Migração, desenvolvimento e segurança continuarão a ser os temas africanos da nova coligação governamental. Para consternação do setor empresarial alemão, projetos do Governo anterior para financiamentos foram extintos.
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No acordo da coligação entre social-democratas (SPD), partido ecologista (Verdes) e liberais (FDP), a palavra "África" aparece quatro vezes. Não é um bom augúrio. O último acordo da coligação prévia entre os conservadores da CDU e o SPD mencionava o continente onze vezes mais. "Em comparação com o Governo anterior, a política africana de Berlim é agora um tema marginal", acusa o pesquisador alemão Robert Kappel numa entrevista com a DW.
A conclusão de que Berlim vai passar a ignorar o continente é errada, afirma o político de desenvolvimento do FDP Christoph Hoffmann. "As pessoas em África podem partir do princípio que vai haver uma certa continuidade na cooperação alemã para o desenvolvimento, que continuará focada em África", disse Hoffmann.
Hoffmann aponta toda uma série de compromissos vinculativos. Assim, o SPD, os Verdes e o FDP vão continuar a investir 0,7% do Produto Interno Bruto nacional na cooperação para o desenvolvimento. A Alemanha cumpriu este compromisso internacional de longa data pela primeira vez em 2020. Do total, 0,2% estão destinados aos países mais pobres do mundo.
Mais clima, mais saúde
A nova coligação ainda complementar a cooperação para o desenvolvimento sobretudo através de um maior financiamento do clima. E deverá haver consequências palpáveis para is mais pobres: "Por exemplo, os pequenos agricultores poderão empreender reflorestações a ser financiadas por fundos internacionais de proteção do clima", explicou Hoffmann à DW. Não foram, no entanto, especificadas somas concretas pelos novos partidos governamentais.
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As organizações de desenvolvimento destacam uma série de pontos positivos do novo acordo em Berlim, dos quais sobretudo as pessoas em África poderão beneficiar. "Pensa-se a saúde de uma forma mais integrada a nível global. Também há o plano de concentrar esforços na educação primária, algo que, no passado, foi negligenciada pela Alemanha", disse à DW Stephan Exo-Kreischer da organização de desenvolvimento ONE.
Mas, de um modo geral, a leitura do novo acordo revela uma repetição de temas demasiado familiares: mais cooperação com a União Africana, apoio à Área de Comércio Livre Africana, mais ajuda para a região do Sahel em crise.
A iniciativa"Compact with Africa" do G20, lançada pelo último Governo da chanceler cessante, Angela Merkel, deverá ter continuidade.
Setor empresarial "dececionado"
Para o analista Robert Kappel, África precisa de tudo menos da política costumeira. Kappel dá um exemplo: "Os países africanos tomaram as suas próprias medidas e já não dependem muito da cooperação para o desenvolvimento. O facto nem sequer é mencionado no documento".
O anterior Governo alemão planeava partir deste facto na política africana. Através da criação de um fundo para investimentos alemães em África, melhor proteção contra riscos para as empresas alemãs e outras medidas, pretendia-se, acima de tudo, expandir a cooperação económica com África.
Para consternação do setor empresarial, estas medidas praticamente deixaram de figurar nos debates. "A África está claramente a ser negligenciada, o que é dececionante", afirma Christoph Kannengießer da Associação Africana das Empresas Alemãs. "Creio que uma coligação que se quer progressiva deve desenvolver e aprofundar as relações com África e empenhar-se por uma parceria verdadeiramente estratégica entre o continente africano a aliança europeia", disse Kannengießer à DW.
Nova política de migração
Também a futura oposição vê a mudança de forma crítica. "É correto ocupar-se da saúde e da educação. Mas isto deve ser complementado por empregos e perspetivas de futuro para que o desenvolvimento seja sustentável. Por isso precisamos de investimentos nos países. Mas nem se fala mais nisso", disse à DW o político de desenvolvimento da CDU Volkmar Klein.
Por outro lado, numerosas outras reivindicações da sociedade civil e dos países africanos foram contempladas no acordo de coligação. Assim, o novo Governo alemão reconhece o seu compromisso histórico e político com a Namíbia e promete promover a reconciliação.
A polémica política alemã de migração também poderá sofrer uma reviravolta. O novo Governo quer fechar acordos de imigração com países importantes como o Gana ou a Nigéria, cujos habitantes passariam a beneficiar de mais vias de acesso legal à Alemanha. Mas para já as medidas do acordo da coligação são afirmações de intenção. Só daqui a quatro anos se verá o que foi concretizado.
Racista e cruel, a história colonial da Alemanha
A exposição no Museu Histórico Alemão, em Berlim, é a primeira grande exibição que explora os capítulos do domínio colonial da Alemanha. Uma história da ambição falhada de uma superpotência.
Foto: public domain
A cara do colonialismo
Com o chanceler Otto von Bismarck, o Império Colonial Alemão estabeleceu-se nos territórios da atual Namíbia, Camarões, Togo e em algumas partes da Tanzânia e do Quénia. O imperador Guilherme II, coroado em 1888, tentou expandir os domínios coloniais. O imperador alemão queria um "lugar ao sol", como disse mais tarde, em 1897, o chanceler Bernhard von Bülow.
Foto: picture-alliance/AP Photo/DW
Colónias alemãs
Foram conquistados territórios no Pacífico (Nova Guiné, Arquipélago de Bismarck, Ilhas Marshall e Salomão e Samoa) e na China (Tsingtao). A Conferência de Bruxelas em 1890 determinou que o imperador germânico iria obter os reinos do Ruanda e Burundi, ligando-os à África Oriental Alemã. No final do século XIX, as conquistas coloniais alemãs estavam praticamente completas.
Foto: picture-alliance / akg-images
Um sistema de desigualdades
A população branca nas colónias era uma minoria, raramente representava mais de 1% da população. Uma minoria privilegiada, contudo. Em 1914, cerca de 25 mil alemães viviam nas colónias, menos de metade no Sudoeste Africano Alemão (atual Namíbia). Os 13 milhões de nativos das colónias alemãs eram vistos como subordinados, sem recurso ao sistema legal.
Foto: picture-alliance/dpa/arkivi
O primeiro genocídio do século XX
O genocídio contra os povos Herero e Nama no Sudoeste Africano Alemão (atual Namíbia) é o mais grave crime na história colonial da Alemanha. Durante a Batalha de Waterberg, em 1904, a maioria dos rebeldes Herero fugiram para o deserto, onde as tropas alemãs bloquearam sistematicamente o acesso à água. Estima-se que morreram mais de 60 mil Hereros.
Foto: public domain
A culpa alemã
Apenas cerca de 16 mil Hereros sobreviveram ao extermínio. Foram depois detidos em campos de concentração, onde muitos acabaram por falecer. O número exato de vítimas continua por apurar e é ponto de controvérsia. Quanto tempo terão sobrevivido os Hereros depois de fugirem para o deserto? Eles perderam todos os seus bens, os seus meios de subsistência e as perspetivas de futuro.
Foto: public domain
Reformas em 1907
Depois das guerras coloniais, a administração das colónias alemãs foi reestruturada com o objetivo de melhorar as condições de vida. Bernhard Dernburg, um empreendedor de sucesso (na imagem, transportado na África Oriental Alemã), foi nomeado secretário de Estado dos Assuntos Coloniais em 1907 e introduziu reformas nas políticas coloniais da Alemanha.
Foto: picture alliance/akg-images
A ciência e as colónias
Com as reformas de Dernburg foram criadas instituições científicas e técnicas para lidarem com assuntos coloniais. Assim estabeleceram-se faculdades nas atuais universidades de Hamburgo e Kassel. Em 1906, Robert Koch dirigiu uma longa expedição à África Oriental para investigar a transmissão da doença do sono. A imagem demonstra amostras coletadas nessa expedição.
Foto: Deutsches Historisches Museum/T. Bruns
Uma das maiores guerras coloniais
De 1905 a 1907, uma ampla aliança de grupos étnicos rebelaram-se contra o poder na África Oriental Alemã. Cerca de 100 mil locais morreram na Revolta de Maji-Maji. Apesar de raramente discutido, este continua a ser um importante capítulo da história da Tanzânia.
Foto: Downluke
A perda das colónias
Derrotada na Primeira Guerra Mundial, a Alemanha assinou o tratado de paz de Versalhes, em 1919, que previa que o país renunciava a soberania sobre as colónias. Cartazes como este demonstram o medo dos alemães de, como consequência, perderem poder económico e viverem na pobreza e na miséria no seu país.
Foto: DW/J. Hitz
Ambições coloniais do "Terceiro Reich"
As aspirações coloniais voltaram a surgir com o nazismo e não apenas em relação à colonização da Europa Central e Oriental, através do genocídio e limpeza étnica. O regime nazi pretendia também recuperar as colónias perdidas em África, como demonstra este mapa escolar de 1938. Os territórios eram vistos como fonte de recursos para a Alemanha.
Foto: DW/J. Hitz
Processo espinhoso
As negociações para uma declaração conjunta do genocídio dos povos Herero e Nama entraram numa fase difícil. Enquanto a Alemanha trava quanto a compensações financeiras, há também deficiências nas estruturas políticas internas da Namíbia. Representantes Herero apresentaram, recentemente, uma queixa à ONU contra a sua exclusão nas negociações em curso.