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Analista acredita que Moçambique terá corte da sua dívida

Lusa | cvt
18 de junho de 2017

Para Ravi Bhathia, corte significativo no valor a pagar aos credores poderia levar FMI a retomar ajuda financeira a Moçambique. Analista espera transição política "suave" em Angola.

U.S. Dollarnoten
Foto: picture alliance/J. Greve

O analista da Standard & Poor's, Ravi Bhathia, que segue Moçambique e Angola, concedeu uma entrevista à Agência Lusa, em Londres.

Bhatia considerou que o cenário mais provável para a crise da dívida e Moçambique é uma corte significativo, aceite pelos credores, e que permita nova ajuda do Fundo Monetário Internacional (FMI).

"A reestruturação da dívida, especialmente se contemplar um 'haircut' [corte no valor a pagar aos credores face ao inicialmente acordado] significativo, faria a dívida pública descer para níveis sustentáveis, o que poderia permitir ao Fundo Monetário Internacional (FMI) considerar que a dívida está numa trajetória mais sustentável e, assim, retomar a ajuda financeira", disse Ravi Bhathia.

O diretor do departamento de crédito para o continente africano ressalvou que a reestruturação da dívida, envolvendo um corte significativo no valor a pagar aos credores, não é o cenário que a agência de 'rating' defende, mas parece ser o cenário mais provável dadas as dificuldades financeiras de Moçambique, que entrou em incumprimento financeiro sobre uma emissão de dívida pública, quando não pagou uma prestação de quase 60 milhões de dólares, em janeiro passado.

Sede da Standard and Poor's em Nova IorqueFoto: dapd

"Depois de um acordo de reestruturação, o 'default' podia ser visto como estando resolvido, e aí Moçambique poderia, potencialmente, avançar para uma nova fase e começar a pedir emprestado outra vez", disse o analista.

Em causa está a falta de pagamento de uma emissão de 727 milhões de dólares feita no ano passado, e mais 1,4 mil milhões de dólares que as empresas públicas Mozambique Asset Management e ProIndicus contraíram em 2013 e 2014 com garantia do Estado, mas sem inscreverem os valores nas contas públicas oficiais de Moçambique nem informarem os doadores internacionais.

À espera da auditoria da Kroll

Questionado sobre a possibilidade de o 'rating' do país, atualmente em ‘Selective Default’ (Defalut Seletivo), ser revisto em agosto, quando for publicada a próxima avaliação sobre a qualidade do crédito soberano do país, Ravi Bhathia respondeu que, "do ponto de vista do 'rating' sobre as emissões em moeda estrangeira, a situação não mudou muito desde fevereiro", data da última avaliação da S&P sobre Moçambique.

"Para mudarmos o 'rating' era preciso uma resolução da questão da dívida para podermos avançar", e isso dificilmente acontecerá enquanto a auditoria da Kroll -- uma das condições do FMI e dos outros doadores para começarem as negociações que poderão conduzir à retoma da ajuda financeira -- não for divulgada.

Entrada da sede do FMI em WashingtonFoto: picture-alliance/dpa/J. Lo Scalzo

Ainda assim, sublinhou Bhathia, "os doadores vão continuar envolvidos, porque Moçambique é um país pobre com um PIB [Produto Interno Bruto] per capital baixo e até há pouco tempo tinha crescido rapidamente, e tem um perfil que se encaixa tipicamente no de um país elegível para empréstimos concessionais".

O apoio dos doadores, disse, não parou completamente com a divulgação das dívidas ocultas do orçamento e dos doadores, no valor de 1,4 mil milhões de dólares, foi antes canalizado do apoio ao orçamento, centrando-se agora em projetos concretos em setores específicos.

Eleições não devem alterar cenário em Angola

Em relação a Angola, o analista da Standard & Poor's disse à Lusa não esperar grandes mudanças em termos de política ou direção económica no seguimento das eleições presidenciais de agosto.

"A provável eleição de João Lourenço como novo Presidente da República é neutra do ponto de vista do crédito e não deverá trazer grandes mudanças na política económica do país, por isso esperamos uma transição suave", considerou.

Ravi Bhathia vincou que apesar de antecipar tranquilidade nas eleições presidenciais de 23 de agosto, "com o passar do tempo o novo Presidente vai consolidar o poder e as mudanças serão visíveis, e é daqui a um ano ou dois que a sociedade vai avaliar se houve ou não mudanças que respondam aos anseios da população, nomeadamente os jovens".

João Lourenço, candidato do MPLA à Presidência de Angola

Para a S&P, que mantém Angola em territórios de recomendação de não investimento, com uma Perspetiva de Evolução Negativa, o país é um caso típico de uma economia demasiado dependente de uma só matéria-prima, e que não conseguiu diversificar nem poupar o suficiente quando o petróleo estava a mais do dobro do preço atual, à semelhança do que fez o Kuwait, exemplificou o analista.

"A queda dos preços para metade teve um impacto enorme nos produtores de todo o mundo, não apenas em Angola", salientou Ravi Bhathia, apontando que a diversificação em que Angola devia ter apostado há anos é agora mais difícil de fazer, com o orçamento pressionado e com a dívida pública quase nos 60% da riqueza do país".

Para uma economia "de mais ou menos 100 mil milhões de dólares, é bastante elevado, não em termos de percentagem do PIB, mas em termos absolutos, já que uma grande parte são empréstimos chineses, sobre os quais há pouca informação", concluiu.

Apesar das dificuldades, a S&P elogia o esforço angolano em ter feito uma "redução muito grande" das despesas e no ajustamento orçamental, que consideram ser "muito significativo".

A taxa de câmbio, por outro lado, "era muito forte e importar produtos agrícolas da África do Sul ou do Brasil era mais barato que produzir e transportar desde o interior do país, embora isto, muito lentamente, esteja a mudar", disse o analista.

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