A justiça norte-americana retoma, esta quinta-feira (25.01), um processo contra a Alemanha, pelo assassínio de mais de 75 mil pessoas dos povos Herero e Nama durante a era colonial na atual Namíbia.
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Os Herero e os Nama exigem indemnizações do Governo alemão e a inclusão nas negociações em curso entre a Alemanha e a Namíbia sobre o reconhecimento do genocídio que ocorreu há mais de 100 anos. Os dois povos deram ínicio a um processo num tribunal de Nova Iorque contra a Alemanha, no ano passado. No entanto, Berlim tem tentado ignorar a ação judicial.
O Governo alemão não nomeou um representante para as audiências e o senador para a Justiça de Berlim, Dirk Behrendt, rejeitou as queixas, alegando que as acusações apresentadas no tribunal norte-americano violam a imunidade soberana – um princípio do Direito Internacional que evita que um Estado seja submetido à jurisdição interna de outro país.
Batalha legal sobre genocídio na Namíbia continua
A Alemanha solicitou o encerramento do processo, mas a Justiça norte-americana rejeitou o pedido. Agora, o país tem até ao dia 9 de fevereiro para se manifestar, o que para o advogado das tribos Herero e Nama, Kenneth McCallion, é positivo. "Apesar de o Governo alemão ter tentado rejeitar o serviço diplomático, agora reconhece que deve responder à queixa, por isso estou bastante confiante de que enviarão um representante legal ao tribunal a 25 de janeiro”, explica.
Ainda que o Governo alemão mantenha a sua posição de rejeitar o processo, ou mesmo que os povos Herero e Nama não obtenham o resultado esperado no tribunal, a ação judicial já surtiu alguns efeito. O processo judicial e o fracasso da Alemanha em pedir desculpas pelo genocídio protagonizado por tropas coloniais no início do século passado têm gerado uma série de críticas.
Para Henning Melber, especialista alemão-namibiano, "o Governo alemão não ganha nada ao rejeitar o processo". "Mais de dois anos de negociações bilaterais até agora não produziram resultados, e ambos se recusam a fornecer detalhes sobre estas negociações para o público”, acrescenta.
Berlim faz pressão
A pressão para que o Governo alemão se desculpe pelo genocídio na Namíbia também é crescente em Berlim. Em entrevista à emissora alemã ZDF, Anton Hofreiter, líder parlamentar do Partido Verde, disse que é "vergonhoso" que um pedido de desculpas ainda não tenha ocorrido.
Já Ruprecht Polenz, representante especial da Alemanha que lidera as negociações com a Namíbia desde 2015, refuta as críticas e garante que ambos os Governos chegaram a acordos importantes, e que questões técnicas estão a ser trabalhadas.
Compensação pelo genocídio
O representante alemão dá conta ainda que, como forma de compensação pelo genocídio da era colonial, o país pretende implementar um fundo para projetos de educação, fornecimento de eletricidade, construção de habitações e reforma agrária, principalmente nas áreas onde vivem os Herero e os Nama.
A criação deste fundo pode ser um sinal de que ambos os países estão a avançar para um compromisso. Quando as negociações começaram, a Alemanha negou o pagamento de indemnizações às tribos, alegando o envio de "generosas” quantias para ajudar no desenvolvimento da Namíbia desde a sua independência, em 1990. Mas os líderes dos dois povos insistem que as reparações devem ser destinadas diretamente às comunidades afetadas pelo massacre na era colonial.
Ainda não está claro se os líderes dos Herero e dos Nama aprovarão a ideia discutida entre os Governos. E também não há confirmação sobre quando as negociações podem ser concluídas.
Sabe-se que um pedido de desculpas oficial da Alemanha ainda levará tempo, mesmo que haja um acordo entre os países. Isto porque, atualmente, o país tem um Governo provisório e ainda pode demorar meses até que seja formado um novo Governo.
Racista e cruel, a história colonial da Alemanha
A exposição no Museu Histórico Alemão, em Berlim, é a primeira grande exibição que explora os capítulos do domínio colonial da Alemanha. Uma história da ambição falhada de uma superpotência.
Foto: public domain
A cara do colonialismo
Com o chanceler Otto von Bismarck, o Império Colonial Alemão estabeleceu-se nos territórios da atual Namíbia, Camarões, Togo e em algumas partes da Tanzânia e do Quénia. O imperador Guilherme II, coroado em 1888, tentou expandir os domínios coloniais. O imperador alemão queria um "lugar ao sol", como disse mais tarde, em 1897, o chanceler Bernhard von Bülow.
Foto: picture-alliance/AP Photo/DW
Colónias alemãs
Foram conquistados territórios no Pacífico (Nova Guiné, Arquipélago de Bismarck, Ilhas Marshall e Salomão e Samoa) e na China (Tsingtao). A Conferência de Bruxelas em 1890 determinou que o imperador germânico iria obter os reinos do Ruanda e Burundi, ligando-os à África Oriental Alemã. No final do século XIX, as conquistas coloniais alemãs estavam praticamente completas.
Foto: picture-alliance / akg-images
Um sistema de desigualdades
A população branca nas colónias era uma minoria, raramente representava mais de 1% da população. Uma minoria privilegiada, contudo. Em 1914, cerca de 25 mil alemães viviam nas colónias, menos de metade no Sudoeste Africano Alemão (atual Namíbia). Os 13 milhões de nativos das colónias alemãs eram vistos como subordinados, sem recurso ao sistema legal.
Foto: picture-alliance/dpa/arkivi
O primeiro genocídio do século XX
O genocídio contra os povos Herero e Nama no Sudoeste Africano Alemão (atual Namíbia) é o mais grave crime na história colonial da Alemanha. Durante a Batalha de Waterberg, em 1904, a maioria dos rebeldes Herero fugiram para o deserto, onde as tropas alemãs bloquearam sistematicamente o acesso à água. Estima-se que morreram mais de 60 mil Hereros.
Foto: public domain
A culpa alemã
Apenas cerca de 16 mil Hereros sobreviveram ao extermínio. Foram depois detidos em campos de concentração, onde muitos acabaram por falecer. O número exato de vítimas continua por apurar e é ponto de controvérsia. Quanto tempo terão sobrevivido os Hereros depois de fugirem para o deserto? Eles perderam todos os seus bens, os seus meios de subsistência e as perspetivas de futuro.
Foto: public domain
Reformas em 1907
Depois das guerras coloniais, a administração das colónias alemãs foi reestruturada com o objetivo de melhorar as condições de vida. Bernhard Dernburg, um empreendedor de sucesso (na imagem, transportado na África Oriental Alemã), foi nomeado secretário de Estado dos Assuntos Coloniais em 1907 e introduziu reformas nas políticas coloniais da Alemanha.
Foto: picture alliance/akg-images
A ciência e as colónias
Com as reformas de Dernburg foram criadas instituições científicas e técnicas para lidarem com assuntos coloniais. Assim estabeleceram-se faculdades nas atuais universidades de Hamburgo e Kassel. Em 1906, Robert Koch dirigiu uma longa expedição à África Oriental para investigar a transmissão da doença do sono. A imagem demonstra amostras coletadas nessa expedição.
Foto: Deutsches Historisches Museum/T. Bruns
Uma das maiores guerras coloniais
De 1905 a 1907, uma ampla aliança de grupos étnicos rebelaram-se contra o poder na África Oriental Alemã. Cerca de 100 mil locais morreram na Revolta de Maji-Maji. Apesar de raramente discutido, este continua a ser um importante capítulo da história da Tanzânia.
Foto: Downluke
A perda das colónias
Derrotada na Primeira Guerra Mundial, a Alemanha assinou o tratado de paz de Versalhes, em 1919, que previa que o país renunciava a soberania sobre as colónias. Cartazes como este demonstram o medo dos alemães de, como consequência, perderem poder económico e viverem na pobreza e na miséria no seu país.
Foto: DW/J. Hitz
Ambições coloniais do "Terceiro Reich"
As aspirações coloniais voltaram a surgir com o nazismo e não apenas em relação à colonização da Europa Central e Oriental, através do genocídio e limpeza étnica. O regime nazi pretendia também recuperar as colónias perdidas em África, como demonstra este mapa escolar de 1938. Os territórios eram vistos como fonte de recursos para a Alemanha.
Foto: DW/J. Hitz
Processo espinhoso
As negociações para uma declaração conjunta do genocídio dos povos Herero e Nama entraram numa fase difícil. Enquanto a Alemanha trava quanto a compensações financeiras, há também deficiências nas estruturas políticas internas da Namíbia. Representantes Herero apresentaram, recentemente, uma queixa à ONU contra a sua exclusão nas negociações em curso.