Alemanha: Coligação governamental a qualquer custo?
Daniel Pelz | ni
12 de janeiro de 2018
Alemanha está perto de chegar a um novo Governo, depois de mais de cem dias das eleições parlamentares. O povo desespera, enquanto os políticos do CDU/CSU e SPD pacientam, apesar do cansaço.
Publicidade
Não se via sinal de entusiasmo nas caras da chanceler Angela Merkel e do líder do partido dos Sociais Democratas Martin Schulz quando apareceram diante dos jornalistas na manhã desta sexta-feira (12.01).
A chanceler Angela Merkel tentou o seu melhor para assegurar aos alemães que o acordo foi um passo na direção certa, mas a sua cara cansada dizia outra coisa: "Mantivemos conversações intensas, sérias e profundas. O documento resultante disso não é um documento superficial, é a expressão das nossas intenções de fazer o que podemos para que os alemães continuem a viver uma boa vida nos próximos 10 a 15 anos."
Pouco descanso foi uma das razões para a postura séria, mas não foi o único motivo. A Alemanha está sem Governo há cerca de cem dias e muitos cidadãos estão cada vez mais impacientes.
Mas nem os democratas cristãos nem os sociais democratas estão muito entusiasmados em formar um novo Governo. Os dois lados lutam para alcançar um acordo sobre reformas políticas há quatro anos.
Sacrificar promessas eleitorais
O líder do SPD, Partido Social-Democrata, Martin Schulz, admite que também foi difícil chegar a consenso desta vez:"Durante as nossas conversações esta noite percebemos que somos partidos diferentes, que temos ideias e programas diferentes. A arte de formar uma coligação é alcançar um compromisso acordados pelos dois partidos e que também beneficie os cidadãos e eleitores deste país", sublinha Schulz.
Os dois lados apresentaram uma proposta de 28 páginas para a formação da nova coligação. Mas o acordo não vai agradar a muitos membros do partido SPD.
A CDU, União Democrata-Cristã, e o SPD acordaram sobre um programa de digitalização de escolas e universidades, algumas pequenas reformas na saúde e uma pensão mínima para os cidadãos pobres. Mas as duas formações terão de sacrificar algumas promessas eleitorais.
Os sociais democratas não conseguiram convencer a CDU a aumentar os impostos para os cidadãos ou fazer aprovar uma reforma radical no setor de saúde. Isso não agradou Martin Schulz.
Internamente SPD ainda precisa de luz verde
Eike-Christian Hornig, professor de ciências políticas na Universidade de Giessen, na Alemanha, falando ao canal público Phoenix recordou o passado de uma coligação entre os dois partidos: "Lembrar as celebrações do SPD na sua sede quando os líderes do partido anunciaram o fim da grande coligação depois das últimas eleições. Agora eles têm de repensar a sua estratégia. Eles terão dificuldades em conquistar o apoio dos membros do partido para esta nova coligação governamental", sugere Hornig.
Mas dias difíceis estão por vir na Alemanha. Uma convenção do partido SPD no fim deste mês de janeiro terá de dar luz verde à liderança do SPD para as negociações formais para a coligação. E todos os membros do SPD têm de aprovar qualquer acordo de coligação em referendo.
Governo de coligação a bem ou mal
Especialistas acreditam que os dois lados irão formar um Governo no final - não porque querem, mas por que têm de o fazer.
Alemanha: Coligação governamental a qualquer custo?
Svenja Krauss é especialista em política na Universidade de Humbold em Berlim e alerta para uma consequência: "Angela Merkel não quer ter um Governo minoritário. Os sociais-democratas estão conscientes de que precisam de entrar para o Governo de forma a proporcionar um Governo estável aos cidadãos."
E Krauss alerta: "Se tivermos um Governo instável, isso pode fortalecer os partidos de direita."
Os dois lados também têm mais uma razão para formar um Governo estável. Se eles falharem podem ser convocadas novas eleições. E é este cenário que os partidos - que viram a sua imagem cair para níveis históricos nas últimas eleições - querem evitar a qualquer custo.
Chefes de Governo da Alemanha: de Adenauer a Merkel
Desde 1949, a Alemanha teve oito chanceleres: sete homens e uma mulher. A chanceler atual, Angela Merkel, conseguiu um quarto mandato nas eleições legislativas de setembro de 2017.
Foto: picture-alliance-dpa/O. Dietze
Konrad Adenauer (CDU), 1949-1963
A eleição de Konrad Adenauer do partido democrata-cristão CDU como primeiro chefe de Governo da Alemanha, em 15 de setembro de 1949, marcou o início de um longo processo de reestruturação política no país. Reeleito em 1953, 1957 e 1961, renunciou ao cargo apenas aos 87 anos de idade, em 1963. Fortaleceu a aliança com os Estados Unidos da América. Na foto: no seu escritório em Bona.
Foto: picture-alliance/akg-images
Ludwig Erhard (CDU), 1963-1966
O segundo chanceler da Alemanha também pertenceu à CDU, mas esteve apenas três anos no Governo. Erhard renunciou devido ao rompimento da coligação com o partido liberal FDP. Mesmo assim, participou de forma ativa da reforma monetária alemã do pós-guerra. O fumador convicto ficou famoso como "pai" da economia social de mercado ("Soziale Marktwirtschaft") e do milagre económico alemão.
Foto: picture-alliance/dpa
Kurt Georg Kiesinger (CDU), 1966-1969
Foi eleito por uma grande coligação dos dois partidos CDU e SPD (de esquerda). O seu Governo teve que combater uma crise económica. Kiesinger foi duramente criticado pelo seu passado como membro ativo do partido nacional-socialista NSDAP durante a ditadura fascista na Alemanha. Com a ausência de uma oposição forte no Parlamento, formou-se em 1968 um movimento de protesto estudantil na Alemanha.
Foto: picture-alliance/dpa
Willy Brandt (SPD), 1969-1974
A onda de protestos teve reflexos nas eleições: Willy Brandt tornou-se no primeiro chanceler social-democrata no pós-guerra. Melhorou as relações com os países comunistas do leste. Durante uma visita à Polónia, ajoelhou-se no monumento pelas vítimas do nazismo no Gueto de Varsóvia. Gesto que ficou famoso como pedido de desculpas. Renunciou ao cargo em consequência de um caso de espionagem.
Foto: picture-alliance/dpa
Helmut Schmidt (SPD), 1974-1982
Após a renúncia de Brandt, Helmut Schmidt prestou juramento como chanceler. O social-democrata teve de combater o terrorismo do grupo extremista de esquerda RAF. Negou negociar com os terroristas alemães. Enfrentou a oposição por causa do estacionamento de mísseis nucleares dos EUA na Alemanha. Depois da saída do Governo do parceiro FDP (liberais), perdeu um voto de confiança no Parlamento.
Foto: picture-alliance/dpa
Helmut Kohl (CDU), 1982-1998
Helmut Kohl formou uma nova coligação centro-direita com os liberais. Ficou 16 anos no poder, um recorde. Ficou famoso pela sua teimosia e por não gostar de reformas. Depois da queda do Muro de Berlim, Kohl consegui reunificar as duas Alemanhas, a RFA ocidental e a RDA oriental. Ficou conhecido como "chanceler da reunificação". T ambém é lembrado pelo seu empenho na construção da União Europeia.
Foto: imago/imagebroker
Gerhard Schröder (SPD), 1998-2005
Depois de quatro mandatos de Kohl, o desejo de mudança aumentou. Gerhard Schröder foi eleito primeiro chanceler de uma coligação de esquerda entre o SPD e os Verdes. Durante o seu Governo, o exército alemão, Bundeswehr, teve as primeiras missões no estrangeiro com a participação na guerra no Afeganistão. Reduziu os subsídios sociais, medida que foi criticada dentro do seu partido social-democrata.
Foto: picture-alliance/dpa
Angela Merkel (CDU), desde 2005
Em 2005, Merkel é eleita como primeira mulher na chefia do Governo alemão. Durante o primeiro e terceiro mandato, governou numa grande coligação com o SPD, no segundo mandato numa coligação de centro-direita com os liberais do FDP. Merkel é conhecida pelo estilo pragmático de liderança. Durante a crise financeira, assumiu um papel de liderança na UE. Em 2017, conseguiu o seu quarto mandato.