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25 de maio: "África está a emancipar-se passo a passo"

António Cascais
24 de maio de 2024

Celebra-se este sábado o "Dia de África". Uma das grandes riquezas do continente é a juventude, que anseia por mudanças e maior independência. À DW, diplomata e analistas falam da importância da agenda pan-africana.

Cimeira da União Africana em Addis Abeba em fevereiro de 2019
Foto: Getty Images/AFP/S. Maina

Para onde caminha o continente africano?

Num mundo globalizado e em que sobem de tom os apelos da Rússia e de outros países para uma nova ordem mundial "multipolar", sem a dominância dos Estados Unidos, África está a emancipar-se passo a passo, procurando o seu próprio caminho, rumo ao desenvolvimento e progresso social, cultural e económico, afirmam analistas ouvidos pela DW África.

Este é um caminho independente e não necessariamente alinhado com as antigas potências coloniais ou uma das potências económicas globais. É também um caminho em que os jovens africanos têm uma palavra importante a dizer, sublinha o embaixador António Lima, um dos mais destacados diplomatas de Cabo Verde.

"África verifica uma extraordinária evolução da sua juventude, uma evolução que vai no sentido de África ser cada vez mais independente, ter cada vez mais liberdade e poder exprimir-se de forma absolutamente livre", comenta. 

Jovens exigem rotura com passado

"Há um recuperar da agenda pan-africana, um recuperar do pensar o desenvolvimento de África a partir de uma perspetiva africana", afirma especialistaFoto: Francis Kokoroko /REUTERS

Liberdade, emancipação, justiça e verdade são valores fundamentais para António Lima, que, ao longo da sua carreira, serviu a diplomacia cabo-verdiana nas Nações Unidas, em várias instâncias da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), foi embaixador na Argélia, na Guiné-Bissau e Timor-Leste, entre outros países.

Para António Lima, o Dia de África, que se assinala este sábado, 25 de maio, é mais uma oportunidade para evocar esses valores e para lembrar que, para que haja mudanças, é necessário romper com hábitos do passado.

"A juventude africana quer roturas, seja com a dominação colonial ou neocolonial, seja com tudo aquilo que a impedia de avançar mais, de criar mais, de compartilhar as suas ideias", diz.

Esses apelos fazem-se ouvir um pouco por todo o continente. Da Nigéria à África do Sul, passando pelo Quénia ou Moçambique, os jovens pedem mais desenvolvimento, mais oportunidades de trabalho, melhores condições de vida – e que a sua voz seja ouvida.

Os jovens africanos são cada vez mais qualificados, mas têm mais probabilidades de estar desempregados do que cidadãos mais velhos, concluiu um estudo do Afrobarómetro publicado em dezembro.

O embaixador António Lima considera que "África está num momento crucial".

"E eu penso que África precisa de rotura, precisa de avanços. Precisa também de parceiros que estejam dispostos a ter uma cooperação de 'ganho eu, ganha você'."

Um dia simbólico

O "Dia de África" assinala a fundação da Organização da Unidade Africana (OUA), em 25 de maio de 1963. A OUA é a organização antecessora da União Africana, fundada em 2001.

"O 25 de maio é uma data histórica, que tem com certeza um simbolismo muito grande", comenta Nkikinamo Tussamba, analista angolano de política internacional.

Matilde Muocha, historiadora e investigadora moçambicana, diz que é uma data em que se "celebra África" e as diferentes identidades africanas, recuperando-se a "agenda pan-africana" e pensando "o desenvolvimento de África a partir de uma perspetiva africana".

Reunião de chefes de Estado e de Governo da União Africana, na EtiópiaFoto: Solomon Muchie/DW

"Nesta data, tudo isso é muito mais afirmado, e é uma data que não passa despercebida nos meios de comunicação, nas universidades. É uma agenda pan-africana e celebra-se com bastante força."

Rui Jorge Semedo, analista guineense, frisa que o 25 de maio "foi sem dúvida, um marco simbólico para que as nações africanas se juntassem em torno da luta pela descolonização e pela construção de uma África unida e forte perante os desafios mundiais".

"Mas infelizmente, essa importante iniciativa não teve continuidade", critica. 

Os problemas de sempre

O analista angolano Nkikinamo Tussamba lamenta que as economias africanas continuem a ser muito dependentes.

Em muitos países, as vozes dos jovens não são ouvidas. Por vezes, são até abafadas. E os grandes problemas mantêm-se: falta emprego, faltam casas e setores cruciais como a saúde ou educação são cronicamente subfinanciados.

"Quando olhamos para as responsabilidades dos Estados quanto ao cumprimento das promessas, isto é bastante preocupante", comenta Tussamba.

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Não só em cada país, como também a nível continental, é preciso fazer mais, acrescenta Soy Komba, professor de Relações Internacionais em Angola: "Para nós, africanos, o Dia de África tem um grande significado, porque foi nesse dia que tentámos trilhar um caminho só nosso. […] Mas a União Africana podia ter feito mais."

"Por enquanto, não tem mais do que discursos. É uma elite que ali se reúne. Não passa disso", afirma o académico.

Multilateralismo

Mas há uma diferença muito grande entre a África de hoje e a de há 61 anos: Os países africanos abraçam a atual tendência global para o multilateralismo em seu benefício, diversificando o leque de escolha de parceiros nas suas relações internacionais, explica o embaixador António Lima.

"Penso que estamos num momento muito favorável para a transformação das relações entre o Norte e o Sul para um outro patamar de relações", afirma o diplomata.

"Com o mundo a mudar completamente, e com a unipolaridade dirigista a transformar-se numa multipolaridade, talvez haja mais expressividade daqueles que sempre foram colonizados e dominados."

O professor de Relações Internacionais Soy Komba nota isso: Nos últimos tempos, há uma "tendência para a emancipação" - sem esquecer o passado e a ajuda de parceiros importantes como a Rússia ou a China, mas olhando também para outros lugares.

Em Angola, por exemplo, "ainda há aquela ligação [histórica] com a Rússia", afirma Soy Komba. Mas "a ligação com os Estados Unidos e com a União Europeia" não é desvalorizada.

"Acho que não é da noite para o dia que vamos quebrar laços e nos vamos emancipar [totalmente], mas a tendência é por aí", conclui. 

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