Indefinição política em época eleitoral causa ceticismo em investidores estrangeiros e nacionais. Com negócios estagnados há anos devido à crise económica em Angola, muitos apresentam timidez para investirem no país.
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O cenário é de indefinição política. Não apenas com o abandono do poder e relatos que apontam para o agravamento do estado de saúde do presidente José Eduardo dos Santos, mas pelo "perfil dúbio” de seu sucessor, o ministro da Defesa, João Lourenço. Numa altura de incertezas em época eleitoral, investidores e trabalhadores das empresas estrangeiras começam a abandonar o país.
O general João Lourenço é para os investidores estrangeiros e nacionais uma figura incógnita. Pouco ou nada se sabe sobre o seu "pensamento económico” - exceto pelos discursos genéricos de "corrigir-se o que está mal e melhorar o que está bem”, sendo este também o lema de campanha do seu partido, o MPLA, no poder desde a independência do país, há 42 anos.
Numa altura de indefinição política sobre o futuro do país, os investidores estrangeiros começam a apresentar reservas diante da ausência de garantias. Teme-se que uma instabilidade pós-eleitoral comprometa os investimentos.
Empresários estrangeiros em Angola
Com eleiçoes a vistas, a falta de divisas, e a retirada do poder José Eduardo dos Santos, o ceticimismo tomou conta dos investidores.
Antonio Cascais, é um empresário português que trabalha no sector da hotelaria, que em entrevista à DW África descreveu como problemático o ambiente económico em Angola. Segundo ele é " uma expetativa perceber quais serão os mecanismos para que se estabeleça a solidez e a facilidade financeira da banca para que seja retomada a normalidade das operações bancárias. Aguarda-se que existam possibilidades de trabalhar porque neste momento esta tudo estagnado”, disse.
Relativamente ao receio que paira entre os investidores sobre a indefinição politica do pais, o empresário Acácio Matias, socio-gerente da MundiMaquinas, é de opinião que, neste momento, o mais preocupante para os empresários é a falta de divisas que a cada dia que passa vai empobrecendo as empresas e não só.
“A apreensão é o problema do preço do petróleo que não aumenta e Angola é muito dependente do exterior para além das divisas que escasseiam. É esse o problema porque a situação da moeda em Angola é uma calamidade que tem multiplicado os custos. Os empresários ficaram mais pobres bem como os empregados. O custo de vida em Angola está mal. A situação neste momento não é boa para ninguém. É claro que a situação nunca está mal para todos ao mesmo tempo, mas neste momento está mal para muita gente. E Angola tem cerca de 30 milhões de pessoas para alimentar”, afirma Acácio Matias.Em função das incertezas económicas e políticas que o pais atravessa, começa a registar-se o abandono do pais de dezenas de cidadãos estrangeiros muitos deles ligados às construtoras luso-angolanas "Teixeira Duarte" e "Mota-Engil".
O presidente da Confederação Empresarial de Angola, uma organização que responde por mais de 50 associações empresariais, Francisco Viana, disse estar por dentro do ceticismo que paira entre os investidores.
“Nos todos estamos preocupados. Angola está num momento delicado mas como estamos preocupados também estamos a prevenir. O importante, como disse, é que ninguém queira entrar pela via da violência para transformar Angola num Iraque ou transformar Angola num pais devastado como a Síria.”
Na semana passada, João Lourenço, candidato do partido do governo (MPLA) às eleições gerais de agosto, reuniu com os empresários numa sessão de auscultação. No encontro, os empresários pediram o fim do tráfico de influencia e da corrupção nos concursos públicos nomeadamente das obras públicas.
José Eduardo dos Santos deixará saudades?
Dos Santos anunciou no início de 2017 que deixará o poder ao fim de 38 anos. Será que os angolanos terão saudades? Os comícios e as manifestações no país e fora de Angola nos últimos anos não deixam chegar a um consenso.
Foto: Getty Images/AFP/A. Pizzoli
Setembro de 2008 - Luanda
Este comício do MPLA em Kikolo, Luanda, foi assistido por milhares de pessoas durante a campanha para as eleições de 2008, as primeiras em 16 anos. O MPLA obteve 82% dos votos, tendo conquistado 191 dos 220 lugares da Assembleia Nacional de Angola.
Foto: picture-alliance/ dpa
Março de 2011 - Angola
No entanto, e apesar da maioria conseguida nas eleições de 2008, nos anos seguintes realizaram-se várias manifestações, em Angola, e não só, contra o Governo. A 7 de março de 2011, teve início no país uma onda de manifestações inspiradas na Primavera Árabe. Na organização destas manifestações estava o Movimento Revolucionário de Angola, também conhecido como "revús".
Foto: picture-alliance/dpa
Março de 2011 - Londres
No mesmo dia (7 de março), cerca de 30 pessoas sairam às ruas em Londres para protestar contra o Presidente José Eduardo dos Santos. Os manifestantes exigiram a saída do pai de Isabel dos Santos gritando "Zédu fora!" e "Zé tira o pé".
Foto: Huck
Fevereiro de 2012 - Benguela
Em 2012, ano de eleições no país, o número de manifestações organizadas pelos não apoiantes de José Eduardo dos Santos continuou a crescer. O protesto retratado na fotografia teve lugar em Benguela, a 13 de fevereiro. "O povo não te quer", gritaram os manifestantes.
Foto: DW
Junho de 2012 - Luanda
A 23 de maio de 2012, o presidente angolano anuncia que as eleições legislativas se irão realizar a 31 de agosto. Sensivelmente um mês depois, a 23 de junho, o Estádio 11 de Novembro, em Luanda, encheu-se de militantes e simpatizantes do MPLA para aplaudir José Eduardo dos Santos e apoiar a sua candidatura.
Foto: Quintiliano dos Santos
Julho de 2012 - Viana
Cartazes a favor de dos Santos num comício da campanha para as eleições de 2012 em Viana, arredores de Luanda. A 31 de agosto, o MPLA vence as eleições com mais de dois terços dos votos. Depois de uma mudança da Constituição, o Presidente já não é eleito diretamente, mas sim indiretamente nas legislativas. Como cabeça de lista do MPLA, José Eduardo dos Santos é eleito Presidente de Angola.
Foto: Quintiliano dos Santos
Maio de 2015 - Benguela
Nos anos seguintes continuaram os protestos contra o Presidente. Foram-se somando episódios de violência e detenções. 2015 torna-se-ia um ano complicado no que às críticas a JES diz respeito. No aniversário do "27 de maio", em Benguela, por exemplo, 13 ativistas foram detidos minutos depois de começarem um protesto. No mesmo dia, também houve detenções em Luanda.
Foto: DW/N. Sul d'Angola
Junho de 2015 - Luanda
Em junho de 2015, tem início um dos episódios da governação de José Eduardo dos Santos mais criticados. 15 ativistas angolanos, entre eles Luaty Beirão, foram detidos sob acusação de planeaream um golpe de Estado. Para além de terem despoletado muitas manifestações, estas detenções tiveram mediatismo um pouco por todo o mundo devido às greves de fome levadas a cabo por muitos dos detidos.
Foto: DW/P. Borralho
Julho de 2015 - Lisboa
No dia 17 de julho realizou-se, em Lisboa, a primeira manifestação em Portugal a favor da libertação destes jovens. "Basta de repressão em Angola", ouviu-se na capital portuguesa. Dias mais tarde, em Luanda, a polícia reagiu violentamente contra algumas dezenas de manifestantes que protestaram no Largo da Independência.
Foto: DW/J. Carlos
Agosto de 2015 - Luanda
A 2 de agosto e sob o lema "liberdade já", cerca de 200 pessoas, entre as quais vários artistas angolanos - poetas, políticos, atores e artistas plásticos - juntaram-se, em Luanda, para pedir a libertação dos 15 ativistas angolanos detidos. Sanguinário, Flagelo Urbano, Toti, Jack Nkanga, Sábio Louco, Zwela Hungo, Mona Diakidi, Dinameni, Fat Soldie e MCK foram alguns dos artistas presentes.
Foto: DW
Agosto de 2015 - Luanda
Dias mais tarde foi a vez das mães dos ativistas se fazerem ouvir. Nas ruas de Luanda, pediram a libertação dos seus filhos, mesmo depois da manifestação ter sido proibida pelo Governo.
Foto: DW/P. Ndomba
Agosto de 2015 - Lisboa
Nem no dia do seu aniversário (28 de agosto), José Eduardo dos Santos teve "descanso". Cidadãos descontentes, quer em Lisboa, quer em Angola, voltaram às ruas. Na capital portuguesa, voltou a pedir-se liberdade para os ativistas. Exigiu-se ainda liberdade de movimento, de pensamento, de expressão e de imprensa em Angola.
Foto: DW/J. Carlos
Novembro de 2015 - Luanda
No dia em que se celebraram os 40 anos da independência de Angola, proclamada a 11 de novembro de 1975, pelo então Presidente António Agostinho Neto, vários jovens voltaram a fazer ouvir-se. 12 manifestantes foram detidos.
Foto: DW/M. Luamba
Março de 2017 - Cazenga
No início de 2017, José Eduardo dos Santos anunciou a saída da Presidência. O cabeça-de-lista do MPLA às eleições gerais deste ano será o atual ministro de Defesa João Lourenço. O candidato foi recebido por centenas de apoiantes naquele que foi o seu primeiro ato de massas da pré-campanha, no município do Cazenga, em Luanda, a 4 de março.