Há muito para fazer no processo de desminagem em Angola
Adolfo Guerra (Menongue)
23 de março de 2021
Comunidades locais no Cuando Cubango reconhecem avanços quase 20 anos depois do início do processo de desminagem em Angola. Dificuldades logísticas atrasam o processo e vozes críticas advertem que há muito por fazer.
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Quase duas décadas depois do fim da guerra civil em Angola, que terminou em 2002 e durou mais de 28 anos, o processo de desminagem tem vindo a facilitar o regresso à normalidade da população do Cuando Cubango.
Os benefícios não estão somente ligados à liberdade de circulação, mas também à ampliação das áreas usadas pelas comunidades para a agricultura ou construção de projetos sociais.
"O processo de desminagem tem como vantagem [a criação de] mais espaços para o cultivo e a construção de residências e também tem benefícios para população, [por causa] do alastramento das nossas cidades", comenta Marcial de Sousa, um empreendedor local.
O estudante Feliciano Hegino Muhongo também reconhece o trabalho de desminagem na província, já que nota "alguma evolução no setor agrícola" e mais "circulação de pessoas e bens" em localidades onde "outrora era difícil lá chegar, mas onde hoje se anda à vontade".
Opinião não é unânime
Nem todos estão plenamente satisfeitos com o processo de desminagem, com várias pessoas a admitirem sentir-se seguras quando circulam em Mavinga, Caiundo e Menongue.
Rodrino Jorge Nana, chefe do departamento provincial do Instituto Nacional de Desminagem (INAD) no Cuando Cubango, garante que, só em 2020, 28 hectares de terra ficaram livres de minas em várias localidades da província.
"As áreas em que intervimos foram o troço rodoviário Cuchi/Cutato, algum perímetro da área do Missombo e a antiga sede comunal do Jamba Cuio", referiu.
"Temos a destacar que nesta intervenção [recolhemos] 25 minas antitanque, 45 minas antipessoais, 1.600 engenhos explosivos e 2.664 munições de pequeno calibre", acrescentou.
Só no ano passado, pelo menos nove pessoas ficaram feridas por causa deste tipo de engenhos, uma delas mortalmente.
O processo de desminagem ocorre com alguns entraves. "Atendendo à situação que o país vive na sua generalidade, as dificuldades são as mesmas que passam outros organismos. Temos a questão técnica que [está relacionada com] os meios rolantes [viaturas e próprios combustíveis]", refere o responsável que adianta que os trabalhos de desminagem ainda não arrancaram este ano devido a dificuldades logísticas.
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Reforço de meios
O secretário provincial da CASA-CE, Bernardo Kukumesso, questiona a morosidade do processo de desminagem na província.
"Há 19 anos que temos algumas áreas que não foram desminadas. Isto não permite à população fazer os seus trabalhos, principalmente o trabalho agrícola, porque onde há minas ninguém entra", adverte Bernardo Kukumesso.
Kukumesso chama a atenção para a necessidade de reforçar as condições de trabalho do INAD e da operadora britânica de desminagem The HALO Trust, "para levar a sua atividade avante".
Ratos detectores de minas na Tanzânia, em Moçambique e Angola
A ONG belga APOPO treina ratos africanos gigantes para detectar minas am África. Os roedores são considerados superiores até mesmo aos cães, além de serem leves demais para provocar uma explosão.
Foto: Lieve Blancquaert
"Ratos heróis" salvam vidas
Em vez de cães de detecção de minas, a ONG belga APOPO treina ratos africanos gigantes na Tanzânia. Os ratos têm um faro excepcionalmente aguçado. Uma vez que seu órgão olfativo está sempre perto do chão, são considerados superiores até mesmo aos cães na detecção de minas. Além disso, os roedores, que pesam cerca de um quilograma, são leves demais para provocar uma explosão.
Foto: Lieve Blancquaert
Focinhos sensíveis precisam ser treinados
Os ratos usados na detecção de minas são preparados desde pequenos para identificar o TNT. Desde 2000, a ONG APOPO treina os roedores no campus da Universidade Sokoine de Agricultura, em Morogoro, na Tanzânia. Em 2006, os ratos começam as operações de desminagem em Moçambique, em 2012 em Angola. Antes de entrar em acção, os ratos precisam ser aprovados numa prova.
Foto: Lieve Blancquaert
Busca sistemática
Os ratos aprendem a examinar sistematicamente um campo. Para tal, são presos com uma coleira a uma haste. Dois formadores acompanham o treinamento, cada um numa extremidade da haste. O rato trabalha lentamente em linha reta, de um lado para o outro. Durante a fase de treinamento, o rato exercita primeiro o cheiro de TNT puro, em um recipiente de metal.
Foto: DW/A. Schmidt
Rastreando minas subterrâneas
Mais tarde, o treinamento é feito em um campo onde estão enterradas minas reais com detonadores desativados. Ao farejar o TNT, o rato cava o solo para mostrar que encontrou o explosivo. A formação de cada rato leva cerca de um ano e custa seis mil dólares.
Foto: APOPO
Sucesso premiado
Durante o treinamento, o sucesso dos ratos é recompensado com um click sonoro e comida – aqui, com um pedaço de banana. Um rato detector bem treinado pode farejar até 400 metros quadrados por dia. Em comparação, uma pessoa precisaria de duas semanas para desminar esta área.
Foto: DW/A. Schmidt
Olfato flexível
Comparados a cães, os ratos são menos ligados aos seus tutores individuais. Mesmo quando são treinados com frequência pelo mesmo profissional, este não precisa obrigatoriamente estar presente no campo minado. Ainda assim, os roedores trabalham de forma confiável. Desta forma, os ratos treinados na Tanzânia podem ser enviados, sem problemas, para missões em Moçambique, Angola, Tailândia e Camboja.
Foto: Lieve Blancquaert
Atividade em Moçambique
Em Moçambique, a equipe já examinou mais de 6,5 milhões de metros quadrados de terra. Foram encontradas e destruídas quase duas mil minas terrestres, mil bombas não deflagradas e mais de 12 mil armas e munições. Atualmente, sete equipes com 54 ratos detectores de minas estão em ação. O país anunciou que terá todo o território livre de minas até o final deste ano.