Moçambique: Albinos ainda não são devidamente protegidos
Leonel Matias (Maputo)
13 de junho de 2017
Celebra-se esta terça-feira (13.06) o Dia Mundial da Consciencialização do Albinismo. E em Moçambique é sob o lema “Avançando com renovada esperança”. A Associação “Amor à vida” quer maior proteção para os albinos.
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O vice-presidente da Associação "Amor à vida”, Milton Munjovo, disse à DW África que o número de raptos e assassinatos de pessoas com albinismo em Moçambique "reduziu bastante” no primeiro semestre do corrente ano: "Este ano acho que tivemos no máximo por aí 10 casos diferentemente do ano passado que ultrapassou a casa dos 50."
Estas práticas são levadas a cabo por indivíduos que acreditam que poções ou amuletos produzidos a partir de partes do corpo de pessoas com albinismo têm poderes mágicos, como dar sorte para o enriquecimento.
Ainda há limitações para os albinos
Milton Munjovo considera que a situação da proteção das pessoas com albinismo no país ainda não é das melhores, apesar das melhorias que se registam: "Nós temos, por exemplo, registado casos de pessoas com albinismo que têm vindo a morrer de cancro da pele. Alguns albinos com sorte conseguem chegar ao hospital mas muitos não têm um hospital próximo que lhes possa acolher e tratar. Só para dar um exemplo nós recebemos [aqui em Maputo] pessoas vindas das províncias de Gaza e Inhambane e temos de encaminhar ao hospital central, isto porque de onde vêm não há um serviço de dermatologia e de oncologia.”
E a nível da integração na sociedade há também dificuldades, segundo o vice-presidente da Associação "Amor à vida”. Ele revela que "há igualmente pessoas com albinismo que, por exemplo, nem vão a escola [porque não conseguem enxergar o professor e este não tem a paciência de colocá-lo a frente e dar um tratamento especial], alguns têm dificuldade de arranjar emprego. A questão da discriminação ainda é alta.”
Para Milton Munjovo pode estar a contribuir para a redução do número de raptos e assassinatos o trabalho realizado pela polícia, as comunidades e as associações de proteção das pessoas com albinismo. A título de exemplo conta que "este ano, parte dos casos foram abortados mesmo antes de se concretizarem, o que implica que até certo ponto a polícia está muito mais atenta a essas questões" e Munjovo sublinha: "É preciso reparar também que as pessoas estão alertas e parecem ter mais cuidado com relação a este fenómeno.”
13.06.2017 Dia int. - Albinismo - MP3-Mono
Lei de proteção do albino não é aplicada
Moçambique dispõe desde 2015 de uma lei de proteção da pessoa com albinismo, que de acordo com o vice-presidente da Associação "Amor à vida” é muito boa mas peca por não estar a ser aplicada.
Um quadro legal que criminaliza o rapto, ofensas corporais e assassinatos de pessoas com albinismo está em vigor no país, tendo sido já condenados alguns réus a pena máxima de prisão.
Dados oficiais indicam que o país tem cerca de 20 mil pessoas com albinismo, 70% das quais são crianças, adolescentes e jovens.
Milton Munjovo considera que atualmente o principal desafio é a proteção da pessoa com albinismo, nomeadamente o acesso à educação, à saúde e ao emprego. E justifica que "todas essas áreas sociais concorrem para que a pessoa com albinismo não seja vulnerável. Porque neste momento em que as pessoas com albinismo são vulneráveis elas estão expostas a uma série de males que podem ser praticados contra elas.”
As celebrações do Dia Mundial de Consciencialização do Albinismo, que decorrem há duas semanas com a realização de palestras, inclui esta terça-feira (13.06.) a organização de uma marcha, debates e atividades culturais.
Feitiço e preconceito: albinos em Moçambique
Em vários países africanos, os albinos sofrem preconceito, são perseguidos por curandeiros, rejeitados pelas famílias e têm dificuldade em encontrar trabalho. Há no entanto ativistas que lutam contra a discriminação.
Foto: Carlos Litulo
Sem preconceitos
Por causa de um distúrbio genético, a pele, os olhos e os cabelos de pessoas com albinismo têm falta de melanina, substância responsável pela pigmentação e pela proteção de raios solares ultravioletas. Na foto, Hilário Jorge Agostinho, o único skatista albino de Moçambique. Agostinho incentiva a integração da população albina para combater os preconceitos e a exclusão social dos albinos no país.
Foto: Carlos Litulo
Pele branca, magia negra
Hilário Jorge Agostinho nas proximidades da Rua da Sé, em Maputo. Em vários países africanos, albinos são perseguidos por curandeiros para realizar rituais com eles. Existem muitas crenças ligadas ao albinismo: por exemplo, a de que manter relações sexuais com albinos cura a SIDA, a de que tomar "poção de albino" traz riqueza, ou a de que o toque de mão de um albino traz má sorte.
Foto: Carlos Litulo
O preço da pele
Na Tanzânia, considerado o país com o maior número de albinos do continente africano, albinos são mortos e desmembrados devido a uma crença de que poções feitas com partes dos corpos dos albinos trazem sorte, fortuna e prosperidade. As partes dos corpos de albinos chegam a valer milhares de dólares. Na foto, o skatista albino Hilário Agostinho faz manobra diante da Catedral de Maputo.
Foto: Carlos Litulo
Luta solidária
A luta dos albinos por reconhecimento e inclusão não é solitária, embora na maior parte das vezes não encontre ouvidos atentos. Em 2008, as Nações Unidas declararam oficialmente os albinos como "pessoas com deficiência", depois de assassinatos massivos de pessoas com albinismo na Tanzânia, vizinha de Moçambique, no Burundi e em outros países do leste africano.
Foto: Carlos Litulo
Estigma
Em Moçambique, entre outros países, crianças ou até mesmo bebés chegariam a ser usados em rituais de magia, especialmente no norte do país, na fronteira com a Tanzânia. Os albinos sofrem preconceito em vários países africanos, têm dificuldade em encontrar trabalho e muitas vezes são rejeitados pelas famílias. Na foto, o músico albino Ali Faque ensaia em seu estúdio em Maputo, em janeiro de 2010.
Foto: Carlos Litulo
Proteção da pele e dos olhos
O músico Ali Faque tem sido o embaixador na luta contra a discriminação da população que sofre de albinismo em Moçambique. Na foto, Ali Faque lê partitura em seu estúdio. Por causa da falta de proteção da pele contra os raios solares, os albinos são mais vulneráveis a problemas nos olhos e ao cancro. Precisam de roupa protetora, óculos escuros e acesso aos raros cremes de proteção solar.
Foto: Carlos Litulo
Sem direitos
Artigo do jornal sul-africano "Mail & Guardian", publicado em setembro de 2012, diz que, apesar de o país ser signatário da Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, não haveria reconhecimento dos direitos de albinos neste país da Africa Austral. Em Moçambique, o músico Ali Faque também se empenha pelos direitos dos albinos.
Foto: Carlos Litulo
Mais albinos em África
O albinismo é uma condição que afeta etnias no mundo todo. Mundialmente há um albino em aproximadamente cada 20 mil pessoas. No continente africano, o número dispara para um em cada 4 mil, por ser uma condição hereditária e por mais albinos se relacionarem entre si.
Foto: Carlos Litulo
Vulneráveis
A ONU declarou os albinos "pessoas com deficiência", porque são vulneráveis ao cancro por causa da falta de proteção da pele contra os raios solares. Na Tanzânia, mais de 80 albinos terão morrido em rituais nos últimos anos, várias das pessoas com albinismo terão sido estupradas. O Governo da Tanzânia reconhece os albinos como "minoria ameaçada". Fotos: Carlos Litulo.