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Desporto

A nova ordem do futebol europeu

Rui Almeida
22 de novembro de 2018

A UEFA pode sorrir: na sua primeira edição, a Liga das Nações levou público aos estádios, teve jogos equilibrados e resultados surpreendentes. Que mais se pode pedir?

UEFA Nations League - Niederlande gegen Deutschland
Virgil Van Dijk simboliza a vontade holandesa em voltar aos grandes palcos.Foto: Getty Images/D. Mouhtaropoulos

Quando criou a Liga das Nações, a UEFA pensou em várias direções: garantir competição formal às seleções nacionais em períodos até aqui reservados a jogos "amigáveis", promover maior equilíbrio nos encontros envolvendo países de menor "ranking", possibilitar novas fontes de receitas e implementar uma fórmula inovadora de disputa, com promoções e rebaixamentos, que mantivesse a emoção como fator fundamental. É uma aposta ganha: grandes jogos, alterações súbitas de tendência nas últimas jornadas, estádios cheios, rivalidades estimuladas e audiências geradas. Na "mouche"!

Portugal, a principal confirmação

Mesmo sem Cristiano Ronaldo - após um "acordo de cavalheiros" que terá envolvido selecionador, presidente da federação e jogador para uma pausa estratégica na carreira de CR7 na seleção das "quinas" -, os campeões europeus assinaram a presença mais regular na fase de grupos da Liga das Nações. Sem derrotas e com qualificação garantida à penúltima jornada, depois de um empate a zero em Milão, com a renovada Itália de Roberto Mancini, a equipa de Fernando Santos passou com distinção para a "final four", ainda que o esplendor das exibições e o futebol ofensivo sejam, muitas vezes, substituídos por realismo e estratégia.

Poucas palavras e bons resultados: Fernando Santos, o selecionador portuguêsFoto: picture-alliance/dpa/AP/F. Seco

Os últimos degraus da Alemanha e da Croácia

Pior era difícil: quatro vitórias alcançadas em 2018, um Mundial na Rússia para esquecer e uma Liga das Nações para apagar. A Alemanha desceu às catacumbas, não ganhou nenhum dos quatro encontros que disputou no grupo 1 da liga A da competição, ficou em último lugar, atrás da Holanda e da França, foi despromovida à liga B e Joachim Löw percebeu que tem rapidamente de inverter caminho.

Os jovens alemães, como Sané, Kimmich ou Goretzka, estão prontos para assegurar a renovação da "Nationalmannschaft", mas é imperioso começar a ganhar. Daí que a federação germânica, atenta, mas cautelosa, aponte o Europeu de 2020 como meta incontornável.

Joshua Kimmich, um dos rostos para o futuro da "national mannschaft"Foto: Getty Images/Bongarts/B. Streubel

Também brusca foi a queda da Croácia, mas com contornos distintos. Os pupilos de Zlatko Dalic chegaram ao último jogo do grupo com hipóteses de obter o primeiro lugar. "Bastava" vencer em Wembley, e o Inglaterra-Croácia acabou por ser o exemplo do quão competitiva é esta nova aposta da UEFA para seleções nacionais.

Com as três equipas do grupo em condições de o ganhar (a Espanha jogava "no hotel", à espera de um empate), tudo foi decidido nos últimos minutos, após alternâncias e emoções fortes. A Croácia, vice-campeã do mundo, perdendo o jogo, foi relegada para a liga B, de nada valendo os esforços de Modric, Kalinic, Lovren ou Kramaric, alguns dos grandes nomes da melhor geração de futebolistas do país.

Holanda, Inglaterra e Suíça: renovando e confirmando

Depois de ausências no Europeu de 2016 e no Mundial de 2018, a federação holandesa contratou Ronald Koeman, apostando, sobretudo, numa profunda renovação da equipa laranja. A aposta radica na reconhecida escola do Ajax (em Amsterdão nascem gerações de futebolistas de eleição há décadas), mesclada com alguns nomes mais experientes, ainda em condições de se empenharem e de, eles próprios, mostrarem o caminho aos mais jovens. Não surpreende que Matthijs de Ligt (19 anos), Frenkie de Jong (21), Nathan Aké (23) ou Memphis Depay (24) estejam a despontar a um nível particularmente elevado, alicerçados no conhecimento de um técnico que, enquanto jogador, atuou pelas principais equipas holandesas e vestiu 78 vezes da camisola do seu país.

Croatas (despromovidos à liga B) e espanhóis ficaram pelo caminho na Liga das NaçõesFoto: picture-alliance/PIXSELL/I. Kralj

Nesta Liga das Nações, e num grupo em que partir claramente como "outsider" (frente a Alemanha e França), a Holanda surpreende e está já apurada para a "final four", em junho do próximo ano.

Ingleses e suíços ganharam os seus grupos de modo idêntico: com reviravoltas de última hora, muita emoção, imensa garra, uma incontornável vontade de vencer. A confirmação da "nova" seleção inglesa, com Harry Kane como nome mais sonante da companhia, surge depois de um excelente Mundial (quarto lugar), e numa fase de reafirmação do futebol da ilha.

Gareth Southgate sublima os aspetos positivos que caracterizam o jogo inglês - entrega, velocidade, empenho físico, imensa generosidade - e confere-lhe competitividade. Assim segue a seleção dos três leões, acompanhada de uma Suíça cuja garra é inultrapassável. A vontade de conquistar algo foi tão notória, da parte da seleção comandada por Vladimir Petkovic, que pareceu natural a ultrapassagem à Bélgica, num "turnover" excecional, vencendo por 5-2. Sem vedetas, mas fazendo justamente do coletivo uma das suas principais armas, a equipa suíça apresenta-se na fase final com legítimas aspirações na continuidade do seu percurso seguro e coerente.

Gareth Southgate leva Inglaterra à "final four", depois de um bom MundialFoto: Reuters/D. Martinez

O rosto escondido de uma bela ideia

Há muito que a UEFA pretendia transformar as datas para a realização de jogos particulares em desafios mais interessantes, sob vários prismas. Desde logo a questão financeira, mas também a possibilidade de equipas menos dotadas poderem dispor de competição mais equilibrada. O sistema de "ligas" definidas, para esta primeira edição da Liga das Nações, pelo "ranking" continental, permitiu isso mesmo: jogos emotivos e de resultado imprevisível. As promoções e rebaixamentos conferem um tom de campeonato que em nenhuma outra ocasião foi visível, nas provas para equipas nacionais.

Está ganha – e com distinção – a primeira grande aposta do organismo que gere o futebol europeu. A ideia foi trabalhada em bastidores e tem no português Tiago Craveiro, diretor geral da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e recentemente convidado pelo Presidente da UEFA para integrar a comissão que avaliará o impacto da eventual criação de um Mundial de clubes alargado, um dos seus principais mentores.

O dirigente, com responsabilidades na reestruturação da FPF e no planeamento do seu novo modelo de organização e comunicação, trabalhou na sombra com o objetivo de conferir peso e volume à nova competição da UEFA. O resultado está à vista e, curiosamente, terá o epílogo da sua primeira edição nas cidades portuguesas do Porto e de Guimarães, em junho do próximo ano.

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