O ativista Benedito Jeremias diz ter sido impedido de se recadastrar como funcionário do Ministério da Geologia e Minas de Angola, por orientações da Casa Militar e da Presidência. Autoridades desmentem afirmações.
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Está a decorrer em Angola o processo de recadastramento dos funcionários da função pública. Por isso, Benedito Jeremias foi chamado a realizar a prova de vida na direcção provincial do Ministério da Geologia e Minas no Moxico, no leste do país, onde trabalha. Mas quando chegou ao local, o ativista não conseguiu recadastrar-se. Disseram-lhe que faltavam alguns documentos.
Segundo o ativista, o responsável da equipa de recadastramento na província de Moxico, Pedro de Assis dos Santos, chegou a recadastrar uma colega do ativista, que se encontrava fora da província, mas a ele não.
"O senhor Pedro de Assis dos Santos, que é a pessoa que chefia a equipa de recadastramento a nível da província do Moxico, disse claramente que a funcionária Carolina vai ser cadastrada. Mas o colega Benedito não será recadastrado porque recebemos ordens superior vindas da Casa Militar e da Presidência da República para não ser cadastrado", denuncia Benedito Jeremias.
Autoridades desmentem
Pedro Assis dos Santos desmente a informação e diz que as declarações do ativista são caluniosas. "Não ser recadastrado por ordens superiores é uma infâmia e também é uma infantilidade", sublinha.
"O que posso dizer é que, em princípio, não cumpria com as exigências para o recadastramento e muitos como ele não foram recadastrados e estão a ser recadastrados agora", acrescenta o responsável pela equipa de recadastramento de pessoal no Moxico
Também o diretor provincial de Geologia e Minas no Moxico, Victor Pedro, afirma que o ativista não está a ser impedido de se recadastrado. "Não é bem assim como a informação está a ser passada, de que foi impedido. Os casos pendentes estão a ser tratados neste momento", assegura.
Mbanza Hamza em situação semelhante
Mbanza Hamza, outro ativista dos 15+2, grupo que foi condenado por atos preparatórios de rebelião e associação de malfeitores, diz que também passou pela mesma situação. Segundo o jovem, o delegado provincial da Educação de Luanda, André Soma, disse à sua mãe que, por ordens da Presidência da República e da Casa Civil, o ativista não podia ser cadastrado.
Entretanto, a situação resolveu-se. O ativista conseguiu fazer a prova de vida depois de o assunto ter chegado à comunicação social, por causa de uma carta que escreveu ao responsável da Educação de Luanda.
"Essa gente nem conhece a lei que regula o nosso país. Por isso é que apresentam um grande atraso civilizacional", critica. "O Presidente da República não tem competência administrativa para demitir um funcionário, como é o meu caso que sou professor, como é o caso do Benedito Jeremias, que é funcionário da Geologia e Minas".
"Este julgamento é uma palhaçada"
Presos desde junho de 2015, os 15 ativistas aguardam o desfecho do julgamento desde setembro. Recentemente, Nito Alves classificou o julgamento como uma "palhaçada", o que lhe valeu uma condenação a seis meses de prisão.
Foto: picture-alliance/dpa/P. Juliao
"Este julgamento é uma palhaçada"
Depois de quase seis meses de julgamento, Manuel Nito Alves, um dos 15 ativistas detidos desde junho, afirmou que todo o processo era uma "palhaçada". A afirmação valeu-lhe uma condenação a seis meses de prisão. A Central Angola 7311 resolveu criar várias imagens, onde os ativistas surgem com maquilhagem de palhaço, para desmascarar o "circo" em que estão envolvidos.
Foto: Central Angola 7311
Reclusos do Zédu
No início do julgamento, a 16 de novembro do ano passado, os ativistas chegaram a tribunal com t-shirts onde tinham escritas frases de protesto. Luaty Beirão, um dos revus, afirmou na altura que "Vai acontecer o que o José Eduardo decidir. Tudo aqui é um teatro".
Foto: DW/P.B. Ndomba
#LiberdadeJa
Ao longo dos vários meses de processo, foram vários os protestos que aconteceram nas ruas de Luanda e de outras cidades. A Amnistia Internacional pede a liberdade dos prisioneiros de consciência, que se mostram bastante desgastados psicologicamente.
Foto: Reuters/H. Corarado
Prisão domiciliária desde dezembro
Em dezembro, o Tribunal Constitucional de Angola decretou o fim da prisão preventiva dos 15 ativistas. No acórdão era possível ler-se que "cabe ao juiz da causa determinar a medida de coação a aplicar nos termos da lei". A Procuradoria Geral da República propôs a alteração da medida de coação para prisão domiciliária.
Foto: picture-alliance/dpa/P. Juliao
Prisão domiciliária sem fundamento
Em fevereiro, o Tribunal de Luanda decretou que os ativistas deveriam continuar em prisão domiciliária. Praticamente um mês depois, os revus continuam à espera das alegações finais. "Nós sabemos que não podemos esperar nada de bom disto, apenas uma condenação", disse António Kissanda, da Central Angola 7311, à DW.
Foto: Reuters/H. Corarado
"Os 15+2 estão a ser julgados por falar a verdade"
"Falar sobre as boas condições que José Eduardo dos Santos criou não é crime, mas dizer que não há luz, água potável, educação já é", diz António Kissanda. O 15+2 (Laurinda Gouveia, na foto, e Rosa Conde foram constituídas arguidas, mas aguardam julgamento em liberdade) estão a ser julgados porque "falaram a verdade".
Foto: Central Angola 7311
Ativistas usam greve de fome como forma de protesto
Em setembro, Domingos da Cruz, Inocêncio de Brito, Luaty Beirão (na imagem) e Sedrick de Carvalho declararam uma greve de fome contra a prisão preventiva, ilegal nessa altura, ao abrigo da Constituição angolana. Luaty Beirão manteve-se em greve de fome até ao final de outubro. Agora, é Nuno Dala quem usa a greve de fome como forma de protesto: tomou a decisão há seis dias (9.03).
Foto: Central Angola 7311
Julgamento sem fim à vista
Ontem (14.03), realizou-se mais uma sessão do julgamento dos 15+2. David Mendes (à esquerda na imagem), um dos advogados de defesa do grupo, recusa depor como declarante no processo. A sessão de ontem, prevista para as declarações finais, foi adiada para 21 de março, depois de o advogado ter sido impedido de exercer as suas funções como advogado de defesa.
Foto: DW/Nelson Sul d'Angola
"Isto é uma farsa que os levou à cadeia e os mantém na cadeia"
Para António Kissanda, da Central Angola 7311, este julgamento é uma farsa e lembra todos os outros ativistas que, ao longo dos 36 anos em que José Eduardo dos Santos está no poder, foram perseguidos e mortos. "Nós já estamos mortos, para dizer a verdade, só falta estarmos no caixão como prova disso", afirma. "Tal como em qualquer ditadura, é importante que não se criem mentalidades no povo".