No início do julgamento dos 17 ativistas angolanos, acusados de prepararem uma rebelião, advogados de defesa pedem para que os réus sejam "mandados em liberdade de onde, de resto, nunca deveriam ter saído".
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Às oito horas da manhã desta segunda-feira (16.11), mais de 30 pessoas já estavam à porta da 14.ª secção do Tribunal Provincial de Luanda para tentar assistir ao início do julgamento dos 17 ativistas acusados de prepararem uma rebelião.
No entanto, a sala era pequena. Ficou abarrotada só com familiares e amigos dos jovens ativistas, que, assim que entraram, foram recebidos com fortes aplausos. Agentes da polícia tentaram impedir alguns jornalistas de entrar, mas a imprensa acabou por conseguir cobrir o início da sessão.
O juiz Garcia Paulino leu o despacho de pronúncia, fazendo referência à lista onde constam membros de um suposto Governo de Salvação Nacional que teria sido discutido pelos ativistas. Mas o grupo de advogados de defesa formado por David Mendes, Luís Nascimento, Walter Tondela e Francisco Michel, negou o envolvimento dos réus na formação desse suposto Governo.
Luís Nascimento pediu também que se anule a apresentação dos vídeos dos encontros semanais dos ativistas, na posse do Ministério Público, que seriam apresentados como provas.
"Não será aplicado por inconstitucional, bem como serem declarados nulos os meios auditivos e visuais por terem sido obtidos por violação dos direitos constitucionais constantes dos artigos 32° e 34° da Constituição da República", afirmou o advogado. "Deve o douto do despacho de pronúncia ser julgado improcedente por crimes inexistentes e não provados. E em consequência sejam absolvidos os arguidos e mandados em liberdade, de onde, de resto, nunca deveriam ter saído fazendo-se assim a acostumada justiça."
Depois deste pedido, a sessão foi suspensa por 30 minutos. Ao retomar, o juiz decidiu que o julgamento continuasse sem a presença dos órgãos de comunicação.
15+2 negam ter formado alegado Governo de Salvação Nacional
Nito Alves ouvido
O ativista Nito Alves foi o primeiro réu a ser ouvido. Os outros permaneceram fora da sala. Além do crime de rebelião, o jovem é acusado de falsificar a identidade:
"O réu Manuel Baptista Nito Alves, também conhecido por Nito Alves, cometeu um crime de atos preparatórios previstos e puníveis pela conjugação dos artigos 21° nr. 1, 23° nr. 1 e 28°, todos da lei nr. 23/10 de 3 de dezembro e outro de mudança ilegal de nome previsto e punível pelo artigo 234 do Código Penal", referiu o representante do Ministério Público, Pedro de Carvalho durante a leitura do despacho da acusação.
As t-shirts do julgamento dos 15+2
O julgamento dos ativistas angolanos acusados de prepararem uma rebelião iniciou na segunda-feira (16.11). Ao mesmo tempo, começou um desfile de t-shirts de protesto, dentro e fora do tribunal. Veja as fotos do processo.
Foto: Reuters/H. Corarado
"Vai acontecer o que o José Eduardo decidir"
"Vai acontecer o que o José Eduardo decidir. Tudo aqui é um teatro", afirmou o ativista Luaty Beirão no primeiro dia do julgamento. Luaty e outros 16 ativistas são acusados de prepararem uma rebelião contra o Presidente José Eduardo dos Santos. Defensores dos direitos humanos dizem que o caso tem motivações políticas. Em protesto, um ativista escreveu na farda prisional: "Recluso do Zédu".
Foto: DW/P.B. Ndomba
Presunção da inocência
Outro ativista escreveu na farda prisional "in dubio pro reo [princípio da presunção da inocência]. Nenhuma ditadura impedirá o avanço de uma sociedade para sempre." Ele é um dos 15 jovens detidos desde junho. Até à detenção, os ativistas costumavam encontrar-se aos sábados; um dos tópicos dos debates semanais era o livro "Da Ditadura à Democracia", do académico norte-americano Gene Sharp.
Foto: picture-alliance/dpa/P. Juliao
Nova acusação por causa das t-shirts?
À acusação que os ativistas angolanos já enfrentam, de alegados atos preparatórios para uma rebelião, poderá agora somar-se uma outra: a do crime de danos, por escrever frases de intervenção na farda dos serviços prisionais. A informação foi avançada por David Mendes, um dos advogados dos jovens.
Foto: picture-alliance/dpa/P. Juliao
Mais t-shirts fora do tribunal
Fora do tribunal, um grupo de manifestantes jurou acompanhar o julgamento dos 15+2 até ao fim. Vestiram-se a rigor com t-shirts brancas de apoio ao sistema judicial angolano, com os dizeres "Justiça sem Pressão" - "Estamos aqui a favor da Justiça, visto que Angola é um Estado soberano e que os tribunais têm o seu papel, com o qual nós estamos solidários", disse um dos manifestantes.
Foto: DW/P. Borralho
#LiberdadeJa
Sem t-shirts feitas para a ocasião, mas com cartazes, houve ainda quem pedisse "liberdade já!" para os ativistas angolanos, no exterior da 14ª Secção do Tribunal Provincial de Luanda. Essas são também as palavras de ordem de uma campanha nas redes sociais pela libertação dos jovens a que se associaram músicos, escritores, ativistas e muitos outros cidadãos de dentro e fora de Angola.
Foto: Reuters/H. Corarado
Método n.º 159
Luaty Beirão (ao centro) é outro dos 15 jovens detidos desde junho. Ele cumpriu 36 dias de greve de fome em protesto contra o excesso de prisão preventiva dos ativistas. Com a greve de fome de Luaty, o caso ganhou proporções internacionais. Jejuns e greves de fome estão listados no livro "Da Ditadura à Democracia" como o método n.º 159 de "intervenção não violenta".
Foto: picture-alliance/dpa/P. Juliao
Sala de imprensa improvisada
O julgamento dos 15+2 é tido como um dos casos mais mediáticos da história de Angola. No entanto, os jornalistas ficam à porta. O tribunal autorizou-os a estar na sala de audiências para assistir às primeiras horas do julgamento, mas agora só poderão voltar a entrar na fase das alegações finais e na leitura do acórdão. Diplomatas estrangeiros também não puderam entrar.
Foto: DW/P.B. Ndomba
"Momento decisivo"
Estava previsto que o julgamento dos 15+2 terminasse esta sexta-feira, 20 de novembro, mas deverá prolongar-se. Segundo a organização de direitos humanos Human Rights Watch, este caso é um "momento decisivo" para o sistema judicial de Angola: "Os juízes angolanos devem demonstrar independência e não permitir que este julgamento seja manipulado como um instrumento para silenciar as vozes críticas."