou Barry tenta digerir as suas derrotas e decepções através da música. Há três anos que o jovem canta e interpreta temas de rap e hiphop de sua autoria. O seu último tema foi escrito em Niamey, capital do Níger, e tem a seguinte letra: "A migração arrasou-me / e ninguém me pode consolar / O Mar Mediterrâneo já matou muitos / e nós cá continuamos: sem comida, sem cama, sem saúde".
Foto: DW/
Central de autocarros de Niamey: uma placa giratória
É da estação de autocarros de Niamey que partem diariamente centenas de furgonetas, muitas delas repletas de jovens migrantes, em direção ao norte. Os migrantes tornaram-se um fator relevante para a economia do Níger. Há muita gente que ganha a sua vida prestando diversos serviços aos migrantes: viagens pelo deserto, alimentação e mesmo cuidados médicos.
Foto: DW/A. Cascais
Mais migrantes tentam atravessar deserto do Níger
O número de migrantes que viajam através dos vastos territórios desérticos do Níger para chegar ao norte da África e à Europa não pára de aumentar, tendo alcançado os 200 mil em 2016, segundo estimativas do escritório da Organização Internacional para as Migrações. Outras fontes falam de 10 mil migrantes que atravessam o Níger por semana. A situacão geográfica do Níger é o fator determinante.
Foto: DW/A. Cascais
Agadez, o "olho da agulha"
Agadez, cidade desértica no Níger, é um dos principais pontos de trânsito no Saara para os imigrantes em fuga de nações empobrecidas do oeste da África. As "máfias" do tráfico humano têm beneficiado do caos na Líbia para transportar dezenas de milhares de pessoas para o continente europeu em embarcações precárias. Os migrantes muitas vezes sofrem abusos dos passadores.