Depois de ter sido detido durante 22 dias, em 2015, "Magno" cumpre medidas de coação de um processo que entretanto desapareceu. Ativistas falam em abuso de confiança da Procuradora-Geral da República.
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Mais de duas dezenas de ativistas angolanos lançaram, esta segunda-feira (12.12), um manifesto de solidariedade para com Antonio Diogo de Santana Domingos, conhecido por Domingos Magno. O ativista foi detido em outubro de 2015, quando tentava entrar na Assembleia Nacional para assistir ao discurso de abertura do ano parlamentar, proferido pelo vice-presidente da República, Manuel Domingos Vicente, em representação do chefe de Estado angolano, José Eduardo dos Santos.
Sem culpa formada, o ativista ficou detido na cadeia de Viana, na província de Luanda, por 22 dias, tendo sido libertado, em novembro, sob termo de identidade e residência. Domingos Magno apresenta-se à Procuradoria-Geral da República de 15 em 15 dias e está proibido de deixar o país.
Em declarações à DW África, o ativista denuncia o desaparecimento do seu processo na Procuradoria-Geral da República, 13 meses depois da aplicação da medida de coação. "Eu próprio fiz deligências no sentido de localizar o processo, fui aos serviços de investigação criminal, contactei o instrutor do processo", mas "o processo não existe como tal", afirma Domingos Magno.
"Nos livros de entrada existem outros processos. O meu é o número 84/64. O processo 83 está registado, o 85 também. Mas o processo 84 não existe. Ninguém sabe dele”, estranha o ativista angolano. "É grave o processo não aparecer", avalia Domingos Magno.
"Abuso de autoridade" da Procuradoria
Segundo a lei das medidas cautelares em processo penal (lei n.º 25/15), o termo de identidade e residência caduca passados quatro meses sem acusação. No entanto, no caso de Domingos Magno já passaram 13 meses.
13.12.2016 Ativistas- Angola - MP3-Mono
Na declaração pública, assinada por mais de vinte ativistas, entre eles Luaty Beirão, Domingos da Cruz, Sisaltina Kutaia e José Gama, denuncia-se o que consideram “abuso de autoridade por parte da Procuradoria-Geral da República”.
É necessário que “esta situação, esta medida cautelar que se traduz em ele [Domingos Magno] estar restringido, não poder viajar, não poder trabalhar, chegue efetivamente ao fim, porque configura um abuso de autoridade por parte da Procuradoria-Geral da República”, afirma Nuno Dala, um dos subscritores do documento.
Este ativista angolano adiantou ainda que caso Magno não seja libertado, o grupo vai recorrer a um "ativismo muito mais contundente", sem entrar em mais detalhes. O objetivo é que "a Procuradoria ponha fim a essa medida cautelar que configura abuso de confiança", conclui o ativista angolano Nuno Dala.
A DW África tentou ouvir a Procuradoria-Geral da República sobre o caso, mas sem sucesso.
Julgamento dos 15+2 em imagens
Foi um julgamento envolto em polémica. 17 ativistas angolanos foram condenados a entre 2 e 8 anos de prisão por atos preparatórios de rebelião. Os críticos falam em "farsa judicial". Veja aqui momentos-chave do processo.
Foto: picture-alliance/dpa/W. Kumm
Julgamento polémico
Os 15+2 ativistas angolanos, acusados de atos preparatórios de rebelião, foram condenados a entre 2 e 8 anos de prisão efetiva. A defesa e ativistas de direitos humanos denunciam que o processo foi marcado por várias irregularidades. O julgamento começou logo com protestos, a 16 de novembro. Um ativista escreveu na farda prisional "Recluso do Zédu". Observadores internacionais ficaram à porta.
Foto: DW/P.B. Ndomba
#LiberdadeJa
Antes e durante o julgamento, foram muitos os pedidos de "liberdade já!" para os ativistas angolanos. Essas foram também as palavras de ordem de uma campanha nas redes sociais pela libertação dos jovens a que se associaram músicos, escritores, ativistas e muitos outros cidadãos de dentro e fora de Angola.
Foto: Reuters/H. Corarado
"Justiça sem pressão"
Fora do tribunal, um grupo de manifestantes jurou acompanhar o julgamento dos 15+2 até ao fim. Vestiram-se a rigor com t-shirts brancas de apoio ao sistema judicial angolano, com os dizeres "Justiça sem Pressão" - "Estamos aqui a favor da Justiça, visto que Angola é um Estado soberano e que os tribunais têm o seu papel, com o qual nós estamos solidários", disse um dos manifestantes.
Foto: DW/P. Borralho
Irregularidades no processo
Em dezembro, os ativistas enviaram uma carta ao Presidente angolano onde apontavam irregularidades no processo. Os jovens queixavam-se, por exemplo, das demoras, da falta de acesso ao processo por parte da defesa antes do início do julgamento e da impossibilidade de manter contato visual com a procuradora Isabel Nicolau (na foto). Eram ainda denunciados casos de agressão física e psicológica.
Foto: Ampe Rogério/Rede Angola
Dois dias a ler o livro de Domingo da Cruz
"Ferramentas para Destruir o Ditador e Evitar Nova Ditadura". É este o título do livro escrito pelo ativista Domingos da Cruz, inspirado no livro "Da Ditadura à Democracia", do pacifista norte-americano Gene Sharp. Segundo a acusação, era este o manual dos ativistas para preparar uma rebelião. O livro foi lido na íntegra durante dois dias no Tribunal de Luanda.
Foto: DW/Nelson Sul D´Angola
"Governo de Salvação Nacional" é "embuste"
Dezenas de personalidades angolanas integram uma lista, divulgada online, de um "Governo de Salvação Nacional". Esse seria um Executivo que assumiria o poder em Angola após a rebelião pensada pelos ativistas, segundo a acusação. Vários declarantes faltaram à chamada e várias sessões tiveram de ser adiadas. Um dos declarantes, Carlos Rosado de Carvalho, disse que o suposto Governo era um "embuste".
Foto: DW/P. Borralho
Prisão domiciliária
A 18 de dezembro, 15 ativistas, detidos desde junho, passaram ao regime de prisão domiciliária. Laurinda Gouveia e Rosa Conde permaneceram em liberdade condicional. O tribunal autorizou os detidos a receber visitas de familiares e amigos. No entanto, não foi permitido qualquer contato com membros do "Movimento Revolucionário" e do "Governo de Salvação Nacional".
Foto: DW/P. Borralho Ndomba
"Este julgamento é uma palhaçada"
Numa das sessões do julgamento, os ativistas levaram vestidas t-shirts com autocaricaturas como palhaços. Nito Alves disse em tribunal que o julgamento era uma palhaçada. Foi julgado sumariamente por injúria e condenado a 6 meses de prisão efetiva. Ativistas alertam que o estado de saúde de Nito Alves é grave e que Nito foi transportado numa maca para o tribunal de Luanda para ouvir a sentença.
Foto: Central Angola 7311
Nuno Dala em greve de fome
Como forma de reinvindicar o acesso a contas bancárias e entrega de pertences, Nuno Dala entrou em greve de fome a 10 de março. Gertrudes Dala, irmã do ativista, lamentou a reação da sociedade civil e a defesa alertou para a situação financeiramente "delicada" da família. Outros ativistas também passaram por dificuldades durante a prisão domiciliária.
Foto: DW/P.B. Ndomba
Ativistas são condenados
O tribunal de Luanda condenou, a 28 de março, os 17 ativistas angolanos. Domingos da Cruz, tido como "líder", deverá cumprir 8 anos e 6 meses de prisão efetiva. Luaty Beirão foi condenado a 5 anos e 6 meses. Rosa Conde e Benedito Jeremias foram condenados a 2 anos e 3 meses de prisão. Os restantes foram condenados a 4 anos e 6 meses. A defesa e o Ministério Público vão recorrer da decisão.
Foto: picture-alliance/dpa/P. Juliao
"Dia triste para a liberdade de expressão"
"Este é um dia muito triste para a liberdade de expressão e de associação", disse Ana Monteiro, da Amnistia Internacional, reagindo às sentenças. "Não deveria ter existido sequer um julgamento. Estamos a falar de cidadãos angolanos que estavam reunidos a falar sobre liberdade e democracia". Zenaida Machado, investigadora da HRW, considerou a condenação ridícula.