Isabel dos Santos manifestou "orgulho" na obra do pai e relativizou problema da corrupção em Angola, numa altura em que a sua gestão enfrenta contestações na Sonangol. Já há quem acredite que o seu fim esteja para breve.
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A presidente da petrolífera angolana fez os pronunciamento num evento promovido pela Thomson Reuters em Londres. Isabel dos Santos reconhece que o seu país tem desafios por ultrapassar, mas também tece um rasgado elogio ao seu pai: "O Presidente dos Santos tem uma história fantástica, é um grande líder para África".
Um pai que antes de abandonar o poder ainda conseguiu exarar Decretos que lhe conferem mais poderes na mais importante empresa pública de Angola, a Sonangol. Mas na empresa há quem não esteja contente com isso nem com a sua gestão.
É possível revogar os decretos exarados pelo ex-Presidente? O jurista Nelson Domingos esclarece que "o atual Presidente da República pode fazê-lo nos termos do artigo 120 e 125 da nossa Constituição. Do ponto de vista jurídico não há nenhum impedimento". Entretanto sublinha: "Do ponto de vista político isso tem um preço. É necessário o atual Presidente ponderar o custo político da revogação de um decreto do género, uma vez que está em jogo é a filha do ex-Presidente da República, a presidente do conselho de Administração da maior empresa pública do país, a Sonangol."
Administração da Sonangol favorece os interesses do povo?
E se por um lado há acusações de má gestão na Sonangol, Isabel dos Santos, por outro, faz com alguma frequência informes sobre o bom desempenho da petrolífera. O petróleo é o coração da economia de angolana. Portanto, tudo depende da Sonangol e as esperanças de uma vida melhor passam por esta empresa.
Daí a necessidade de questionar se a atual estrutura de administração favorece os interesses do povo angolano. Precioso Domingos é economista angolano e considera que apenas sob certas condições: "Sim, em primeiro lugar dando lucro e não sendo uma empresa que agora passou a ser um peso morto para o Estado, porque a Sonangol era vista como uma vaca leiteira do Estado e agora é uma empresa que contrai dívidas, junto da China, por exemplo. Portanto, esta não é uma Sonangol desejável."E o economista questiona o modelo de gestão em vigor: "Quero dizer que há problemas ao nível da sua gestão. Todavia é uma empresa que hoje está dominada pela consultoria. Não sei como se pode tornar uma empresa estratégica quando está totalmente dominada por consultores."
19.10.17. ONLINE Isabel dos Santos Sonangol Manifesto - MP3-Mono
Questão de vida ou morte para o novo Presidente de Angola?
João Lourenço herdou um país mergulhado em problemas, entre eles uma crise financeira e económica. A sua credibilidade enquanto Presidente do país passa por resolver também essa crise. E isso pode significar ter de fazer mexidas na Sonangol.
Será que Lourenço teria coragem para quebrar os últimos decretos do pai de Isabel dos Santos? Precioso Domingos recorda que "agora há essa comissão que foi criada e que deve apresentar resultados dentro de um mês, o que significa que muitas das reivindicações que estão a ser colocadas vierem a ser provadas provavelmente também há o risco da engenheira Isabel dos Santos não chegar até dezembro ou janeiro."
Na sua edição de 17 de outubro o site de notícia angolano "Correio Kianda" informa que funcionários da Sonangol estão a fazer circular um manifesto com vista a solicitar ao novo Presidente do país a revogação dos polémicos decretos que conferem mais poderes a Isabel dos Santos. Com isso os funcionários quereriam proteger os interesses do Estado angolano. Já antes um anúncio de contratação de apenas quadros estrangeiros pela Sonangol tinha causado grande polémica.
Face a este historial pode se prever um agudizar de descontentamento? Para Precioso Domingos "parece que a saída de José Eduardo dos Santos (JES) em si está a ter consequências sobre as liberdades. Há muita gente que não conseguia falar e hoje já fala. A própria jurista Lurdes Kapoço se calhar é dos casos mais expressivos... eu duvido que com o Presidente JES no poder ela teria a coragem de liderar um movimento de protesto contra tudo o que se está a passar. Mas hoje já o faz."
Qual é o peso de um manifesto?
E qual seria a força de um manifesto com vista as mudança na Sonangol? O jurista Nelson Domingos diz que "na verdade o Presidente da República já tem dado este sinal. Num primeiro momento reuniu-se com as empresas petrolíferas para procurar saber das suas preocupações e atribuiu aos ministros a responsabilidade de encontrarem um compromisso para esta situação."
A recuperação das "vítimas" de Isabel dos Santos é também um sinal positivo: "Mas outros recados bastante significativos tem a ver com a nomeação de um dos responsáveis da Sonangol, que foi exonerado pela Isabel dos Santos. Então, há aí um certo recado e um aproveitamento daqueles quadros que foram relegados a um segundo plano pela atual administração da Sonangol."
Angola: Os contrastes de um gigante petrolífero
O "boom" do petróleo ainda não é para todos. Ao mesmo tempo que Angola oferece oportunidades de investimento a empresas nacionais e estrangeiras, mais de um terço da população vive com menos de um dólar por dia.
Foto: DW/R. Krieger
Lama no cotidiano
O bairro Cazenga é o mais populoso de Luanda – ali, vivem mais de 400 mil pessoas numa área de 40 quilômetros quadrados. Em outubro de 2012, chuvas fortes obrigaram muitos habitantes a andar na lama. Do Cazenga saíram muitos políticos do partido governista angolano MPLA. "Uma das prioridades de políticos pobres é a riqueza rápida", diz o economista angolano Fernando Heitor.
Foto: DW/R. Krieger
Dominância do MPLA
Euricleurival Vasco, 27, votou no MPLA nas eleições gerais de agosto de 2012: "É o partido do presidente. Desde a guerra civil, ele tenta deixar o poder, mas a população não deixa". Críticos dizem que José Eduardo dos Santos não cumpriu nenhuma promessa eleitoral, como acesso à água e à eletricidade. Mas o governo lançou um plano de desenvolvimento em novembro para dar esses direitos à população.
Foto: DW/R. Krieger
Economia informal em Angola
Muitos angolanos esperam riqueza do chamado "boom" do petróleo. Mas grande parte da população é ativa na economia informal, como estas vendedoras de bolachas na capital, Luanda. Segundo a ONU, 37% da população vivem com menos de um dólar por dia. Elias Isaac, da organização de defesa dos direitos humanos Open Society, considera este um "contrassenso" entre "crescimento e desenvolvimento".
Foto: DW/R. Krieger
Uma infraestrutura de fachada?
A capital angolana Luanda é considerada uma das cidades mais caras do mundo. Um prato de sopa pode custar cerca de 10 dólares num restaurante, o aluguel de um apartamento mais de cinco mil dólares por mês. A Baía de Luanda é testemunho constante do "boom" do petróleo: guindastes e arranha-céus disputam quem é mais alto.
Foto: DW/Renate Krieger
O "Capitólio" de Angola
Próximo à Baía de Luanda, surge a nova sede do parlamento angolano. O partido governista MPLA vai ocupar a maior parte dos 220 assentos: elegeu 175 deputados em agosto de 2012. Por outro lado, o MPLA perdeu 18 assentos em comparação à eleição de 2008. A UNITA, maior partido da oposição, ganhou 32 assentos em 2012 – mas tem pouco espaço...
Foto: DW/R. Krieger
O presidente no cotidiano de Luanda
…porque, segundo críticos, o presidente José Eduardo dos Santos (numa foto da campanha eleitoral) "domina tudo": o poder Executivo, o Judiciário e o Legislativo, diz o economista Fernando Heitor. José Eduardo dos Santos também parece dominar muitas ruas de Luanda: em novembro de 2012, quase todas as imagens eram da campanha do partido no poder, o MPLA.
Foto: DW/R. Krieger
Dormir nos carros
Os engarrafamentos são frequentes em Luanda. Por isso, muitos funcionários que moram em locais mais afastados já partem para a capital angolana de madrugada. Ao chegarem em Luanda, dormem nos carros até a hora de ir trabalhar – juntamente com as crianças que precisam ir à escola. A foto foi tirada às 06:00h da manhã perto do Palácio da Justiça em novembro de 2012.
Foto: DW/R. Krieger
A riqueza em recursos naturais de Angola
Angola é o segundo maior produtor de petróleo da África, mas também tem potencial para se tornar um dos maiores exportadores de gás natural. A primeira unidade de produção de LNG – Gás Natural Liquefeito, em inglês – foi construída no Soyo, norte do país, mas ainda está em fase de testes. A fábrica tem uma capacidade de produção de 5,2 milhões de toneladas de LNG por ano.
Foto: DW/Renate Krieger
Para acabar com a dependência do petróleo...
A diversificação da economia poderia ser uma solução, diz o Fundo Monetário Internacional (FMI). O governo angolano criou um fundo soberano do petróleo para investir no país e no estrangeiro, e para ter uma reserva caso haja oscilações no preço do chamado "ouro negro". Uma alternativa, segundo especialistas, poderia ser a agricultura, já que o petróleo só deve durar mais 20 ou 30 anos.
Foto: DW/R. Krieger
Angola atrai estrangeiros
Vêem-se muitas placas em chinês e empresas chinesas em Angola. Os chineses são a maior comunidade estrangeira no país. Em seguida, vêm os portugueses, que em parte fogem à crise económica europeia. Depois, os brasileiros, por causa da proximidade cultural. Todos querem uma parte da riqueza angolana ou investem na reconstrução do país.
Foto: DW/R. Krieger
Homem X Asfalto
Para o educador Fernando Pinto Ndondi, o governo angolano deveria investir "no homem e não no asfalto". Há cinco anos, Fernando e sua famíla foram desalojados da ilha de Luanda por causa da construção de uma estrada. Agora vivem nestas casas precárias. O governo constrói novas casas para a população. Porém, os preços, a partir de 90 mil dólares, são altos demais para a maior parte dos angolanos.
Foto: DW/Renate Krieger
Para onde vai o dinheiro?
O que aconteceu com 32 mil milhões de dólares lucrados pela empresa petrolífera estatal angolana Sonangol entre 2007 e 2011? Um relatório do FMI constatou, em 2011, que faltava essa soma nos cofres públicos. A Sonangol diz ter investido o dinheiro em infraestrutura. Elias Isaac, da Open Society, diz que o governo disponibiliza mais informações – o que "não é sinônimo de transparência".