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Amnistia alerta para violência em Moçambique e Angola

Lusa
29 de março de 2022

Cabo Delgado surge como a situação "mais crítica" em Moçambique, no relatório anual sobre os Direitos Humanos no mundo. Em Angola, a Amnistia está preocupada com a violência policial, a liberdade de imprensa e a seca.

Amnesty International Protest Wahlen in Malin 2013
Foto: picture-alliance/dpa/W. Kumm

A Amnistia Internacional (AI) classifica o conflito em Cabo Delgado, norte de Moçambique, como a situação "mais crítica" no país, na edição 2021/22 do relatório sobre o estado dos Direitos Humanos no mundo.

"O conflito armado na província de Cabo Delgado continua a ser a questão mais crítica, com o Presidente Nyusi a enfrentar comentários sobre descuidos na gestão" da situação, lê-se no documento, que faz um resumo dos vários casos de violação de direitos humanos tornados públicos no período - tanto no norte, como noutros pontos do país.

"O grupo armado conhecido localmente como Al-Shebab, forças de segurança do Governo e agentes militares privados continuaram a cometer crimes de guerra e outras violações graves dos direitos humanos", refere a AI, reafirmando a posição assumida há um ano.

Segundo a organização de defesa dos direitos humanos, "as autoridades lidaram mal com a crise humanitária em Cabo Delgado, minando seriamente os direitos à alimentação, água, educação, habitação e saúde".

Mulheres e jornalistas sob ataque

Além do conflito no norte, outros problemas persistem no resto do país. "A violência contra mulheres e raparigas continuou descontrolada", lê-se no relatório, que faz alusão à denúncia de uma rede de exploração sexual de reclusas por guardas de uma cadeia de Maputo.

O documento destaca ainda as denúncias feitas por organizações de apoio à mulher sobre maus-tratos obstétricos. "As grávidas foram tratadas desumanamente, espancadas, insultadas e humilhadas em maternidades públicas", refere. 

Ao mesmo tempo, "as autoridades sufocaram a atividade no espaço cívico através de intimidação, assédio e ameaças contra ativistas da sociedade civil e jornalistas", conclui a Amnistia Internacional.

Deslocados de Cabo Delgado num centro de acomodação em Mueda.Foto: Chris Huby/Le Pictorium/dpa/picture alliance

"Autoridades violaram direito internacional"

Em declarações à Lusa, à margem da apresentação das principais conclusões do relatório anual, em Joanesburgo, a secretária-geral da AI, Agnès Callamard salientou que a organização encontrou "violações massivas" do direito humanitário e internacional na província de Cabo Delgado, norte de Moçambique. 

"A Amnistia Internacional investigou a situação em Cabo Delgado no ano passado, descobrimos violações massivas do direito humanitário, pessoas a serem mortas, torturadas, muitos refugiados, empresas privadas de segurança envolvidas, exércitos governamentais envolvidos", declarou. "A situação é extremamente grave por causa do potencial para ir mais longe, e por causa do facto de haver tantas armas disponíveis e muito pouca regulamentação", frisou.

Questionada pela Lusa sobre o apoio militar internacional a Moçambique, nomeadamente de países da União Europeia, Agnès Callamard considerou que "isso deve ser feito de acordo com as melhores regras possíveis em relação à exportação de armamento".

"Na nossa investigação, descobrimos que as autoridades moçambicanas violaram o direito internacional e se o fizerem escolhendo armas vendidas por outros países, esses outros países podem ser cúmplices dessas violações de direitos humanos", sublinhou à Lusa.

O Presidente Filipe Nyusi, durante uma visita a uma base militar em Mueda.Foto: Roberto Paquete/DW

Uso excessivo da força em Angola

Uso excessivo de força pelas autoridades policiais, ameaças à liberdade de imprensa e impacto da seca em Angola, com consequente aumento da fome, são as principais preocupações que a Amnistia Internacional identifica no seu relatório anual sobre direitos humanos.

Angola está entre um grupo de 12 países africanos onde morreram pessoas devido ao uso de munições reais para dispersar manifestantes.

A ONG destaca casos como os confrontos com a polícia durante uma manifestação em Cafunfo (Lunda Norte), em janeiro de 2021, que provocaram um número indeterminado de mortos e feridos, bem como as "prisões arbitrárias" de manifestantes e líderes da comunidade, entre os quais o líder do Movimento do Protetorado Português da Lunda Tchokwe, José Mateus "Zecamutchima".

Também em Cabinda, a 30 de maio, a polícia prendeu várias pessoas após pôr fim de forma violenta a uma marcha que visava protestar contra a fome, desemprego e custo de vida.

A liberdade de expressão e de reunião foi também posta em causa, a 4 de fevereiro, quando membros da sociedade civil contestatária de Luanda que defendiam alternativas políticas ao partido dirigente, MPLA, foram travados pela polícia.

O mesmo aconteceu a 21 de agosto, contra um grupo que protestava contra as violações de direitos humanos, a 30 de agosto com ativistas que se manifestavam contra a nova lei eleitoral, e em 25 de setembro, com o Movimento de Estudantes Angolanos que queria protestar contra o aumento das propinas.

Repressão policial de um protesto em Luanda contra a situação em Cafunfo.Foto: Borralho Ndomba/DW

Imprensa e seca também preocupam

O relatório da AI critica também os ataques à liberdade de imprensa, recordando a suspensão, por alegadas irregularidades administrativas, dos canais televisivos Zap Viva, Vida TV e TV Record Africa Angola, em abril do ano passado, resultando na perda de centenas de postos de trabalho.

Refere igualmente os acontecimentos de 11 de setembro de 2021 quando militantes da UNITA impediram jornalistas da TV Zimbo (antigo órgão privado que passou a integrar a esfera estatal no âmbito da recuperação de ativos promovida pelo Executivo angolano) de fazer a cobertura de um protesto em Luanda, indicando que os repórteres preferiram permanecer anónimos para evitar represálias.

As alterações climáticas e a degradação ambiental são outra das preocupações da ONG nos países africanos. Angola viveu o pior período de seca em 40 anos, refletindo-se no aumento da desnutrição devido à falta de alimentos e falta de acesso à água e saneamento adequado, afetando sobretudo as mulheres, crianças e idosos, aponta o relatório.

O documento indica que "a seca, juntamente com a ocupação ilegal por agricultores comerciais de pastagens comunais, destruíram a capacidade das comunidades pastoris produzirem alimentos para si mesmas". A morte do gado numa região que depende fortemente da pecuária como base da sua riqueza económica, social e cultural enfraqueceu a resiliência das comunidades, acrescenta o documento.

A AI salienta ainda que o desvio de fundos estatais prejudicou a capacidade do Governo de aliviar as dificuldades económicas generalizadas e lidar com as dificuldades do setor de saúde, agravadas pela pandemia, persistindo preocupações com o aumento do custo de vida e a devastação económica e social relacionada com a Covid-19.

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