Ilha de Moçambique comemora 200 anos com vários desafios
Amós Fernando (Tete)
4 de junho de 2018
A Ilha de Moçambique completa este ano dois séculos desde que foi elevada à categoria de cidade. Os habitantes aproveitam as comemorações para falar sobre o futuro da ilha.
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Situada na província de Nampula, a primeira capital moçambicana foi elevada à categoria de cidade há 200 anos. Declarada em 1991 Património da Humanidade pela Organização da Nações Unidas para a Ciência e a Cultura (UNESCO), a Ilha de Moçambique é um dos principais destinos turísticos da região austral de África, devido à sua riqueza arquitetónica e cultural.
Os ilhéus querem, agora, tornar esta festa dos 200 anos num momento de reflexão sobre a preservação deste património, é o que diz Manuel Sumalgy, da comissão de preparação das comemorações dos festejos.
"Pensamos que as celebrações dos 200 anos devem deixar um marca para a própria ilha", afirma Sumalgy, destacando que "consta no cronograma das atividades envolver os residentes da ilha para que continuem a respeitar os princípios impostos pelo Gabinete de Preservação da ilha e pela UNESCO, como manter as casas de macuti, a nossa cultura para exactamente dignificarmos a nossa ilha".
Instituições privadas e organizações não-governamentais também estão envolvidas no processo de preservação do património da cidade. Um casal de empresários ligados à hotelaria está, por exemplo, a construir uma galeria para mostrar as potencialidades da ilha.
"Vão ser convidados artistas locais, de vários países, que antes estiveram ligados à Ilha de Moçambique para criar algo em diálogo com as comunidades para a projecção do futuro da Ilha, usando a cultura como veículo para o desenvolvimento da cidade", sublinha Marcus Antman, que vive na localidade há quase uma década.
200 anos de elevação da Ilha de Mocambique a cidade
Desenvolvimento
Para Antman, não há dúvidas de que a preservação do património anda de mãos dadas com o turismo. "A grande vantagem que a ilha tem em relação a outros lugares do mundo é a sua história e cultura, a autenticidade da cultura, e isso tem que se interligar com o desenvolvimento turístico", realça o empresário, para quem as instituições públicas e científicas também devem contribuir para expor a cultura e projetar o futuro local.
A Associação dos Pequenos Empresários de Hotelaria e Turismo da Ilha de Moçambique (APETUR), segundo o seu presidente, Momade Ossumane, acredita que o turismo é e será a principal fonte para o desenvolvimento e preservação da ilha.
"Nós temos esta obrigatoriedade de conservar estas técnicas de utilização de pedra e cal, isso é um grande atrativo para as pessoas que vêm conhecer a ilha".
A Ilha de Moçambique conta com pouco mais de 13 mil habitantes, segundo dados do último censo populacional. Para as comemorações dos dois séculos da cidade, a 17 de setembro, são esperadas mais de três mil pessoas vindas de várias partes do mundo.
Ilha de Moçambique: a "menina dos olhos" de Nampula
Há 200 anos, que a primeira capital de Moçambique foi elevada à cidade. Desde 1991 a ilha é Património Mundial da Humanidade. O arquipélago no norte de Moçambique concentra um incalculável valor histórico e cultural.
Foto: DW/J.Beck
Primeira capital de Moçambique
Situada na Província de Nampula, a Ilha de Moçambique é um destino turístico muito procurado na África Austral pelo seu vasto património histórico e cultural. "Descoberta" pelo navegador português Vasco da Gama, em 1498, aquando da viagem marítima para a Índia, esta ilha foi a primeira capital de Moçambique. É atualmente habitada por cerca de 15 mil pessoas.
Foto: DW/J.Beck
Pequena ilha, grande história
Apesar de ter apenas três quilómetros de comprimento e 400 metros de largura, esta pequena ilha carrega uma grande história. Quando Vasco da Gama a "descobriu", ela já era um importante lugar de trocas comerciais entre os africanos e os povos árabes. Após a chegada dos portugueses, a ilha ganhou uma importância estratégica na rota que ligava Lisboa a Goa, a "Carreira da Índia".
Foto: DW/J.Beck
Habitações com história
A Ilha de Moçambique está dividida em duas partes: a “cidade de pedra e cal” e a “cidade de macuti“. Na primeira (à direita da rua), eram construídas as casas que pertenciam às camadas mais altas da sociedade, onde estavam os palácios e fortalezas. Na segunda (à esquerda da rua), viviam as pessoas de classes mais baixas.
Foto: DW/J.Beck
Cidade de "macuti"
Na chamada “cidade de macuti“ viviam os mais pobres - os pescadores, por exemplo. É nesta parte da cidade que se encontram, como o nome indica, as construções mais precárias cobertas por macuti - as tradicionais folhas de coqueiro espalmadas.
Foto: DW/J.Beck
Património Mundial da Humanidade
Foi em 1991 que a ilha de Moçambique passou a integrar a lista dos destinos considerados Património Mundial da Humanidade da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura - UNESCO. De passagem pela ilha há vários monumentos que não pode deixar de visitar.
Foto: DW/J.Beck
Fortaleza de São Sebastião
Construída no século XVI pelos portugueses, a Fortaleza de São Sebastião visava dar proteção e apoio aos barcos que navegavam na chamada Carreira da Índia. É um dos mais representativos exemplos da arquitetura militar portuguesa na costa oriental de África.
Foto: DW/J.Beck
Capela de Nossa Senhora do Baluarte
A Capela de Nossa Senhora do Baluarte, construída em 1522 na extremidade norte da ilha, é hoje o único exemplo da arquitetura manuelina em Moçambique. O manuelino, ou também gótico português tardio, é um estilo que se desenvolveu no reinado de D. Manuel I nos séculos XV e XVI. O acesso à capela faz-se apenas pelo interior da Fortaleza de São Sebastião.
Foto: DW/J.Beck
Palácio de São Paulo
Construído em 1610, o Palácio de São Paulo, também conhecido como Palácio dos Capitães-Generais, funcionou primeiro como Colégio da Companhia de Jesus, tendo sido depois convertido no palácio do governador - função que manteve até a Ilha de Moçambique deixar de ser a capital do país, em 1898. No palácio podemos hoje visitar o Museu da Marinha e o Museu-Palácio de São Paulo.
Foto: DW/J.Beck
Outros locais de interesse turístico
O monumento dedicado ao poeta português Luís Vaz de Camões, que viveu entre 1567 e 1569 na Ilha de Moçambique, é outro dos locais que os visitantes da Ilha não podem deixar de conhecer, assim como a Igreja da Misericórdia e Museu de Arte Sacra e a Capela de São Francisco Xavier. Todos estes edifícios históricos estão localizados na Cidade da Pedra.
Foto: DW/J.Beck
Um destino multicultural
Apesar da clara influência do povo português, cabem na ilha de Moçambique apontamentos de muitas outras geografias mundiais. Encontramos aqui um largo número de culturas e religiões diferentes. Ao caminharmos pelos diferentes bairros da ilha, cruzamo-nos com várias igrejas e capelas, mas também com mesquitas e um templo hindu.
Foto: DW/J.Beck
Escola Maometana
A maioria dos habitantes da ilha pertence à religião muçulmana. A "Escola Maometana / The Mohamedia Madresa School" localiza-se ao lado da "Mesquita Central Seita Sunni" próximo do centro da Ilha de Moçambique. A ilha foi marcada durante séculos pela cultura suaíli e o islão dos povos da África Oriental, como também acontece na vizinha Tanzânia.
Foto: DW/J.Beck
Ilha em risco – um futuro incerto
Nos últimos anos, muitos são os especialistas que chamam a atenção para a possibilidade deste pequeno paraíso poder vir a desaparecer por causa das alterações climáticas. Teme-se que, devido à erosão costeira, um dia a ilha possa acordar no fundo do mar. Até ao momento já foram consumidas várias áreas pequenas.
Foto: DW/J.Beck
Fecalismo a céu aberto
Mas para além do câmbio climático, há outros problemas mais profanos no dia a dia da ilha. Muitos habitantes usam as praias como casa de banho, o que ameaça a saúde pública e coloca em perigo os atrativos turísticos da ilha. Para melhorar o saneamento básico, foram construídos sanitários públicos em vários lugares da ilha.
Foto: DW/J.Beck
Degradação apesar de Património Mundial
Apesar da classificação em 1991 como Património Mundial pela UNESCO, encontram-se muitos prédios em ruínas na Ilha de Moçambique. A recuperação é lenta. Desde que a capital do país passou para Maputo, no sul de Moçambique, os investimentos públicos concentram-se no sul do país. O norte e a Ilha de Moçambique perderam protagonismo político.
Foto: DW/J.Beck
Esforços em torno da preservação
No entanto, e apesar do património histórico omnipresente na ilha, ela quer continuar a ser um lugar para se viver. Por isso, o Governo de Moçambique e parceiros internacionais têm vindo a unir esforços para criar melhores condições sócio-económicas. E, claro, para preservar o património histórico e cultural da ilha.