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PolíticaAlemanha

O que dizem os imigrantes sobre o avanço da AfD na Alemanha?

Oliver Pieper
31 de agosto de 2024

À DW, imigrantes na Alemanha comentam o avanço do partido de extrema direita, AfD, que, segundo as sondagens, pode tornar-se o partido mais forte nas eleições estaduais da Saxónia e da Turíngia este domingo (01.09).

Um cartaz eleitoral do partido Alternativa para Alemanha, AfD, para as eleições estaduais na Turíngia
Um cartaz eleitoral do partido Alternativa para Alemanha, AfD, para as eleições estaduais na TuríngiaFoto: dts-Agentur/dpa/picture alliance

Na Alemanha, esta pode ser uma situação comum nos comboios. O controlo pede a todos os passageiros que mostrem os seus bilhetes - Nour Al Zoubi foi a única pessoa do compartimento que teve de mostrar uma identificação adicional.

Caso contrário, ameaça a condutora, chamará imediatamente a polícia. Situações como esta são há muito tempo a norma para a mulher nascida na Síria, que trabalha como conselheira no Conselho de Refugiados da Turíngia, um Estado localizado no leste alemão.

"Existe um racismo quotidiano", afirmou numa entrevista à Deutsche Welle. "Mas depois de seis anos na cidade de Gera [na Turíngia], já estou habituada e sei como lidar com isso na maior parte das vezes", desabafou.

Mudar-se para outra cidade está fora de questão para Al Zoubi, mesmo que o partido Alternativa para Alemanha, AfD, classificado como extremista de direita pelo Gabinete para a Proteção da Constituição alemão, ganhe as eleições estaduais na Turíngia.

A Turíngia é a sua casa, explica a assistente social, que recebeu o Prémio de Integração da cidade de Gera, com 95 mil habitantes, em 2020, por um projeto de jornal com refugiados.

Nour Al Zoubi é assistente social e consultora do Conselho para os Refugiados da TuríngiaFoto: Privat

Após o incidente no comboio, duas mulheres mais velhas encorajaram-na - talvez esta seja outra razão pela qual se sinta motivada a ficar. "É que o número de eleitores da AfD aumentou, mas também aumentou o número de alemães que são a favor de uma cultura de acolhimento", disseram-lhe.

No entanto, a síria também conhece pessoas que estão a pensar em deixar a Turíngia se o AfD ganhar as eleições. "Mas nem todos os imigrantes na Turíngia têm a possibilidade de o fazer. Os refugiados e os requerentes de asilo são obrigados a permanecer no Estado durante três anos, devido às restrições de residência", explicou.

O tom em relação aos migrantes tem sido cada vez mais duro e o recente ataque com faca em Solingen, que deixou três pessoas mortas, é suscetível de alimentar ainda mais o clima.

Para Al Zoubi, isto significa cautela. Em dezembro de 2023, o líder da AfD da Turíngia, Björn Höcke, teve o seu público na cidade de Gera a gritar slogans nazis. E, com frequência, às segundas-feiras, marchas de protesto percorrem as ruas da pequena cidade gritando contra a migração.

O que é que ela teme se houver mesmo uma mudança para a direita neste domingo? "Penso que vamos sentir ainda mais o racismo nos espaços públicos. Não se tratará apenas de insultos, mas também de violência física. Tenho medo disso, especialmente quando ouvimos o que acabou de acontecer em Southport, no Reino Unido".

"O que a AFD promoveu tornou-se agora socialmente aceitável", disse o analista Ismail DavulFoto: privat

Imigrantes temem AfD

Al Zoubi não está sozinha na sua visão pessista do futuro. 150 quilómetros a leste, Ismail Davul, que vive na cidade alemã de Dresden, tem pensamentos semelhantes.

Nascido na Turquia, veio para a e Estado da Saxónia em 2006 para estudar, e trabalha no Conselho de Estrangeiros da cidade há quase onze anos. Ocupa-se sobretudo de jovens imigrantes, mas também ouve as preocupações dos pais,

"Algumas pessoas já me perguntaram qual é o rumo que isto vai tomar, aqui, na Saxónia? O que é que vai significar se o AfD ganhar? Nossa vida vai mudar? O estado de espírito é muito claro: as pessoas estão assustadas", disse.

Com frequência, também Davul tem ouvido pessoas a pensar em mudar-se de Dresden se o partido AfD ganhar as eleições estaduais na Saxónia. Ele e a sua equipa tentam então tranquilizar as pessoas dizendo-lhes que os partidos democráticos na Câmara Municipal lutariam contra a viragem à direita, que a situação não mudaria de um dia para o outro e que o Conselho de Estrangeiros, e muitas organizações da sociedade civil, continuarão lá.

Mas a triste realidade na cidade é a de que as autoridades estão, cada vez mais, a ouvir falar de ataques contra migrantes, disse o assistente social à DW.

"No passado, era muito raro um incidente isolado em que um migrante era atacado. Havia muito mais atenção dos meios de comunicação social para o facto de que algo assim não deveria acontecer. Hoje, o que nos dizem é que todos os dias algum migrante é atacado, agredido ou cuspido por causa causa da sua aparência, da cor da sua pele ou dialeto. Infelizmente, isto é quase uma coisa natural nas ruas", explicou.

"Os migrantes não são menos propensos a votar no AfD do que as pessoas sem antecedentes migratórios", disse Özgür ÖzvatanFoto: Frederic Kern/Geisler/picture alliance

Há imigrantes de extrema direita?

Enquanto muitos imigrantes preocupam-se com uma vitória eleitoral da AfD na Turíngia e na Saxónia, há outros que estão decididos a votar no partido de extrema direita. Em outras palavras, pretendem votar no mesmo partido que se insurge contra os refugiados - e que tornou o termo "remigração" socialmente aceitável.

Como isso é possível? Segundo Özgür Özvatan, sociólogo político da Universidade Humboldt de Berlim, o AfD tem como alvo principal os eleitores do conservador turco Recep Tayyip Erdoğan, e os russos que passaram a viver na Alemanha durante o período na União Soviética (URSS).

"Em primeiro lugar, a mensagem é agarrar as pessoas pelo seu orgulho nacional e que não é fundamentalmente errado tê-lo. Um vídeo a favor de Erdoğan, por exemplo, atrai emocionalmente as pessoas de origem turca. E, para os russo-alemães, há a narrativa de que tiveram de abandonar a sua língua, que se esperava que falassem alemão corretamente o mais depressa possível, que ainda são invisíveis aqui e que tiveram de abandonar tudo há 30 anos", disse.

Então, a narrativa da AfD para os eleitores migrantes é a seguinte: "Antes, era preciso trabalhar muito para ter tudo, enquanto os novos refugiados estão a receber tudo". Özvatan explica que, apesar de afirmações como essas não serem verificadas, não serem provadas como factos, a narrativa sugere certas "verdades".

O partido AfD aprendeu a comunicar com grupos-alvo específicos nas novas plataformas de redes sociaisFoto: Janine Schmitz/ picture alliance

Isso acontece particularmente nas redes sociais, como o Tiktok, onde o partido AfD está a fazer uma campanha intensa para obter os votos dos jovens migrantes, com muito dinheiro e também com a ajuda de influenciadores - também migrantes. Segundo o cientista político, o cálculo é simples: só se pode tornar um partido popular com os votos de pessoas com um historial de migração.

"O partido AfD aprendeu a comunicar com grupos-alvo específicos nas novas plataformas de redes sociais. E compreendeu muito bem que o algoritmo de recomendação permite a divulgação simultânea de posições quase contraditórias neste mundo das redes sociais. Acima de tudo, existe uma vantagem para os partidos antidemocráticos: conteúdos abreviados e falsos têm um maior potencial de 'viralizarem' nas redes sociais", concluiu.

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