O tráfico de albinos desceu na província no norte de Moçambique, mas o medo mantém-se. A polícia apresenta poucos resultados, mas garante que a situação está controlada.
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O tráfico de albinos diminuiu nos últimos dois anos em Nampula. Anteriormente, esta província no norte de Moçambique era a que registava mais casos de raptos no país. Desde o início de 2016, os albinos vivem em relativa tranquilidade. No entanto, dizem que ainda não se sentem muito à vontade. A Polícia moçambicana tem mostrado poucos resultados, mas diz que a situação está controlada. A Procuradoria-Geral de República (PGR) fala de redução em quase metade dos casos processados e julgados no ano passado.
Pedro Augusto, de 19 anos, sofre de albinismo. Confirma que os albinos nos centros urbanos ultimamente vivem momentos de paz, mas receia que o mesmo não aconteça nas zonas rurais.
"O medo continua para todos. Apesar da redução, mesmo assim, nós não temos certeza se isso é só uma mini-pausa. Isso [rapto de albinos] ouço dizer que acontece nas localidades [zonas urbanas] onde existem, mas são casos que não são reportados", diz Pedro.
Casos por resolver
Crenças que atribuem poderes mágicos aos albinos fomentam o mercado negro, onde são vendidas partes dos seus corpos.
No ano passado, foram registados em Nampula 16 casos relacionados com o tráfico de albinos, contra 32 em 2015, de acordo com o procurador-chefe na província de Nampula, Fernando Uache: "Tivemos um total de seis processos julgados e desses processos houve condenação de dez pessoas''.
09.02.17 Redução do tráfico de albinos em Nampula - MP3-Stereo
Segundo o procurador provincial, as campanhas de sensibilização junto das comunidades e a punição severa, com penas que variam entre 10 e 40 anos, foram factores que contribuíram para a redução do fenómeno.
Pedro Augusto é irmão de Auxílio César Augusto, um albino raptado em dezembro de 2014. O jovem terá sido aliciado por estranhos que lhe terão oferecido trabalho, conta o irmão.
"Até hoje não tornamos a vê-lo. Nós podemos pensar que já não está em vida. Existem suspeitos do caso e só foram detidos um mês e foram soltos. E, até hoje, o assunto está parado'', afirmou.
Pedro Augusto mostra-se desiludido com as autoridades policiais e judiciárias pela morosidade na investigação do desaparecimento do irmão. "O processo está na PIC [Polícia de Investigação Criminal] e na Procuradoria, mas a polícia diz que não há provas suficientes para manter detidos os suspeitos".
O porta-voz da Polícia da República de Moçambique em Nampula, Zacarias Nacute, reconhece que alguns casos não foram esclarecidos. Mas promete mais ações, sem avançar datas.
''Mais de 90% dos casos [registados desde 2014] foram esclarecidos, portanto não foi possível esclarecer todos os casos, mas é de louvar porque grande parte dos crimes foram esclarecidos pela Polícia da República de Moçambique", defendeu.
Apesar da calma relativa, a Polícia e a PGR apelam à denúncia de casos de tentativa de tráfico de seres humanos.
Feitiço e preconceito: albinos em Moçambique
Em vários países africanos, os albinos sofrem preconceito, são perseguidos por curandeiros, rejeitados pelas famílias e têm dificuldade em encontrar trabalho. Há no entanto ativistas que lutam contra a discriminação.
Foto: Carlos Litulo
Sem preconceitos
Por causa de um distúrbio genético, a pele, os olhos e os cabelos de pessoas com albinismo têm falta de melanina, substância responsável pela pigmentação e pela proteção de raios solares ultravioletas. Na foto, Hilário Jorge Agostinho, o único skatista albino de Moçambique. Agostinho incentiva a integração da população albina para combater os preconceitos e a exclusão social dos albinos no país.
Foto: Carlos Litulo
Pele branca, magia negra
Hilário Jorge Agostinho nas proximidades da Rua da Sé, em Maputo. Em vários países africanos, albinos são perseguidos por curandeiros para realizar rituais com eles. Existem muitas crenças ligadas ao albinismo: por exemplo, a de que manter relações sexuais com albinos cura a SIDA, a de que tomar "poção de albino" traz riqueza, ou a de que o toque de mão de um albino traz má sorte.
Foto: Carlos Litulo
O preço da pele
Na Tanzânia, considerado o país com o maior número de albinos do continente africano, albinos são mortos e desmembrados devido a uma crença de que poções feitas com partes dos corpos dos albinos trazem sorte, fortuna e prosperidade. As partes dos corpos de albinos chegam a valer milhares de dólares. Na foto, o skatista albino Hilário Agostinho faz manobra diante da Catedral de Maputo.
Foto: Carlos Litulo
Luta solidária
A luta dos albinos por reconhecimento e inclusão não é solitária, embora na maior parte das vezes não encontre ouvidos atentos. Em 2008, as Nações Unidas declararam oficialmente os albinos como "pessoas com deficiência", depois de assassinatos massivos de pessoas com albinismo na Tanzânia, vizinha de Moçambique, no Burundi e em outros países do leste africano.
Foto: Carlos Litulo
Estigma
Em Moçambique, entre outros países, crianças ou até mesmo bebés chegariam a ser usados em rituais de magia, especialmente no norte do país, na fronteira com a Tanzânia. Os albinos sofrem preconceito em vários países africanos, têm dificuldade em encontrar trabalho e muitas vezes são rejeitados pelas famílias. Na foto, o músico albino Ali Faque ensaia em seu estúdio em Maputo, em janeiro de 2010.
Foto: Carlos Litulo
Proteção da pele e dos olhos
O músico Ali Faque tem sido o embaixador na luta contra a discriminação da população que sofre de albinismo em Moçambique. Na foto, Ali Faque lê partitura em seu estúdio. Por causa da falta de proteção da pele contra os raios solares, os albinos são mais vulneráveis a problemas nos olhos e ao cancro. Precisam de roupa protetora, óculos escuros e acesso aos raros cremes de proteção solar.
Foto: Carlos Litulo
Sem direitos
Artigo do jornal sul-africano "Mail & Guardian", publicado em setembro de 2012, diz que, apesar de o país ser signatário da Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, não haveria reconhecimento dos direitos de albinos neste país da Africa Austral. Em Moçambique, o músico Ali Faque também se empenha pelos direitos dos albinos.
Foto: Carlos Litulo
Mais albinos em África
O albinismo é uma condição que afeta etnias no mundo todo. Mundialmente há um albino em aproximadamente cada 20 mil pessoas. No continente africano, o número dispara para um em cada 4 mil, por ser uma condição hereditária e por mais albinos se relacionarem entre si.
Foto: Carlos Litulo
Vulneráveis
A ONU declarou os albinos "pessoas com deficiência", porque são vulneráveis ao cancro por causa da falta de proteção da pele contra os raios solares. Na Tanzânia, mais de 80 albinos terão morrido em rituais nos últimos anos, várias das pessoas com albinismo terão sido estupradas. O Governo da Tanzânia reconhece os albinos como "minoria ameaçada". Fotos: Carlos Litulo.