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Irene Neto queixa-se de "massacre judicial e mediático"

Lusa
2 de outubro de 2020

A filha do primeiro Presidente angolano, Agostinho Neto, e mulher do empresário Carlos São Vicente, apela à libertação do marido, que disse estar "preso injustamente".

Foto: Artur Machado/Global Images/Imago Images

Num comunicado enviado à agência de notícias Lusa, esta sexta-feira (02.10), a médica, também membro do Bureau Político do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA, no poder) lamenta a falta de solidariedade dos camaradas de partido e afirma estar atualmente sem meios para pagar as suas despesas quotidianas, depois de ver as suas contas congeladas.

"Tenho as minhas contas bancárias congeladas. Estou sem meios para prover as despesas quotidianas. A vingança sobre mim e a minha família chegou a um ponto muito próximo de práticas fascistas de triste memória", lamenta Irene Neto, acrescentando que não se vai render "à chantagem, ao abuso de poder, a uma justiça travestida de polícia política".

"Uma vingança mesquinha"

Em relação ao marido, que se encontra em prisão preventiva na cadeia de Viana por suspeita dos crimes de peculato, branqueamento de capitais e tráfico de influências, envolvendo uma conta de 900 milhões de dólares também congelada na Suíça, afirma ser "um cidadão honrado e cumpridor das leis angolanas" que está preso apenas por ter tido "sucesso".

"O massacre judicial e mediático sobre a minha família e, particularmente, a minha pessoa, representa, sem qualquer dúvida, uma intolerável interferência do poder político no poder judicial e é também uma vingança mesquinha desnecessária", recrimina a filha de Agostinho Neto.

Julgamento "na praça pública"

Irene Neto acusa as autoridades de alimentarem "um circo mediático" contra a sua família e diz que o marido é vítima de um julgamento "criado artificialmente e alimentado por setores bem identificados".

A mulher de Carlos São Vicente afirma que o marido sempre geriu as suas empresas no setor financeiro, do turismo e no imobiliário "no respeito pelas normas em vigor em Angola e no mercado internacional" e sublinha que até ao momento não foi acusado de nada.

"Porém, as autoridades, que têm o dever de proteger o segredo de justiça, alimentam um circo mediático que representa o julgamento e condenação de Carlos de São Vicente, na praça pública", critica.

"A prisão preventiva do cidadão Carlos de São Vicente é, de facto, o cumprimento de uma pena sentenciada no tribunal populista, presidido por agentes do Ministério Público", continua a filha do antigo presidente, afirmando que não se divorciou do empresário.

"Estamos mais unidos do que nunca e sofremos ambos os mesmos desgostos. Nunca imaginámos que um empresário pudesse ser preso, apenas por ter sucesso nas suas atividades empresariais", escreve Irene Neto no comunicado.

Considera ainda que Carlos São Vicente está preso injustamente.

"Ele não pode praticar a alegada atividade delituosa, porque já lhe confiscaram todos os bens, até a casa de família. Não pode fugir, porque tem o passaporte caducado. Estar em liberdade ou, pelo absurdo, em prisão domiciliar, não causa qualquer alarme social. Portanto, libertem-no imediatamente", apela, responsabilizando os titulares dos órgãos de soberania por tudo o que acontecer ao marido na prisão.

A médica e ex-deputada do MPLA lamenta não ter recebido "nem uma palavra" de apoio e solidariedade dos seus camaradas, "tirando honrosas exceções" e considera que "este silêncio não dignifica o maior partido histórico de Angola".

O caso

Carlos São Vicente está detido desde dia 21 de setembro por suspeitas da prática dos crimes de peculato, corrupção, branqueamento de capitais e tráfico de influência, bem como recebimento de vantagem indevida e participação económica em negócio.

Em causa está uma investigação que envolve uma conta bancária de Carlos São Vicente congelada na Suíça, por suspeitas de lavagem de dinheiro com cerca de 900 milhões de dólares, o equivalente a 752 milhões de euros, segundo divulgou um blogue suíço que acompanha questões judiciais naquele país.

As autoridades judiciais angolanas ordenaram já a apreensão de vários edifícios do grupo AAA, pertencente ao empresário, que está a ser investigado na Suíça por peculato e branqueamento de capitais.

Entre estes estavam os edifícios AAA, dos hotéis IU e IKA, localizados em todo o território nacional e o edifício IRCA, na Rua Amílcar Cabral, em Luanda. Mais recentemente foram apreendidos o Edifício Adli e Thyke Hotel (Tower) em Luanda, um imóvel adjacente ao terminal da transportadora rodoviária Macon, nas imediações do centro de sinistros do grupo AAA e os edifícios n.ºs 29, 30, 31, 32, 33 e 34 situados no condomínio Sodimo, na Praia do Bispo.

O Serviço Nacional de Recuperação de Ativos da PGR apreendeu igualmente a participação social minoritária de 49% da AAA Ativos no Standard Bank Angola, onde o empresário é administrador não-executivo, tendo o mesmo solicitado suspensão das funções enquanto durar o processo.

O AAA, liderado por Carlos São Vicente, é um dos maiores grupos empresariais angolanos, operando na área de seguros e da hotelaria. 

A seguradora AAA deteve, durante cerca de dez anos, o monopólio de seguros da atividade petrolífera.

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