A maior parte da população angolana é jovem, mas o país deixou de ter um Parlamento Juvenil há mais de uma década. Segundo politólogo, órgão possibilitaria aos jovens pressionar o Governo para resolver problemas.
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O desemprego em Angola é um dos principais problemas que assolam a juventude. 46% dos jovens entre os 15 e 19 anos estão desempregados, segundo dados publicados em 2017 pelo Instituto Nacional de Estatística (INE).
Problemas como este eram debatidos no Parlamento Juvenil, que deixou de existir há mais de uma década por razões até agora desconhecidas. O órgão era constituído maioritariamente por adolescentes e tutelado pelo Instituto Nacional da Criança (INAC). Mas, para o politólogo João Lucombo, "é crucial" reativar o Parlamento Juvenil.
"Do ponto de vista da democraticidade das estruturas, penso ser crucial a existência de um Parlamento Juvenil, porque é um espaço onde a juventude poderá, de forma muito inclusiva, debater os inúmeros problemas de caráter social, económico e político que afligem essa faixa etária", avalia.
Os parlamentos juvenis não promovem só debates - pressionam também os governos. Em Moçambique, por exemplo, o Parlamento Juvenil tem insistido na responsabilização dos autores das chamadas "dívidas ocultas". Em 2015, instou o Presidente Filipe Niusy a interceder pela libertação dos 17 ativistas angolanos acusados de rebelião.
João Lucombo diz que o Parlamento Juvenil é uma escola onde os cidadãos aprendem a "viver na diferença".
"Seria um espaço de treinamento para a juventude, do ponto de vista do interesse nas questões públicas, sociais e políticas. Nós somos ainda um país não muito democrático neste aspeto, e este seria um espaço onde a juventude iria dialogar, treinar, aprender a tolerar, aprender a conviver na diferença, porque seria um Parlamento inclusivo, composto por jovens vindos de várias organizações, políticas ou sociais."
"É crucial a existência de um Parlamento Juvenil em Angola"
Falta espaço para debate
Em Angola, não há Parlamento Juvenil, mas há o Conselho Nacional da Juventude (CNJ). A organização, fundada a 4 de outubro de 1991, é composta por 34 organizações sociais, religiosas e partidárias.
Gaspar dos Santos, responsável da juventude do Partido de Renovação Social (PRS) e representante da sua organização no CNJ, afirma que há pouco espaço para debate no órgão.
"Nós já levamos para lá certos assuntos sociais ligados à juventude, mas os problemas não são resolvidos diretamente", explica o político da terceira maior força da oposição em Angola.
"Temos encontrado diversas situações, que temos que levar diretamente aos nossos partidos políticos", finaliza.
A DW África tentou, sem sucesso, ouvir o Governo angolano e os responsáveis do Conselho Nacional da Juventude.
"Acaba de me matar": jovens angolanos protestam contra o Governo nas redes sociais
Devido à falta de estrutura para lidar com os efeitos da chuva, pelo menos dez pessoas morreram em Luanda. Esta situação levou os cidadãos a iniciarem no Facebook uma onda de protestos denominada "Acaba de me matar".
Foto: Guenilson Figueiredo
Perdas após mau tempo
A morte de uma criança de quatro anos desencadeou a onda de protestos nas redes sociais, com os cidadãos a partilhar imagens fingindo-se de mortos e com a mensagem "Acabam de nos matar", uma forma de repudiar a não resolução dos problemas da população por parte do Governo. Ariano James Scherzie, 19 anos, participou na campanha que rapidamente se tornou viral.
Foto: Ariano Scherzie
Sonhos estão a morrer
Botijas de gás, livros, computadores e blocos de cimento estão entre os objetos usados pelos jovens para protestar contra o que dizem ser más políticas públicas. Indira Alves, 28 anos, lamenta a situação do seu país. "Estou a morrer. Desde as condições de vida até aos sonhos, não é possível o que temos vivido nesta Angola", conta a jovem que abandonou os estudos para trabalhar.
Foto: Indira Alves
Chamar atenção das autoridades
Anderson Eduardo, 24 anos, quis "atingir pacificamente a atenção de alguém de direito a fim de acudir-nos". Decidiu participar no protesto devido ao descontentamento com a governação em Angola. "Eles nos pedem para apertar o cinto, se contentar com o bem pouco, e ao mesmo tempo tudo sobe de preço, alimentos, vestuários, electrodomésticos, e o salário não sobe”, conta o engenheiro informático.
Foto: Anderson Eduardo
Em nome dos colegas e pacientes
Cólua Tremura, 24 anos, conta o porquê de ter participado no protesto: "A minha motivação foram os meus colegas que cancelaram a faculdade por causa da crise, os colegas que morreram antes de realizarem o sonho de serem médicos, os pacientes que apenas vão ao hospital quando estão graves. Acredito que [o protesto] não alcançou os resultados previstos, que era chamar a atenção do Governo".
Foto: Cólua Tremura
Sem reações
Lucas Nascimento, 20 anos, viu no mau tempo e na falta de estrutura razões para aderir ao protesto. O jovem quis dar apoio a uma jovem da região que perdeu a casa num desabamento provocado pelo mau tempo. "Acaba de me matar quer dizer que nós já estamos mal e o Governo está acabando de nos matar", explica. "Até aqui, não notamos nenhuma reação do Governo, talvez possa ser ignorância ou desleixo".
Foto: Lucas Nascimento
Falta justiça
Guenilson Figueiredo, 20 anos, entrou na onda de protestos e teme as consequências que ela pode trazer aos cidadãos que participaram. "Não posso falar muito sobre este protesto, porque nós vivemos num país onde a justiça só funciona contra os pobres".