Três jovens foram condenados a penas de prisão por desacatos em protestos no Dia da Paz, a 4 de abril. Ativistas de Luanda exigem a sua libertação e planeiam vigílias, marchas e manifestações.
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"Levem o vosso gatuno" - gritaram dezenas de jovens nas ruas de Malanje, durante as comemorações do Dia da Paz e Reconciliação Nacional, a 4 de abril. Os manifestantes exigiam a destituição do governador local, Norberto dos Santos "Kwata Kanawa".
Esta semana, um grupo de ativistas lançou, em Luanda, uma "Campanha Nacional de Apoio aos Manifestantes de Malanje", exigindo a libertação.
"O crime alegado pelas autoridades é, por si só, ridículo, e até agora não foram apresentadas provas neste sentido", diz Nuno Álvaro Dala, um dos promotores da iniciativa.
O processo, acrescenta, não passa "de um esforço de, mais uma vez, o sistema de justiça judicializar o político e, como muitas vezes também acontece, politizar o jurídico, sempre no esforço de reprimir e instigar medo junto dos cidadãos".
Os ativistas vão exigir a reposição da liberdade dos jovens com mecanismos "contundentes", sublinha. Estão previstas vigílias, marchas e manifestações: "Não estou referir-me a Luanda, aliás, o centro indicado para o efeito será Malanje e Luanda vai funcionar como um segundo espaço para realizar esses protestos todos para que essa loucura chegue ao fim e os jovens voltem à liberdade", explica Nuno Álvaro Dala.
Para Nuno Álvaro Dala, os pronunciamentos do governante soaram como uma "ordem superior" e contribuíram para a condenação dos jovens.
"Houve da parte do vice-Presidente da República uma certa responsabilidade no sentido de que os jovens acabassem nesta situação", considera. "Depois de dar a entrevista, na qual reduziu os jovens a kupapatas ou moto-taxistas frustrados, fartos de uma série de situações com as quais não concordavam, nomeadamente terem autorização de circular pela cidade, estava na verdade a transmitir uma espécie de ordem superior".
CASA-CE: Malanje está ao abandono
Malanje fica a cerca de 476 quilómetros da capital angolana, Luanda. A província é rica em diamantes, calcário, urânio e fosfatos.
No entanto, segundo Carlos Xavier, secretário executivo local da CASA-CE, o segundo maior partido da oposição, a região está voltada ao abandono, "é uma terra praticamente esquecida".
Angola: Campanha para libertar ativistas de Malanje
"Não se verifica absolutamente nada no que ao desenvolvimento diz respeito. As infraestruturas são aquelas que o colono português deixou, não existem estradas secundárias e terciárias não têm asfalto, e aquelas que têm asfalto, que o colono deixou, o asfalto está esburacado. Em Malanje só restou o nome e a população que é trabalhadora", lamenta.
Por isso, o representante da Convergência Ampla de Salvação de Angola - Coligação Eleitoral entende que o nível do descontentamento dos jovens tem razão de ser: "As reclamações dos jovens são completamente legítimas, na medida em que foram representar a maior parte da população - que se revê nos jovens contestatários. Os tribunais e a polícia, aqui, estão ao lado da má governação, são eles que promovem a má governação."
"Este julgamento é uma palhaçada"
Presos desde junho de 2015, os 15 ativistas aguardam o desfecho do julgamento desde setembro. Recentemente, Nito Alves classificou o julgamento como uma "palhaçada", o que lhe valeu uma condenação a seis meses de prisão.
Foto: picture-alliance/dpa/P. Juliao
"Este julgamento é uma palhaçada"
Depois de quase seis meses de julgamento, Manuel Nito Alves, um dos 15 ativistas detidos desde junho, afirmou que todo o processo era uma "palhaçada". A afirmação valeu-lhe uma condenação a seis meses de prisão. A Central Angola 7311 resolveu criar várias imagens, onde os ativistas surgem com maquilhagem de palhaço, para desmascarar o "circo" em que estão envolvidos.
Foto: Central Angola 7311
Reclusos do Zédu
No início do julgamento, a 16 de novembro do ano passado, os ativistas chegaram a tribunal com t-shirts onde tinham escritas frases de protesto. Luaty Beirão, um dos revus, afirmou na altura que "Vai acontecer o que o José Eduardo decidir. Tudo aqui é um teatro".
Foto: DW/P.B. Ndomba
#LiberdadeJa
Ao longo dos vários meses de processo, foram vários os protestos que aconteceram nas ruas de Luanda e de outras cidades. A Amnistia Internacional pede a liberdade dos prisioneiros de consciência, que se mostram bastante desgastados psicologicamente.
Foto: Reuters/H. Corarado
Prisão domiciliária desde dezembro
Em dezembro, o Tribunal Constitucional de Angola decretou o fim da prisão preventiva dos 15 ativistas. No acórdão era possível ler-se que "cabe ao juiz da causa determinar a medida de coação a aplicar nos termos da lei". A Procuradoria Geral da República propôs a alteração da medida de coação para prisão domiciliária.
Foto: picture-alliance/dpa/P. Juliao
Prisão domiciliária sem fundamento
Em fevereiro, o Tribunal de Luanda decretou que os ativistas deveriam continuar em prisão domiciliária. Praticamente um mês depois, os revus continuam à espera das alegações finais. "Nós sabemos que não podemos esperar nada de bom disto, apenas uma condenação", disse António Kissanda, da Central Angola 7311, à DW.
Foto: Reuters/H. Corarado
"Os 15+2 estão a ser julgados por falar a verdade"
"Falar sobre as boas condições que José Eduardo dos Santos criou não é crime, mas dizer que não há luz, água potável, educação já é", diz António Kissanda. O 15+2 (Laurinda Gouveia, na foto, e Rosa Conde foram constituídas arguidas, mas aguardam julgamento em liberdade) estão a ser julgados porque "falaram a verdade".
Foto: Central Angola 7311
Ativistas usam greve de fome como forma de protesto
Em setembro, Domingos da Cruz, Inocêncio de Brito, Luaty Beirão (na imagem) e Sedrick de Carvalho declararam uma greve de fome contra a prisão preventiva, ilegal nessa altura, ao abrigo da Constituição angolana. Luaty Beirão manteve-se em greve de fome até ao final de outubro. Agora, é Nuno Dala quem usa a greve de fome como forma de protesto: tomou a decisão há seis dias (9.03).
Foto: Central Angola 7311
Julgamento sem fim à vista
Ontem (14.03), realizou-se mais uma sessão do julgamento dos 15+2. David Mendes (à esquerda na imagem), um dos advogados de defesa do grupo, recusa depor como declarante no processo. A sessão de ontem, prevista para as declarações finais, foi adiada para 21 de março, depois de o advogado ter sido impedido de exercer as suas funções como advogado de defesa.
Foto: DW/Nelson Sul d'Angola
"Isto é uma farsa que os levou à cadeia e os mantém na cadeia"
Para António Kissanda, da Central Angola 7311, este julgamento é uma farsa e lembra todos os outros ativistas que, ao longo dos 36 anos em que José Eduardo dos Santos está no poder, foram perseguidos e mortos. "Nós já estamos mortos, para dizer a verdade, só falta estarmos no caixão como prova disso", afirma. "Tal como em qualquer ditadura, é importante que não se criem mentalidades no povo".