Assembleia Nacional de Angola debate a possibilidade de repatriar dinheiro obtido de forma lícita ou ilícita. Mas CASA-CE pede "ampla discussão" para que, no fim do dia, não se premeiem supostos "criminosos".
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O Parlamento angolano discute esta quinta-feira (22.02) duas propostas de lei sobre o repatriamento de capitais no exterior: uma proposta do Executivo e outra do maior partido da oposição, a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA).
O objetivo é dar oportunidade aos angolanos que têm dinheiro no estrangeiro para o investir em Angola - sem que se façam perguntas. Mas as propostas têm sido criticadas, tanto pela sociedade civil, como pela Convergência Ampla de Salvação de Angola - Coligação Eleitoral (CASA-CE). Leonel José Gomes, secretário-geral e deputado do partido, refere em entrevista à DW que não se podem meter todos os casos de repatriamento de capitais no mesmo saco - é preciso distinguir o dinheiro lícito do ilícito e premiar as boas práticas.
CASA-CE critica propostas de repatriamento de capitais
DW África: A CASA-CE está a favor ou contra as propostas que vão a discussão?
Leonel José Gomes (LJG): A ideia [das propostas] é nobre, uma vez que visa reforçar o capital público para os investimentos internos. No entanto, a própria lei precisa de ter um tratamento mais circunstanciado, melhor elaborado, e deve, do nosso ponto de vista, ter a participação dos cidadãos angolanos. Se a lei tem a nobreza de querer repatriar os capitais que saíram ilicitamente deste país, a mesma proposta de lei apresenta uma estrutura que premeia o suposto criminoso.
DW África: Ou seja, a CASA-CE vai um pouco ao encontro do coro de críticas, com o ativista Luaty Beirão na fila de frente, que rejeita o repatriamento de capitais sem que se façam perguntas.
LJG: Para mim, a questão fundamental não é fazer as perguntas. O país precisa, de uma vez por todas, de se moralizar. E a moralização passa necessariamente por saber quem prejudicou o Estado angolano e, consequentemente, o povo. As duas consequências fundamentais, que visam moralizar a sociedade, são, em primeiro lugar, saber quem foi que prejudicou o Estado angolano e, concomitantemente, os angolanos. Em segundo lugar, o repatriamento não pode favorecer quem praticou a ilicitude.
Por outro lado, a mesma lei tem um contraste complicado. Eu, cidadão de Angola, Leonel José Gomes, se souber de alguém que eventualmente teve essa prática [ilícita] e pronunciar o nome dessa pessoa sou sancionado, mas o indivíduo que praticou a ilicitude deve merecer o sigilo. Há aqui um contra-senso. Um outro aspeto é que […] a ilicitude não se pode circunscrever aos ativos financeiros fora do país; [deveria ser incluído] todo o património que foi construído por via da ilicitude.
DW África: Porque é que a CASA-CE não apresentou também uma proposta, como fez o Governo e a UNITA?
LJG: Não. A CASA-CE apresentou um conjunto de propostas ao presidente da Assembleia Nacional e, porque acha que não vale a pena discutirmos várias leis ao mesmo tempo, entende que se deve discutir profundamente os dois documentos, amalgamá-los naquilo que são as coisas positivas para formar um único documento e, depois, enriquecer com outras ideias e com a participação mais ampla dos cidadãos.
DW África: Com que percentagem do dinheiro repatriado é que o Estado deveria ficar?
LJG: Isto não se pode aferir de livre arbítrio. É preciso uma ampla discussão, amplos consensos, para termos uma posição de conjunto. Não vale a pena extremar posições, porque aquele que aceder ao período de graça para a entrega voluntária, naturalmente que merece algum reconhecimento e perdão. E isso tem de ser bitolado de uma maneira diferente daquele que, passados 180 dias, não fizer o repatriamento e irá para a esfera da investigação criminal. A posição da CASA-CE é de que é preciso criar incentivos fiscais para esse setor de capitais repatriados, que derivam da atividade normal, da licitude, de empresários que conseguiram desenvolver a sua atividade por via da legislação vigente na República de Angola em matéria de empreendedorismo e finanças públicas.
Mesmo sem a Sonangol, Isabel dos Santos ainda tem um império empresarial
A mulher mais rica de África, filha do ex-Presidente José Eduardo dos Santos, foi exonerada da liderança da petrolífera estatal angolana. Mas continua a ter uma grande influência económica em Angola e Portugal.
Foto: DW/P. Borralho
Bilionária angolana diz adeus à Sonangol
A 15 de novembro, Isabel dos Santos teve de renunciar à presidência do conselho de administração da Sonangol. Em meados de 2016, o seu pai, o então Presidente José Eduardo dos Santos, nomeou-a para liderar a companhia petrolífera estatal. A nomeação era ilegal aos olhos da lei angolana. O novo Presidente angolano, João Lourenço, estava, por isso, sob pressão para demitir Isabel dos Santos.
Foto: picture-alliance/dpa
Carreira brilhante à sombra do pai
Isabel dos Santos, filha de José Eduardo dos Santos e da sua primeira mulher, a jogadora de xadrez russa Tatiana Kunakova, nasceu em 1973, em Baku. Durante o regime do seu pai, no poder entre 1979 e 2017, Isabel dos Santos conseguiu construir um império empresarial. Em meados de 2016, a liderança da Sonangol, a maior empresa de Angola, entrou para o seu currículo.
Foto: picture-alliance/dpa
Conversão aos princípios "dos Santos"
Isabel dos Santos converteu o grupo Sonangol, sediado em Luanda (foto), às suas ideias. Nomeou cidadãos portugueses da sua confiança para importantes cargos de gestão e foi muito criticada pela ausência de angolanos em posições-chave na empresa.
Foto: DW/N. Sul d'Angola
Presença firme nas telecomunicações
Mesmo após o fim da sua carreira na Sonangol, Isabel dos Santos continua forte no meio empresarial: possui 25% da UNITEL desde o seu lançamento, em 2001, a empresa tornou-se a principal fornecedora de serviços móveis e de internet em Angola. Através da UNITEL, dos Santos conseguiu estabelecer vários contactos comerciais e parcerias com outras empresas internacionais, como a Portugal Telecom.
Foto: DW/P. Borralho
Redes móveis em Portugal e Cabo Verde
Isabel dos Santos detém a participação maioritária na ZON, a terceira maior empresa de telecomunicações de Portugal, através de uma sociedade com o grupo português Sonae. Também em Cabo Verde, dos Santos - com uma fortuna estimada em 3,1 mil milhões de dólares, segundo a revista Forbes - está presente nas telecomunicações com a subsidiária UNITEL T+.
Foto: DW/J. Carlos
Expansão com a televisão por satélite
Lançada em 2010 por Isabel dos Santos, a ZAP Angola apresenta-se como o maior fornecedor de televisão por satélite no país. Desde 2011, a ZAP está presente também em Moçambique, onde conquistou uma parcela importante do setor. Em Moçambique, a empresa compete com o antigo líder de mercado, a Multichoice (DSTV), da África do Sul.
Foto: DW/P. Borralho
Bancos: o segundo pilar do império
Atrás das telecomunicações, o setor financeiro é o segundo pilar do império empresarial de Isabel dos Santos. A empresária detém o banco BIC juntamente com o grupo português Américo Amorim - o empresário português conhecido como "o rei da cortiça" que morreu em julho de 2017. É um dos maiores bancos de Angola, com cerca de 200 agências. É também o único banco angolano com agências em Portugal.
Foto: DW/P. Borralho
Com a GALP no negócio do petróleo
Também no petróleo, dos Santos fez parceria com Américo Amorim. Através da empresa Esperanza Holding B.V., sedeada em Amesterdão, a empresária angolana está envolvida na Amorim Energia que, por sua vez, é a maior acionista da petrolífera portuguesa GALP. A GALP também administra os postos de gasolina em Moçambique (na foto) e em Angola onde, curiosamente, compete com a Sonangol.
Foto: DW/B.Jequete
Supermercado em Luanda
Em 2016, abriu em Luanda o Avennida Shopping, um dos maiores centros comerciais da capital angolana. Várias empresas do império dos Santos operam neste centro comercial, como o Banco BIC, a ZAP e a UNITEL. Assim, a empresária beneficia em várias frentes do crescente mercado de bens de consumo em Luanda.
Foto: DW/P. Borralho
350 milhões de dólares em supermercados
Uma das maiores lojas do Avennida Shopping é o hipermercado Candando. É operado pelo grupo Contidis, controlado por Isabel dos Santos. Nos próximos anos, deverão ser construídos em Angola vários Candando. No total, a Contidis quer investir mais de 350 milhões de dólares nas filiais.