Conferência internacional clama por segurança alimentar
Rafael Belincanta (Roma)
13 de fevereiro de 2019
Encontro em Adis Abeba, na Etiópia, estabelece diretrizes para garantir alimentos mais seguros e livres de contaminação. Alimentos contaminados causam mais de 400 mil mortes por ano em todo o mundo.
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A primeira Conferência Internacional sobre Segurança Alimentar em Adis Abeba, na Etiópia, terminou com um apelo por maior cooperação internacional para garantir o acesso a alimentos de qualidade e livres de contaminação.
O encontro, realizado na sede da União Africana e promovido por diversas agências da ONU, culmina com a adoção da Carta de Adis Abeba, com diretrizes para garantir alimentos mais seguros e menos pessoas contaminadas.
A capital da Etiópia, onde se realizou a conferência, reflete muito do que acontece em todo o continente africano, onde 60% da economia gira em torno dos negócios informais, sobretudo com a venda de alimentos. Mercato, o maior mercado de rua de África, localizado em Adis Abeba, não oferece as mínimas condições sanitárias, mas é o único lugar onde as pessoas mais pobres conseguem comprar alimentos.
Conferência internacional inédita propõe mobilização por segurança alimentar
Segundo a agência das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), em todo o mundo, 420 mil pessoas morrem anualmente por ingerir alimentos contaminados com bactérias, vírus, parasitas, toxinas ou produtos químicos. Esses mesmos alimentos levam a mais de 600 milhões de casos de adoecimento por ano.
Educação no combate a doenças
A médica Paulina Semedo, presidente do Comité Nacional para o Código Alimentar em Angola, destaca que a segurança alimentar está diretamente ligada à educação: "Nossa preocupação primeira é educar as pessoas para ter cuidado com os alimentos. Falamos ‘higiene e segurança alimentar', mas as pessoas não sabem o que isso significa".
"Os governos devem obrigar as pessoas que vendem, que manipulam alimentos, à observância de regras básicas, boas práticas para que as pessoas possam ingerir alimentos seguros, sem o risco de ficarem doentes”, afirma a médica.
Maria Helena Semedo, diretora adjunta da agência das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), concorda que é preciso encontrar maneiras para regularizar os mercados informais e apostar em ações simples para dar mais segurança aos consumidores.
"Eu acho que é um desafio dos governos em termos de regulamentação. Vemos que há milhares de pessoas que vivem desse tipo de venda de comida na rua e nós temos que protegê-las porque é o meio de vida delas. Nós tivemos um exemplo das pessoas que fizeram a formação da FAO e tinham um avental apropriado que dizia ‘Eu tenho certificado da FAO'. No final todos queriam fazer essa formação", conta Maria Helena Semedo.
"São pequenas acções, mas que no final valem muito. E o consumidor, quando vê que consome uma comida de alguém que lhe dá mais segurança, vai para essa pessoa e não para outra”, completa.
Financiamento não é problema
A Carta de Adis Abeba, assinada esta quarta-feira por representantes de 100 países, passa a ser referência internacional sobre segurança alimentar.
O documento prevê, por exemplo, a criação de uma agência de segurança alimentar coordenada pela União Africana em parceria com as associações nacionais já existentes e utilizar o Dia Mundial dos Alimentos Seguros, que será celebrado em 7 de junho, para fomentar a conscientização pública.
A Comissária de Economia Rural e Agricultura da União Africana, Josefa Sacko, afirmou não estar preocupada com o financiamento para colocar em prática as diretrizes do novo documento.
"Mobilização de fundos não é um problema, porque os parceiros estão ao corrente da situação. Sabemos que podemos mobilizar o fundo e mesmo os fundos domésticos porque é uma questão de saúde pública”, diz.
Mercados de Nampula são perigo à saúde pública
Mercados de Nampula são um perigo à saúde pública - alguns não possuem sanitários. Apesar dos esforços dos governantes em alguns locais, muitos vendedores enfrentam mau cheiro para garantir o seu sustento.
Foto: DW/S. Lutxeque
Hipotecar a saúde a favor da sobrevivência
Fátima Sualehe é vendedeira de hortícolas no mercado da Padaria Nampula. Ela desenvolve esta actividade há mais de dois anos, quando se separou do seu esposo. Aqui, ela enfrenta o cheiro ruim produzido pelas águas negras. Mas "é para garantir o sustento dos meus cinco filhos", disse a vendedeira de espinafre.
Foto: DW/S. Lutxeque
Espaço dos CFM transformados em mercado
Nos 18 bairros que a cidade de Nampula tem a apetência de vender, aliada ao desemprego, acarreta no aumento da actividade comercial. Isso faz com que mesmo lugares impróprios sejam ocupados pelos vendedores. Um desses lugares é o recinto dos "Caminhos de Ferro de Moçambique", onde está instalado o famoso "Mercado da Padaria Nampula".
Foto: DW/S. Lutxeque
Nas ruas da cidade
A cidade de Nampula está a ficar praticamente sem ruas e passeios. Nestes locais, vendedores encontram maior atrativo para a prática comercial. "Nos mercados não há muitos clientes, por isso a aproveitamos esses locais para vender nossos produtos e ganhar dinheiro", justificam quase todos os vendedores "assaltantes das ruas".
Foto: DW/S. Lutxeque
"Reciclar" consumíveis e vender
Todas as manhãs, mulheres e crianças escalam o mercado grossista do Waresta, o maior estabelecimento comercial de venda a grosso e a retalho. Nem todos vão para vender, muito menos comprar os produtos. Aproveitam-se da chegada e descarregamento dos camiões de grande tonelagem, transportando produtos, para selecionar os que não estão em decomposição e postereriormente colocá-los nas bancas.
Foto: DW/S. Lutxeque
Lixo e locomotivas
A luta pela sobrevivência de milhares dos moçambicanos, sobretudo os residentes na província mais populosas do país, já está a causar prejuízos e acidentes ferroviários. Os vendedores acumulam lixo e até chegam a embaraçar as locomotivas. As autoridades municipais falam em transferência dos vendedores, enquanto as empresas ferroviárias não param de sensibilizar os vendedores para o abandono.
Foto: DW/S. Lutxeque
Insuficiência de sanitários públicos
Muitos mercados da cidade de Nampula não tem sanitários públicos. Um dos maiores mercados é o da Padaria Nampula, no centro da cidade. Para atender as necessidades biológicas, os vendedores que ficam quase todo o dia a praticar a actividade comercial fazem as necessidades ao relento, mesmo no recinto dos estabelecimentos comerciais.
Foto: DW/S. Lutxeque
Sanitários em abandono
Enquanto muitos estabelecimentos comerciais não possuem sanitários públicos, no mercado grossista do Waresta existem dois desses melhorados, construídos pelas autoridades. Mas, de acordo com os gestores dos mesmos, os vendedores preferem fazer suas necessidades biológicas ao relento, distanciando de pagar uma taxa de 10 meticais por cada vez que necessitam.
Foto: DW/S. Lutxeque
Mercados a céu aberto
Apesar dos esforços da edilidade, reconhecido pelos munícipes, a cidade, que ainda ostenta o título da terceira maior de Moçambique, tem alguns dos seus mercados com aspetos rurais. Há muitos mercados e bancas a céu aberto, e outros de construção precária. Em tempos chuvosos, os vendedores vivem à deriva.
Foto: DW/S. Lutxeque
Partidarização dos mercados
Os partidos políticos na cidade de Nampula também procuram ganhar protagonismo através de propagandas baratas. Em quase todos os mercados da periferia existem bandeiras dos três partidos políticos com assento parlamentar (RENAMO, FRELIMO e MDM). A situação agudizou-se no período das campanhas eleitorais, mas até agora nenhum partido removeu os seus materiais de propaganda.
Foto: DW/S. Lutxeque
Esforços da Edilidade
O Conselho Municipal de Nampula, liderado por Paulo Vahanle, tem, apesar das dificuldades financeiras que herdou do antigo Governo (quando assumiu o poder depois das eleições intercalares) se esforçado para melhorar os mercados. Um deles é o mercado do Waresta, o maior da cidade, que está a beneficiar-se das obras de reabilitação.
Foto: DW/S. Lutxeque
Mercado Novo
O Mercado Novo, localizado no centro da cidade, é o primeiro e mais organizado. Aqui não existe lixo no chão, muito menos degradação. Há lojas organizadas e com sistema de escoamento de águas negras. Está localizado a pouco mais de 200 metros do edifício da edilidade, e a menos de cem metros do Mercado Central. Foi criado no Governo de Mahamudo Amurane, edil já falecido.