100 dias de Chapo: Presidente adota medidas de Mondlane?
22 de abril de 2025
Diferenças na campanha, semelhanças no pós-eleições em Moçambique? Quer o Presidente da República, Daniel Chapo, quer o ex-candidato presidencial Venâncio Mondlane apresentaram os seus planos de ação. Estamos prestes a completar os primeiros 100 dias de governação em Moçambique. O que foi efetivamente cumprido? As exigências de Venâncio Mondlane influenciaram as medidas implementadas pelo atual chefe de Estado?
O ex-candidato presidencial Venâncio Mondlane propôs, em janeiro, reformas urgentes a serem implementadas pelo novo Governo moçambicano. Uma delas era a revisão do sistema judicial e a despartidarização das instituições. No mês seguinte, o Presidente Daniel Chapo prometeu alterações estruturais nesse sentido, com foco na reconfiguração dos órgãos constitucionais fundamentais, como a criação do Tribunal Constitucional e do Tribunal de Contas.
Entretanto, Chapo promulgou, a 14 de abril, a lei que formaliza o Compromisso Político para um Diálogo Nacional Inclusivo que prevê a revisão da Constituição, reformas nos sistemas de justiça e eleitoral e medidas de descentralização e despartidarização do Estado. Coincidência ou influência?
À DW, Ivan Maússe, investigador do Centro de Integridade Pública (CIP), vinca que, para recuperar "legitimidade" e "estabilidade", era fundamental que Daniel Chapo implementasse reformas capazes de atenuar a crise e que respondessem às preocupações da população, nomeadamente as proferidas por Mondlane.
"Temos de ter em consideração que Chapo entra para a governação do país num contexto de tensão pós-eleitoral. Era necessário que ele se mexesse no sentido de atender às principais preocupações da população moçambicana que tem na pessoa de Venâncio Mondlane o seu representante máximo”, afirma Ivan Maússe, sublinhando o peso político do antigo candidato.
Ainda assim, o investigador mostra-se "cético" quanto à efetividade das reformas.
Reformas ou "politiquices"?
Na apresentação das 25 medidas, em janeiro, Mondlane defendeu a libertação de manifestantes presos durante a contestação pós-eleitoral e o pagamento de indemnizações. Em março, após o encontro com Mondlane, o chefe de Estado, Daniel Chapo, anunciou indultos presidenciais aos cidadãos condenados. Coincidência ou influência?
Wilker Dias, presidente da Plataforma Eleitoral Decide, começa por sublinhar a importância destes indultos. No entanto, denuncia o aumento de casos reportados à organização de cidadãos que estiveram nos protestos pós-eleitorais e que denunciam estar a ser perseguidos.
"Aquele indivíduo que participou nas manifestações é perseguido nas suas residências com o maior destaque para a cidade e província de Maputo, onde nós temos perseguições até a mulheres que estiveram a cozinhar nas manifestações", revela, salientando que esta é mais uma ação "para inglês ver".
"É aquilo que nós chamamos de politiquices, não é? É fazer algo para o público ver, mas na essência existe uma outra ação que está a ser desempenhada e é o que está a acontecer atualmente. Por um lado, há este indulto que vem aí para os prisioneiros, que não são poucos, são muitos, mas por um outro ângulo nós teremos pessoas a serem detidas. Logo, é apenas para inglês ver”, criticou Wilker Dias.
Estratégia de aproximação à população?
O economista Rui Mate considera que as medidas de Daniel Chapo, aparentemente semelhantes às propostas por Mondlane, podem ser uma estratégia para o Presidente da República se aproximar da população.
"Ele fez um estudo: O que é que o Venâncio fazia para atrair as pessoas? Então, ele vai buscando isso e como, às vezes, não pode fazer de forma direta, vai fazendo de forma indireta, mas no final do dia o resultado é o que vai se vendo que é aquilo que tinha sido dito pelo outro candidato", afirma, evidenciando, no entanto, que, se as medidas beneficiarem a população, não vê qualquer problema".
Ivan Maússe, do CIP, partilha da mesma opinião.
"Podemos sim, acreditar que existe uma identidade na verdade necessária ou como consequência da pressão que era exercida por Venâncio Mondlane sobre as diversas reformas que o Governo deveria introduzir”, analisa o investigador.
Essa pressão não teria sido só em relação à despartidarização do Estado ou aos indultos. Na economia, Daniel Chapo também foi confrontado com pedidos de reformas urgentes.
Mudança de estratégia?
O ex-candidato presidencial Venâncio Mondlane exigiu, em janeiro, uma linha de financiamento para Pequenas e Médias Empresas (PME) no valor de 500 milhões de dólares. Em fevereiro, o Governo moçambicano anunciou a criação de um Fundo de Recuperação Econômica no valor de 10 mil milhões de meticais para financiar a tesouraria e o investimento das Micro, Pequenas e Médias Empresas.
Rui Mate admite semelhanças, mas reforça que importa perceber como o apoio financeiro será implementado e distribuído, para que não seja alocado sempre às mesmas empresas. "Temos assistido a diversos casos em Moçambique em que há apoio à revitalização e reforço do financiamento ao setor privado, mas depois esse reforço vai sempre para as mesmas pessoas", critica.
Por sua vez, Wilker Dias, presidente da Plataforma Eleitoral Decide, não tem dúvidas quanto a quem serão os beneficiários. "São aqueles indivíduos que pertencem automaticamente ao sistema, que prestaram algum serviço de forma automática ao sistema e, isso é que vai ser um dos fatores de descredibilização do atual Governo se não prestar atenção", aponta, reforçando a importância da "imparcialidade" no momento da distribuição, uma vez que, por vezes, dá-se "demasiada atenção à camaradagem".
Narrativa populista?
A renegociação dos contratos de megaprojetos foi também um dos temas em destaque na campanha eleitoral.
Venâncio Mondlane defendeu a renegociação dos contratos, porque, na sua opinião, "encobrem esquemas de corrupção" e "beneficiam um pequeno grupo de pessoas". Daniel Chapo, o candidato da FRELIMO e atual Presidente da República, criticava essa ideia. No entanto, agora também já propõe a revisão dos contratos "assinados há 20 anos" para trazer mais benefícios para a população.
Rui Mate fala em "populismo". Para o economista nenhuma empresa vai aceitar renegociar o seu contrato, lamentando a "falsa esperança" criada junto da população.
"Quando falam em renegociar contratos, a população, logo de princípio, pensa que vai pegar o contrato da Sasol, o contrato da TotalEnergies ou da ENI e que, a partir desse momento, os benefícios começarão a surtir efeito para os moçambicanos, mas isso não é verdade", denuncia, ressaltando que, se isso acontecer, será um "processo longo e uma disputa jurídica extremamente esgotante".
Artigo atualizado às 16:30 (CET) de 22 de abril de 2025.