Iniciou esta sexta-feira (31.5), no Supremo Tribunal de Angola, o julgamento do ex-ministro dos Transportes, Augusto da Silva Tomás. Controvérsia sobre proibição de tirar fotografias a arguidos marca o primeiro dia.
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Começou no Supremo Tribunal de Angola, esta sexta-feira (31.05), o julgamento do ex-ministro dos Transportes, Augusto da Silva Tomás. O antigo ministro está detido desde setembro e é acusado de seis crimes, incluindo peculato, abuso de poder e branqueamento de capitais.
O primeiro dia de julgamento ficou marcado pela decisão do juiz da causa de impedir os jornalistas de tirar fotografias e captar imagens dos acusados, dentro e fora da sala de audiências. O início do julgamento foi reservado à leitura do despacho de acusação do Ministério Público.
Acusação
O ex-ministro Augusto Tomás é acusado de ter usado dinheiro do Conselho Nacional de Carregadores (CNC) para pagar despesas do Ministério dos Transportes e a entidades estranhas ao Ministério, como é o caso do Movimento Nacional Espontâneo, uma organização filantrópica ligada ao partido no poder. Entre 2014 e 2017, por exemplo, o CNC terá despendido em subsídios funcionais com o Ministério dos Transportes 23,2 milhões de kwanzas (65 mil euros), assim como um no valor de 1,5 milhões de dólares (1,43 milhões de euros).
Para o Ministério Público, o ex-ministro e quatro ex-gestores do CNC "gastavam os dinheiros públicos como bem entendiam, sem obedecer a qualquer regra ou princípio e aos limites das despesas das unidades orçamentais".
Augusto Tomás foi também ministro das Finanças e da Economia e governador provincial de Cabinda, enquanto o Presidente José Eduardo dos Santos esteve no poder.
No final da sessão, os advogados de defesa dos arguidos recusaram fazer declarações à imprensa. O Supremo Tribunal também não prestou informações, ao contrário do que acontece em outros casos.
Proibição
O início do julgamento também ficou marcado pela decisão do juiz do processo, Joel Leonardo, de proibir os órgãos de comunicação social de captar imagens do antigo governante e dos demais réus, dentro e fora da sala de audiências - uma situação que desagradou à jornalista Luísa Rogério, da Federação Africana de Jornalistas.
"Para mim, esta decisão do Tribunal é lamentável. Sabemos que os arguidos são protegidos e têm o direito à presunção de inocência, mas isto não significa que, à partida, o juiz proíba o nosso trabalho. Em muitos outros casos, aqui em Angola, as pessoas são filmadas regularmente e [o assunto] é tratado como deve ser", refere.
Segundo Luísa Rogério, os jornalistas "respeitam a presunção de inocência", portanto, "este tipo de comportamento lesa gravemente a liberdade de imprensa e o direito à informação, direitos plasmados na Constituição da República de Angola", argumentou.
Para o advogado Jaime Azulay, que é também jornalista do Jornal de Angola, apesar de a lei conferir prorrogativas aos juízes, legalmente, os jornalistas só podem ser impedidos de captar imagens em casos muito específicos. "Por regra, as audiências de julgamento são públicas, salvo nos casos em que a própria lei não permite, como nos casos dos crimes contra a honra, a difamação e injúria", explica.
Azulay recorda que a Constituição angolana consagra o direito à informação e à liberdade de imprensa, e limitações a essas liberdades devem ser muito bem fundamentadas. "Os jornalistas têm o direito ao acesso às fontes de informação e aos locais onde esta informação se produz. Há sempre restrições, mas estas restrições não podem ser impostas de forma abusiva, sem existir causas que justifiquem", explicou.
Neste processo, além do ex-ministro dos Transportes, estão igualmente arrolados dois ex-diretores-gerais adjuntos para as Finanças e para a Área Técnica do Conselho Nacional de Carregadores. São igualmente arguidos Manuel António Paulo, antigo diretor-geral do CNC, e Eurico Alexandre Pereira da Silva, ex-diretor adjunto para a Administração e Finanças.
Países africanos que mais violam a liberdade de imprensa
Gana é o país africano mais bem classificado no "<i>Ranking</i> Mundial da Liberdade de Imprensa" dos Repórteres sem Fronteiras. A Eritreia é o pior em África e, a nível mundial, só é melhor que a Coreia do Norte.
Foto: Esdras Ndikumana/AFP/Getty Images
Eritreia - posição 179º lugar
A liberdade de imprensa é considerada "não existente". Em 2001, uma série de medidas repressivas contra <i>media</i> independentes levaram a uma onda de detenções. O Presidente Isaias Afeworki é visto como um “predador” da liberdade de imprensa e usa os meios de comunicação nacionais como seus porta-vozes. Escritores, locutores e artistas são censurados e a informação é escondida dos cidadãos.
Foto: picture-alliance
Sudão - 174º lugar
Na capital Cartum, pratica-se a chamada “censura pré-publicação". O Governo detém jornalistas arbitrariamente e interfere abertamente na produção de notícias. A "Lei da Liberdade de Informação de 2015" é vista como uma outra forma de exercer controlo governamental sobre a informação pública. Os jornalistas têm de passar por um teste e obter uma permissão para trabalhar.
Foto: Getty Images/AFP/A. Shazly
Burundi - 159º lugar
Repressão estatal contra a liberdade de imprensa e intimidação de jornalistas é comum no país. <i>Media </i> controlados pelo Estado substituem cada vez mais estações de rádio independentes, depois de a maior parte delas ter sido forçada a fechar, após uma tentativa de golpe de estado há três anos. Centenas de jornalistas fugiram do país desde 2015. Na foto, protesto de jornalistas no país.
Foto: Esdras Ndikumana/AFP/Getty Images
República Democrática do Congo - 154º lugar
Defensores dos <i>media</i> falam em jornalistas mortos, agredidos, detidos e ameaçados desde que Joseph Kabila sucedeu ao pai na presidência do país em 2001. Orgãos de comunicação internacionais queixam-se que o Governo interfere nos sinais de rádio ou corta mesmo a transmissão. Protestos da oposição levaram as autoridades a interromper ou cortar o acesso à Internet.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Kappeler
Suazilândia - 152º lugar
Esta monarquia absoluta tem a reputação de obstruir o acesso à informação e impedir os jornalistas de fazerem o seu trabalho. Os <i>media</i> estão sujeitos a leis restritivas e repórteres são frequentemente chamados a tribunal pelo seu trabalho. Auto-censura é comum. Um editor saiu recentemente do país depois de fazer uma reportagem sobre negócios obscuros ligados ao Rei Mswati III (na foto).
Foto: picture-alliance/dpa
Etiópia - 150º lugar
O Governo tem uma mordaça sobre os órgãos de comunicação e os jornalistas trabalham sobre condições muito restritivas. Com a Eritreia, este país tem uma das mais altas taxas de jornalistas detidos na África subsariana. Na foto, o jornalista etíope Getachew Shiferaw, que foi condenado a 18 meses de prisão por ter falado com um dissidente.
Foto: Blue Party Ethiopia
Sudão do Sul - 144º lugar
Os jornalistas são obrigados pelo Governo a evitar fazer cobertura do conflito. Órgãos de comunicação internacionais denuciaram casos de assédio e foram banidos deste jovem país, onde pelo menos 10 jornalistas foram mortos desde 2011. Na foto, dois jornalistas do Uganda que tinham sido detidos por autoridades no Sudão do Sul.
Foto: Getty Images/AFP/W. Wudu
Camarões - 129º lugar
O Governo chamou às redes sociais uma “nova forma de terrorismo”, e bloqueia frequentemente o acesso às mesmas. Emissões de rádio e televisão foram bloqueadas duas semanas em março, durante o período eleitoral. Jornais que publicam conteúdos que desagradam políticos no poder são banidos e jornalistas e editores são detidos.
Foto: picture alliance/abaca/E. Blondet
Chade - 123º lugar
Os jornalistas arriscam-se a detenções arbitrárias, agressões e intimidações. Nos últimos meses, o Governo tem vindo a reprimir plataformas de <i>social media</i> e ciber-ativistas. A Internet tem estado bloqueada no país desde 28 de março, no seguimento de um “apagão” da Internet devido a manifestações da sociedade civil e protestos dos órgãos de comunicação num chamado “dia sem imprensa”.
Foto: UImago/Xinhua/C. Yichen
Tanzânia - 93º lugar
Críticos dizem que o Presidente John Magufuli tem vindo a atacar a liberdade de expressão deliberadamente, desde que tomou posse em 2015. Jornalistas foram presos ou dados como desaparecidos. Orgãos de comunicação social foram fechados ou impedidos de publicar durante longos períodos de tempo. Leis que podem ser usadas contra os <i>media</i> foram apertadas.