A difícil tarefa de formar um novo exército na RCA
Jan-Philipp Scholz | cvt
9 de maio de 2017
Depois de anos de guerra civil na República Centro-Africana, a missão da União Europeia tem estado a dar apoio e formação para a reconstrução do exército nacional, desde julho de 2016. Mas os desafios são muitos.
Publicidade
A Missão de Treino da União Europeia na República Centro-Africana (EUTM RCA) tem um mandato claro: aconselhar o exército do país em questões estratégicas e na formação e organização.
O problema é que o Exército que estão a reconstruir nem sequer existia realmente. O país tinha apenas mil soldados prontos para entrar em ação, lembra Tim Glawion, do Instituto Alemão de Estudos Globais e Regionais (GIGA). "O Exército nunca funcionou, mesmo antes da crise. E mesmo essas poucas forças, ao invés de garantirem a segurança, só criavam incerteza, além de cometerem atrocidades", explica.
Além da missão da UE, cujo mandato termina em setembro de 2018, também os mais de 10 mil capacetes azuis da ONU que se encontram no país apoiam a reconstrução do exército da RCA. Até o final deste ano, deverão estar formados cerca de 1.500 soldados.
Reintegração de ex-rebeldes
Quando o grupo rebelde Seleka assumiu o poder no país, em março de 2013, uma boa parte dos soldados do exércido juntou-se à milícia Anti-Balaka, que é responsável por numerosas violações dos direitos humanos no país.
A difícil tarefa de formar um novo exército na RCA
A integração no exército desses ex-rebeldes continua a causar controvérsia. Evan Cinq-Mars, da organização norte-americana Centro para Civis em Conflito (CIVIC), é contra: "Deve ser prioridade assegurar que aqueles que cometeram as piores violações dos direitos humanos não sejam reintegrados."
A responsável das Nações Unidas pela reforma do setor da segurança no país, Mody Berethe, assegura que os soldados que fizeram parte do exército oficial e cometeram crimes graves em serviço não seriam readmitidos nas forças de segurança.
Tim Glawion, do Instituto GIG, defende que o exército nacional não deveria ter um papel tão importante na tentativa da comunidade internacional de estabelecer um nível mínimo de segurança no país.
"O exército deve proteger o país contra inimigos externos e não garantir a segurança do país", argumenta. "Só a ideia de que os problemas domésticos devem ser resolvidos pelo exército é, na minha opinião, a militarização da tensão social e o caminho absolutamente errado", conclui o especialista.
Em vez disso, exemplifica, seria preferível apoiar mais unidades de polícia locais e grupos de autodefesa organizados nas aldeias. Embora tenha havido nos últimos anos alegações de abusos contra as forças de paz da ONU, no geral, os analistas avaliam positivamente o trabalho das tropas internacionais na República Centro-Africana.
Fuga e sofrimento na República Centro-Africana
Desde o golpe de Estado, há um ano, a situação na República Centro-Africana está fora de controle. Aqueles que podem, fogem. Aqueles que permanecem, lutam todos os dias pela sobrevivência.
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Refúgio no aeroporto de Bangui
Desde o golpe de Estado, há um ano, a situação na República Centro-Africana está fora de controle. Milícias cristãs e muçulmanas promovem amargos combates. Um milhão de pessoas estão em fuga. Quase todos os muçulmanos deixaram a capital, Bangui. Entre os que permaneceram, algumas centenas encontram abrigo num velho hangar do aeroporto.
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Perder tudo
O marido de Jamal Ahmed tinha guardado dinheiro suficiente para a fuga de sua família, quando as milícias cristãs chamadas "Anti-Balaka" invadiram sua aldeia natal. As poucas economias não foram suficientes - ele pagou com a vida. Jamal Ahmed vive no acampamento que surgiu no aeroporto: "Não conheço ninguém aqui. Não tenho mais nada. Não sei como será daqui para a frente.”
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Ver os netos mais uma vez
Aos 84 anos, Fatu Abduleimann está entre os moradores de idade mais avançada do campo de refugiados do aeroporto. Nas últimas décadas, Fatu assistiu a muitas dificuldades em sua terra natal. Mas nunca foi tão ruim quanto agora, diz a idosa. Seu único consolo: a maioria dos seus filhos conseguiu fugir para o Chade. Seu maior desejo: "ver os meus netos mais uma vez."
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Quilómetro Cinco, uma cidade fantasma
Exceto o acampamento de refugiados no aeroporto, quase todos os muçulmanos deixaram a cidade. Há alguns meses, o chamado "Quilómetro Cinco" era um animado centro da comunidade muçulmana. Mais de 100.000 pessoas moravam e trabalhavam aqui, a cinco quilómetros do centro da capital, Bangui. Agora, restaram apenas algumas centenas de pessoas. As lojas estão fechadas até nova ordem.
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Esperar o momento certo
Quase todos os muçulmanos que ainda restam no "Quilómetro Cinco" querem apenas uma coisa: sair daqui. Os caminhões para a fuga estão prontos. Eles esperam que um comboio tenha como destino os países vizinhos como os Camarões ou o Chade.
Foto: Kriesch/Scholz/DW
A cidade de campos de refugiados
Não apenas os muçulmanos temem por suas vidas. Por toda a cidade de Bangui pode-se encontrar acampamentos provisórios em que a maioria da população, cristãos e animistas, procura proteção - por medo de um retorno das milícias islamistas ou simplesmente porque não têm o que comer - e espera por doações de alimentos.
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Ajuda sobrecarregada
O Pastor David Bendima recebeu, na sua igreja, mais de 40 mil pessoas que fugiram dos combates no centro da cidade. Mas ele também não pode garantir-lhes segurança suficiente. "Todas as noites ouvimos tiros e granadas explodindo. As pessoas estão com muito medo", diz o pastor. Ele parece cansado.
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Últimas reservas
Chancella Damzousse, de 16 anos, vive em uma aldeia a meia hora de distância de Bangui. Ela prepara o jantar. "Tudo o que resta são alguns grãos de feijão e um pouco de gergelim", diz a jovem. 15 pessoas terão que se satisfazer com a refeição. Desde que milícias muçulmanas destruíram o lugar há alguns meses e mataram muitos cristãos, a família de Chancella recebeu vários vizinhos.
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Vítimas, autores, centinelas
Ao lado da casa de Chancella, há um guarda da milícia Anti-Balaka. Os amuletos em seu corpo o tornam invulnerável contra balas, explica ele. A milícia tomou o controle da região. Seu trabalho é proteger os moradores da aldeia do ataque de outros rebeldes. No entanto, a sua proteção aplica-se apenas aos cristãos - há muito tempo os muçulmanos deixaram o local ou foram mortos.
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Presença internacional
Sete mil soldados da União Africana e da França têm a responsabilidade de garantir a segurança no país dilacerado. A situação humanitária está piorando a cada dia, no entanto. Em 1 de abril, a União Europeia lançou oficialmente a sua operação militar na República Centro-Africana, com um contingente de até mil homens para reforçar as tropas francesas e africanas por um período de até seis meses.