África: Um exemplo no combate a doenças infeciosas
Martina Schwikowski | kg
26 de abril de 2020
O aumento de infeções pelo novo coronavírus em África eleva a preocupação com um possível desastre. Mas o continente tem experiência exemplar no combate a doenças infeciosas e tem muito a ensinar a países desenvolvidos.
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A crise mundial do novo coronavírus paralisou as metrópoles africanas. Em Joanesburgo, o centro económico da África do Sul, as forças de segurança fazem o controlo do toque de recolher imposto pelo Governo. Na animada Kampala, a capital do Uganda, mercados e lojas estão fechados. Nas ruas, os mototaxistas não podem mais transportar os passageiros, mas estão a fazer serviços de entrega.
Ahmed Ogwell Ouma, vice-diretor do Centro de Controlo e Prevenção de Doenças da União Africana (CDC África), elogia a ação imediata dos governos africanos.
"De facto, aprendemos muito bem a lição de que é preciso agir rapidamente, durante a crise do ébola na África Ocidental em 2014", diz.
"Quando agimos imediatamente, usamos os instrumentos adequados de saúde pública, além do conhecimento científico que mostra-se efetivo. E isso contribuiu muito para os baixos números em África", acrescenta.
África, uma vítima vulnerável?
Gavin Churchyard, presidente do centro de saúde sul-africano Instituto Aurum, sublinha que o controlo de infeções em África não é algo novo para a população, dando o exemplo da longa luta do continente contra a tuberculose. Os materiais educacionais existentes sobre tuberculose e HIV/SIDA também podem ser levemente modificados para colaborar na luta contra a Covid-19.
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"Ao contrário de alguns dos países desenvolvidos, vimos países africanos adotar soluções baseadas em evidências e vimos a liderança emergir nos países africanos, o que não vimos noutros sítios", disse.
Apesar deste sucesso inicial, a Organização Mundial da Saúde (OMS) alerta que a Covid-19 pode atingir África com mais força do que outras regiões do mundo. Mas a África não é uma vítima vulnerável da pandemia, na opinião de Robert Kappel, professor emérito do Instituto de Estudos Africanos da Universidade de Leipzig, na Alemanha.
"Temos uma lição a aprender. Apesar de termos a percepção de que o continente africano não é o continente das pandemias, as crises de saúde e da economia persistem", disse o economista em entrevista à DW. "É um continente que faz as coisas à sua maneira, mas de formas muito distintas", acrescenta.
Ideias inovadoras
Kappel enfatiza o compromisso local das pequenas e médias empresas de inovação. Estas empresas estão a ser atores-chave na produção de máscaras farmacêuticas e de produtos de desinfeção. "É possível aprender muito quando confiamos no conhecimento local que está disponível nos países africanos", diz. As startups também foram parcialmente apoiadas pelos Governos e estão a desempenhar um papel importante no abastecimento da população.
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Os economistas acreditam que a luta bem sucedida de África contra o ébola e outras doenças mostra que o continente não depende essencialmente da ajuda internacional e de enormes somas de dinheiro. Isto seria necessário se o número de infeções aumentasse exponencialmente e a crise económica se acentuasse.
Mas na primeira fase da crise do ébola, comunidades locais, organizações da sociedade civil e autoridades locais conseguiram limitar a propagação da doença. Outra vantagem foi o facto de que o novo coronavírus chegou em África mais tarde do que noutros continentes, deixando mais tempo para o continente africano se preparar.
Em duas cartas abertas apresentadas recentemente, intelectuais africanos enfatizaram que África é tudo menos um continente desamparado. Entre outros, o escritor e músico senegalês Felwine Sarr, o cientista político camaronês Achille Mbembe e o Prêmio Nobel de Literatura na Nigéria Wole Soyinka exigiriam que África "forneça uma resposta fundamental, poderosa e sustentável a uma ameaça real e que não seja exagerada nem subestimada, mas enfrentada racionalmente".
Estes intelectuais exigem que os Governos usem a atual situação para emergir mais fortes desta crise. Os sistemas de saúde teriam de ser redesenhados, as matérias-primas deveriam finalmente ser processadas localmente e a economia tornar-se mais diversificada.
De capulanas a máscaras: alfaiatarias de Moçambique inovam em tempos de Covid-19
Em Moçambique, a grande procura levou muitas pessoas a investirem na produção e no comércio de máscaras faciais feitas de capulana.
Foto: DW/R. da Silva
As máscaras de capulana
As pessoas procuram pelas máscaras na tentativa de conter a propagação do coronavírus no país. O uso da máscara é também uma recomendação do Governo e, em alguns casos, obrigatório. As müascaras feitas de capulana estão a ganhar o mercado, conquistar os clientes e render um bom dinheiro.
Foto: DW/R. da Silva
Nova utilidade da capulana
É a capulanas como estas que muitos produtores recorrem para fabricar o seu mais novo produto: máscaras faciais. A capulana passou a ter mais esta utilidade por causa do coronavírus. O preço da capulana continua a ser o mesmo, custando entre o equivalente a 1,20 a pouco mais de 4 euros, dependendo da qualidade.
Foto: DW/R. da Silva
Tradição em capulanas
Na baixa de Maputo, a "Casa Elefante" é uma das mais antigas casas de venda de capulana da capital moçambicana. Vende variados tipos do produto. São muitas as senhoras que se deslocam ao local para a compra deste artigo para a produção das máscaras. As casas de venda de capulana passaram a ter muita afluência para responderem à grande procura pelos artigos por causa do coronavírus.
Foto: DW/R. da Silva
Produção caseira
Esta alfaiataria caseira funciona há cerca de 15 anos, em Maputo. Antes, a proprietária dedicava-se a costurar uniformes escolares. Por causa do coronavírus, passou a investir mais na produção de máscaras. Ela vende aos informais a um preço de 0,20 euros cada unidade.
Foto: DW/R. da Silva
Aproveitar a demanda
A alfaiataria da Luísa e da Fátima dedica-se à produção de vestuário de noivas e não só, mas também à sua consertação. Quando começou a procura pelas máscaras de produção com recurso à capulana, as duas empreendedoras tiveram que redobrar os esforços para produzi-las sem pôr em causa a confecção habitual. O rendimento diário subiu de cerca de 40 euros para 60 euros, dizem.
Foto: DW/R. da Silva
Produção a todo o vapor
Estes alfaiates, no mercado informal de Xiqueleni, costumam dedicar-se ao ajustamento de roupas de segundam mão, compradas no local. Mas devido à intensa procura pelas máscaras, dedicam a maior parte do tempo a produzir estes protetores faciais à base da capulana. Também eles estão a aproveitar a grande demanda pelo acessório.
Foto: DW/R. da Silva
Informais a vender máscaras
Desde que o Governo determinou a obrigatoriedade do uso de máscaras nos transportes e aglomerações, há pouco mais de uma semana, muitos vendedores informais, mulheres e homens, miúdos e graúdos compraram-nas para a posterior revenda. Um dos principais locais para a venda ao consumidor final são os terminais rodoviários.
Foto: DW/R. da Silva
Máscara para garantir a viagem
Os maiores terminais rodoviários, como por exemplo a Praça dos Combatentes, são os locais de aglomerados populacionais e onde muitos cidadãos acorrem para comprar as máscaras caseiras. Quando um passageiro não tem a máscara, sabe que pode encontrar o produto sem ter que percorrer longas distâncias e garantir o embarque nos meios de transporte.
Foto: DW/R. da Silva
Grande procura em Maputo
Neste "Tchova", carrinho de tração humana, há vários artigos. Os clientes estão a apreciar as máscaras, e não só, que o vendedor informal exibe. Os clientes referem que compram as máscaras não só para evitar a propagação do coronavírus, mas também porque os "chapeiros" exigem o uso das mesmas, sob pena de não permitirem a viagemm de quem não tiver o acessório.
Foto: DW/R. da Silva
Bons rendimentos
Os vendedores informais aproveitam a muita procura pelas máscaras caseiras para juntar ao seu habitual negócio. Jorge Lucas, além de vender acessórios de telefones, diz que "há muita procura" pelas máscaras feitas de capulana e que este negócio está a render "qualquer coisa como 20 euros por dia".
Foto: DW/R. da Silva
Quase 20 euros por dia
António Zunguze vende uma máscara pelo valor equivalente a 0,80 euros. Por dia, diz que consegue levar para casa o equivalente a quase 20 euros e explica que a procura é muita nos mercados informais. António compra as máscaras nas alfaiatarias e vai, posteriormente, revendê-las nos terminais de semi-coletivos.
Foto: DW/R. da Silva
Propaganda, "a alma do negócio"
Este jovem montou um megafone para anunciar que, além das sandálias, já tem igualmente máscaras para a venda. Na imagem, as máscaras podem ser vistas no topo da sombrinha e o megafone instalado no muro. O jovem refere que na sua banca não tem havido muita procura, mas acredita que melhores dias virão.
Foto: DW/R. da Silva
Máscaras até nos salões de beleza
Alguns salões de beleza também não perderam a oportunidade e estão a revender as máscaras. Neste salão, já não há clientes devido ao período de restrições para conter a propagação do coronavírus. O salão também investe na venda de máscaras feitas de capulana.