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Devolução de terras para cultivo exige "transparência"

11 de agosto de 2023

À DW, diretora da ADRA de Benguela diz que anúncio do Governo angolano de reaver terras "não é novidade". A analista pede transparência no processo e frisa a necessidade de criar condições para a adesão dos jovens.

Angola | Regenmangel
Foto: Adilson Liapupula/DW

O Presidente de Angola, João Lourenço, instou a nação a arregaçar as mangas e voltar aos campos, com o objetivo de alcançar a autossuficiência na produção de alimentos. Num movimento significativo, anunciou que o Governo irá reaver terras que permaneceram intocadas por décadas, desafiando os cidadãos a cultivar esses recursos negligenciados.

A visão do Presidente é aproveitar os solos férteis do país, o clima favorável, os abundantes recursos hídricos e a mão de obra jovem para transformar o potencial não explorado em prosperidade tangível.

João Lourenço anunicou a devolução de terrasFoto: Adrian Dennis/AP Photo/picture alliance

Em entrevista à DW, a analista angolana e diretora da ADRA (Ação para o Desenvolvimento Rural e Ambiental) de Benguela, Cecília Kitombe, diz que o discurso de João Lourenço não é novidade. Cecília Kitombe acrescenta, no entanto, que é "uma decisão assertiva",  mas que se deve atentar à questão do princípio da transparência e expropriação das terras dos camponeses por parte dos generais ou dos proprietários de grandes lotes de terra.

DW: Como vê essa decisão de reaver terras não exploradas e como poderá ou deve ser feita este "reaver" de terras?

Cecília Kitombe (CK): Primeiramente, a decisão é bastante assertiva, se tomarmos como facto a desapropriação de terras que muitos agricultores, sobretudo familiares, vivenciam no contexto de Angola. Este anúncio não é uma novidade. Há anos que se fala nesta possibilidade de reaver as terras por parte de quem não as explora para os fins pretendidos. Acho que há também um elemento fundamental que não podemos deixar de lado: o princípio da transparência. Garantir, de facto, que ao reaver essas terras, haja um processo claro e transparente de como tudo isto se vai processar para que a sociedade compreenda e possa dar o seu devido apoio ao processo. Sabemos que quem fez a entrega das terras foi o próprio Estado, através das suas instituições. Os generais e os proprietários de grandes lotes de terra não os conseguiram de outra forma senão com a conivência do próprio Estado, porque sabemos que muitas destas instituições estatais foram vulnerabilizadas por conta da corrupção e muitos desses processos não obedeceram aos preceitos legais. A história mostra-nos que algumas dessas terras foram expropriadas dos camponeses sem uma indemnização justa.

DW: Como vê a proposta do Presidente de incentivar os jovens a trabalhar nestas terras? Quais os possíveis impactos sociais e económicos desta abordagem?

CK: Penso que é um discurso importante. Neste momento, a juventude é o segmento que representa o maior número de desempregados em Angola. Portanto, esta medida irá beneficar os jovens, sobretudo, aqueles que já se dedicam ou pretendam dedicar-se à agricultura. Mas para que tenhamos o impacto necessário, é preciso agregar algumas medidas que vão criar condições para que os jovens trabalhem na terra. Às vezes os grandes problemas são o acesso aos fatores de produção, como o crédito, à legalização de terras e aos programas públicos. Isso é que vai ser um desafio para que estes jovens possam impactar a vida económica da sociedade angolana e a deles.

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