Família de um ex-administrador da Sonangol luta para reaver 23 milhões de dólares que deixou na conta do seu ex-estafeta. Mas este recusa-se a devolver o dinheiro. Suspeita-se que seja dinheiro ilícito.
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Mateus Morais de Brito, ex-administrador da Sonangol, a petrolífera estatal angolana, teria vários negócios, na sua maioria em nome de terceiros. Um dos "testas-de-ferro" era o seu estafeta Mauro Carvalho, que terá ficado com cerca de 23 milhões de dólares na sua conta, colocados por Morais de Brito antes da sua morte.
Marco Silva, especialista em transações financeiras, considera que tal aconteceu porque o sistema angolano "é bastante opaco".
E o especialista lembra que "uma das questões que Angola sempre teve na última década, pelo menos, foi a falta de transparência, nomeadamente os intervenientes que estão em empresas públicas ou que tinham acesso ao Presidente. Mesmo que ele tivesse ou não conhecimento direto das questões o que é certo é que os problemas ocorriam."
De onde vem o dinheiro?
E quanto ao caso do ex-administrador Silva justifica: "E não foi esse o único caso dos 23 milhões. Obviamente que um estafeta não tem 23 milhões [de dólares], a menos que lhe tenha saído o euromilhões e, portanto, não há qualquer tipo de justificação plausível para que ele os tenha a não ser, exatamente, o facto de ser um "testa-de-ferro" de dinheiro de outra pessoa que só o colocou nele eventualmente porque não o poderia ter em seu nome ou na sua posse."
O analista de mercados interroga sobre a origem dos fundos que Brito usava para os seus negócios, apesar das restrições impostas pelo sistema bancário angolano:"Como é que estes 23 milhões existem e que sejam de uma pessoa como é que ele os ganhou? Isso é que é importante verificar. Será que ele teve rendimentos para isso? Essa é que é a primeira questão, não é a do estafeta."
Segundo o site Club-K.net, que divulgou a notícia, em 2014, Morais de Brito foi encontrado morto no seu apartamento em Lisboa, em circunstâncias estranhas. A polícia judiciária portuguesa investigou e não encontrou indícios de atentado ou crime.
Esforços da família para reaver o dinheiro
No entanto, os familiares do antigo administrador da Sonangol tudo fazem junto dos antigos parceiros para chegarem a um entendimento amigável, visando reaver os fundos.
O ex-estafeta, um dos "testas-de-ferro" de Brito, recusa-se a devolver o dinheiro à família, apesar das tentativas de acordo.
A DW África tentou ouvir fontes policiais e elementos da família em Lisboa, mas sem sucesso. A questão que se coloca é se os familiares têm legitimidade para reivindicar o dinheiro em causa, assim como outros valores aplicados em negócios com os demais parceiros de Morais de Brito.
Já o analista de mercados é de opinião que "podem tentar reclamar, mas depois vão ter que justificar como é que ele os tinha também. Não é só dizer "esse dinheiro é meu", depois as autoridades têm que perguntar "então ele ganhou-o aonde?" Depois, se calhar, vai-se chegar ao ponto em que [se conclui que] ele ganhou-o de forma ilícita."
Dificuldades
Marco Silva antevê dificuldades para os familiares de Morais de Brito: "Portanto, nem sequer têm direito a ele na mesma. Agora, em termos legais e burocráticos, será muito difícil o estafeta ser obrigado a devolver o dinheiro sem que a família comprove realmente que esse dinheiro era dele e que foi adquirido de forma lícita."
O ex-administrador da Sonangol teria também negócios com Manuel Vicente, ex-presidente da petrolífera angolana e ex-vice presidente de Angola, a braços com a justiça portuguesa num processo crime de corrupção e branqueamento de capital.
Sancionar os corruptos
Após a votação pública dos 15 casos "mais simbólicos de grande corrupção", a ONG Transparência Internacional selecionou e anunciou esta quarta-feira (10.02) os 9 casos que passaram para a "Fase de Sanção Social".
Foto: picture alliance / AP Photo
Isabel dos Santos
Depois da votação pública dos 15 casos "mais simbólicos de grande corrupção" da Transparência Internacional, 9 casos foram destacados pela organização. A filha mais velha do Presidente angolano não faz parte, apesar dos 1418 votos. Segundo a TI, a seleção dos 9 foi baseada não só nos votos, mas também no impacto nos direitos humanos e na necessidade de destacar o lado menos visível da corrupção.
Foto: Nélio dos Santos
Teodoro Nguema Obiang
Conhecido pelo seu estilo de vida luxuoso, o filho do Presidente da Guiné Equatorial é, desde 2012, o segundo Vice-Presidente da República. A Guiné Equatorial é o país mais rico de África, per capita, apesar do Banco Mundial alegar que mais de 75% da população vive na pobreza. Teodoro somou apenas 82 votos e - como Isabel dos Santos - não foi nomeado para a fase de sanção social.
Foto: DW/R. Graça
Banco Espírito Santo
As suspeitas de corrupção do BES (Banco Espírito Santo) começaram quando o grupo financeiro português entrou em bancarrota em 2014. Foram descobertas fortes evidências de corrupção, fraude e lavagem de dinheiro. Ricardo Salgado, ex-presidente do BES, já esteve preso e foi recentemente libertado sob fiança. O BES somou 193 votos e também não passou aos 9 maiores casos de grande corrupção do mundo.
Foto: DW/J. Carlos
Mohamed Hosni Mubarak
Presidente do Egito entre 1981 e 2011, Mohamed Hosni Mubarak somou 207 votos e encontra-se agora preso. Mesmo assim, não aparece na lista dos casos de grande corrupção que a Transparência Internacional quer sancionar socialmente. Também o comércio de jade do Myanmar e a China Communication Construction Company ficaram de fora com 47 e 43 votos, respetivamente.
Foto: picture-alliance/AP
Transparência Internacional
"Unmask the Corrupt" é um projeto da Transparência Internacional que após receber 383 submissões, nomeou os 15 casos mais simbólicos de corrupção. Após receberem mais de 170 mil votos, reduziram os 15 para 9 casos. A Transparency International quer promover uma campanha mundial para aplicar sanções sociais e políticas nestes exemplos de corrupção. A DW África mostra-lhe os 9 casos nomeados.
Estado americano de Delaware
O Estado norte-americano de Delaware está entre os 9 casos mais simbólicos de corrupção. O jornal The New York Times chegou mesmo a apelidar o Estado como "paraíso fiscal corporativo" pela possibilidades que oferece às empresas. Somou 107 votos. "Está na hora da justiça e das pessoas mostrarem o poder das multidões", afirmou em comunicado de imprensa José Ugaz da Transparência Internacional.
Foto: Getty Images/M. Makela
Zine al-Abidine Ben Ali
Com 152 votos está o ex-Presidente da Tunísia, que governou entre 1987 e 2011. É acusado de roubar mais de dois mil milhões de euros à população tunisina e de beneficiar amigos e companheiros a escapar à justiça. É conhecido pelo seu estilo de vida extravagante e saiu do Governo em 2011, na sequência de protestos nas ruas da Tunísia conhecidos como a Revolução de Jasmim ou Primavera Árabe.
Foto: picture-alliance/dpa
Fundação Akhmad Kadyrov
A Fundação Akhmad Kadyrov tem como fim o desenvolvimento social e económico da Chechénia. Mas é acusada de gastar as verbas a entreter e oferecer presentes a estrelas de Hollywood e para o benefício de Ramzan Kadyrov (na foto), presidente da região russa da Chechénia e filho do falecido Akhmad Kadyrov. Segundo a TI, Ramzan Kadyrov usou as verbas para comprar jogadores de futebol. Reuniu 194 votos.
Foto: imago/ITAR-TASS/Y. Afonina
Sistema político do Líbano
Com 606 votos, o sistema político no Líbano, nomeadamante o Governo, as autoridades e as instituições, encontram-se também na lista da Transparência Internacional. Segundo a filial libanesa da TI, a corrupção encontra-se em todos setores sociais e governamentais, existindo "uma cultura de corrupção" no país. Considera o Líbano um país "muito fraco" em termos de integridade.
Foto: picture-alliance/dpa
FIFA - Federação Internacional de Futebol
A Federação Internacional de Futebol, mais conhecida como FIFA, é acusada de ultrajar milhões de fãs. Os respoonsáveis pelos cargos mais elevados são acusados de roubar milhões de euros e estão a ser analisados 81 casos suspeitos de branqueamento de capitais um pouco por todo o mundo. Há suspeitas que várias eleições de países anfitriões de mundiais de futebol foram manipuladaa. Conta 1844 votos.
O senador da República Dominicana conta 9786 votações. Foi acusado de branqueamento de capitais, abuso de poder, prevaricação e enriquecimento ilícito no valor de vários milhões de dólares. Bautista já esteve em tribunal, mas nunca foi considerado culpado, o que originou vários protestos por parte da população dominicana.
Foto: unmaskthecorrupt.org
Ricardo Martinelli e companheiros
É ex-Presidente do Panamá e empresário. Ricardo Martinelli terminou com 10166 votos e possui atualmente uma rede de supermercados no país, entre outras empresas. Está envolvido numa polémica de espionagem política durante o seu mandato entre 2009 e 2014, utilizando alegadamente dinheiros públicos. Tem outras acusações em tribunal, incluindo vários crimes financeiros e subornos e perdões ilegais.
Foto: Getty Images/AFP/J. Ordone
Petrobras
A petrolífera Petrobras, empresa semi-estatal brasileira, ficou em segundo lugar com 11900 votos. As acusações de subornos, comissões e lavagens de dinheiro de mais de dois mil milhões de euros, conduziram, alegadamente, o Brasil a uma profunda crise política. O caso envolve mais de 50 políticos e 18 empresas. A população brasileira já protestou várias vezes nas ruas para exigir justiça.
Foto: picture alliance/CITYPRESS 24
Viktor Yanukovych
O ex-Presidente da Ucrânia foi o mais votado. Acumulou 13210 acusações e é acusado de "deixar escapar" milhões de ativos estatais em mãos privadas e de ter fugido para a Rússia antes de ser acusado de peculato. Yanukovych começou o seu mandato em 2010, foi reeleito em 2012 e cessou as suas funções no ano de 2014, quando foi destituído após vários protestos populares.