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Angola: "Bastonária não serve interesses da classe médica"

António Cascais | Lusa
17 de setembro de 2020

É o ponto único na assembleia convocada para daqui a um mês: a destituição da bastonária da Ordem dos Médicos de Angola. Elisa Pedro Gaspar é acusada de gestão danosa e de lidar mal com o caso Sílvio Dala.

Foto: Fernando Sefrin

O Conselho Regional Norte da Ordem de Médicos de Angola convocou para 17 de outubro uma assembleia geral que terá como ponto único discutir a destituição da bastonária, Elisa Pedro Gaspar.

Em comunicado, os associados manifestam o seu desagrado com o desempenho da bastonária, que se agudizou com as "recentes ocorrências graves", como o "não alinhamento aos interesses da classe", a "falta de transparência na gestão dos recursos da Ordem" e "denúncias de má gestão financeira".

Na sexta-feira (11.09), o semanário angolano Novo Jornal noticiou que a bastonária é acusada de desviar 19 milhões de kwanzas (cerca de 27 mil euros), uma denúncia feita pelo seu antigo diretor de gabinete, Domingos Cristóvão.

Segundo vários órgãos de imprensa angolanos, Elisa Gaspar terá afirmado que as acusações "não correspondem à realidade". A DW tentou em vão recolher uma reação da bastonária, que, apesar de várias tentativas de contacto, não atendeu pessoalmente o seu telefone.

Caso Sílvio Dala

Muitos médicos angolanos estão também insatisfeitos depois de a bastonária se demarcar da marcha convocada pelo Sindicato Nacional dos Médicos (SINMEA) em homenagem a Sílvio Dala, pediatra que morreu no início de setembro na sequência de uma intervenção policial. O protesto juntou centenas de profissionais de saúde e elementos da sociedade civil na capital do país, Luanda.

Protesto em Luanda, no fim de semana, contra a violência policialFoto: DW/M. João

Elisa Gaspar disse em entrevista à televisão pública TPA: "A Ordem solidariza-se com a família do médico, a Ordem esteve presente no velório, a Ordem está triste com a forma como a notícia da morte do médico saiu, mas manifestação contra quem!? Manifestação para homenagear o médico, sim, ele trabalhou no Hospital Pediátrico, a homenagem deve ser feita no hospital e não sair à rua e fazer o que [se] quer fazer, porque há sempre muito aproveitamento político e nós somos médicos, não nos podemos misturar com política."

A posição da bastonária é vista com "muita tristeza" pelo presidente do SINMEA, Adriano Manuel. Por isso, considera natural a reação dos associados da Ordem dos Médicos.

O caso Sílvio Dala abalou a classe médica angolana. Em entrevista à DW África, Adriano Manuel avança que o sindicato se prepara para pedir explicações à polícia sobre o que aconteceu ao médico, através dos tribunais.

DW África: O Sindicato Nacional dos Médicos de Angola (SINMEA) anunciou há dias, em Luanda, que tem provas concretas de que o seu colega, Sílvio Dala, não faleceu de "enfarte agudo do miocárdio", mas por outras causas. O que pretende o sindicato fazer em relação a isto?

Adriano Manuel (AM): Reagimos com uma manifestação e também com um sentimento de descontentamento. Todas as justificações e incongruências que nos foram apresentadas pela polícia nacional levam-nos a crer que a morte do nosso colega não foi conforme a polícia diz, devido a um "enfarte agudo do miocárdio". Não concordamos com esse diagnóstico. Por isso mesmo, para além da manifestação que fizemos, o sindicato tenciona intimar judicialmente a polícia nacional. Estamos a preparar isso nesta altura.

Marcha contra a violência policialFoto: DW/M. João

DW África: Queixou-se também da Sra. bastonária da Ordem dos Médicos, a Dra. Elisa Gaspar. Disse nomeadamente que ela não se mostrou solidária com Sílvio Dala e os seus familiares...

AM: Quando S. Exa., a bastonária da Ordem dos Médicos, se demarca daquilo que o sindicato, de uma forma geral, e a sociedade civil acharam que era o caminho ideal para protestar contra os excessos da polícia nacional, isso é motivo de muita tristeza por parte da classe médica. Por isso mesmo é que há um movimento, que nasceu agora, para o impeachment [destituição] da bastonária. Nós concluímos que a bastonária não serve os interesses da classe médica angolana.

DW África: O conselho fiscal regional norte da Ordem dos Médicos de Angola pede uma auditoria externa às contas da instituição por alegados desvios de fundos e gestão danosa por parte da bastonária Elisa Gaspar. Contudo, a médica negou as acusações. O que sabe sobre esta questão?

AM: Estas são informações que nos foram passadas por funcionários da Ordem dos Médicos e, na assembleia convocada para o dia 17 de outubro, iremos verificar se isto é um facto ou não. As informações que nos chegam é que existirá uma gestão danosa do dinheiro da Ordem dos Médicos e certamente que a bastonária irá justificar tudo isso na assembleia. A ser verdade - e tudo indica que sim, pelas provas que nos estão a ser apresentadas - este será de certeza absoluta um caso de tribunal; tudo indica que haverá uma destituição tendo em conta a má prestação da bastonária durante o seu mandato.

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