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"A França está perdida" em África

22 de julho de 2022

Analista guineense espera pouco da deslocação do Presidente francês, Emmanuel Macron, à Guiné-Bissau. Em entrevista à DW África, diz que a visita servirá apenas como "instrumento de propaganda do atual regime".

Presidente guineense, Umaro Sissoco Embaló, e homólogo francês, Emmanuel MacronFoto: LUDOVIC MARIN/AFP

Uma "visita simbólica" e de "propaganda" para o atual regime do Presidente guineense, Umaro Sissoco Embaló. É desta forma que o jurista guineense Fodé Mané reage à anunciada deslocação do Presidente francês, Emmanuel Macron, à Guiné-Bissau na próxima quinta-feira (28.07). 

Prestes a completar a saída do Mali, "a França está perdida" em termos de política para o continente africano e, neste momento, todos os aliados contam para redefinir a sua presença em África, diz o analista em entrevista à DW África. Afirma ainda que o facto de a visita ocorrer numa altura em que Sissoco assume a liderança da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental  (CEDEAO) não passa de uma mera coincidência.

Fodé ManéFoto: Braima Darame/DW

DW África: Acha que o facto de Umaro Sissoco Embaló assumir a liderança da CEDEAO terá pesado nesta ida de Macron a Bissau?

Fodé Mané (FM):  Não acho muito, porque a presidência da CEDEAO, no estado em que a comunidade está neste momento, não tem muita influência na política interna e externa de cada país.

Há uma coincidência, mas não tem diretamente a ver com esta presidência. Aquando da receção de Umaro Sissoco Embaló em Paris, foi anunciado que, logo que o chefe de Estado francês fosse ao continente africano, iria visitar a Guiné-Bissau. Isso foi antes de ser anunciada a liderança da CEDEAO.

DW África: Numa altura em que a França e a sua força antiterrorista estão prestes a retirar-se definitivamente do Mali e Paris já admitiu que quer encontrar dispositivos menos expostos no continente, estará Macron à procura de novos aliados como a Guiné-Bissau?

FM: Neste momento, a França está perdida em termos da sua política para o continente africano. Está à procura de novas diretrizes, novas orientações para poder ter uma estratégia consistente. Então, para isso, todos os aliados são importantes para depois desenhar um cenário melhor.

Para isso, acho que, dos países no bloco sub-regional, resta o Senegal e a Guiné-Bissau, que, apesar de não ser um país francófono, está muito ligado ao Senegal nesse aspeto. A Nigéria não é assim tão ligada a França, ou a Libéria e a Serra Leoa.

Olhando para o périplo de Macron, vê-se que, neste momento, a França não tem muitas oportunidades e está à procura de um caminho para redefinir a sua presença no continente africano. Macron está a tentar dar algum sinal e esperar o que vem. A própria estadia que vai ter na Guiné-Bissau não tem uma agenda muito carregada, é mais simbólica - é um encontro entre duas figuras.

Presidente guineense, Umaro Sissoco Embaló, e homólogo senegalês na inaguração da Avenida Macky Sall, em setembro de 2020Foto: Iancuba Dansó/DW

DW África: Também não nos podemos esquecer, por exemplo, que, em fevereiro passado, depois do alegado ataque armado à sede do Governo guineense, a França demonstrou imediatamente solidariedade com Umaro Sissoco Embaló. Acha que é um sinal de que as relações bilaterais estão cada vez mais fortes, também com esta visita?

FM:  Eu acho que a França continua a suportar a política senegalesa na África Ocidental. Em relação à Guiné-Bissau, a França não tem uma política própria, sustenta sempre aquilo que é a política do Senegal em relação aos seus países vizinhos. Eu acho que, mesmo para deslocação de um chefe de Estado à Guiné-Bissau, tem de combinar com o Senegal...

DW África: Macron estará, de certa maneira, a tirar partido da boa relação entre Umaro Sissocó Embaló e Macky Sall?

FM: Talvez seja Umaro Sissoco Embaló que está a tirar partido do peso que o Senegal tem e da importância que o Senegal tem em relação à França. Umaro Sissoco Embaló é que pode aproveitar as boas relações que tem com o Senegal para fazer chegar um chefe de Estado francês ao território da Guiné-Bissau, algo que nunca tinha acontecido.

DW África: Segundo o Eliseu, durante a visita a Bissau, as questões de governação e Estado de Direito serão abordadas, mas sem "injunção dos média", só entre os homólogos. O que acha que significa isto na prática? Nada de perguntas incómodas dos jornalistas?

FM: Não. E não está previsto um encontro de Macron com os opositores do regime nem com as organizações de defesa dos direitos humanos.

Não se pode ter uma visão da situação dos direitos humanos baseada na visão do Governo. Macron devia encontrar-se com os opositores do regime e falar com as diferentes organizações de defesa dos direitos humanos para perceber se os princípios que a França legou à humanidade - a igualdade e a fraternidade - estão a ser implementados no continente africano, especificamente na Guiné-Bissau.

DW África: O se pode esperar desta visita? 

FM: É apenas um instrumento de propaganda do atual regime.

Reflexões Africanas: As ameaças à democracia da Guiné-Bissau

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