Cidadãos angolanos consideram um gasto desnecessário a compra de mais de 200 carros de luxo para os parlamentares, quando os eleitores vivem em extrema pobreza, e pedem explicações.
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O secretário-geral da Assembleia Nacional, Agostinho de Neri, anunciou recentemente que a instituição vai adquirir mais de 200 Lexus para os deputados.
O responsável do Parlamento angolano, que não avançou o valor da compra dos automóveis, garantiu que o órgão pretende fidelizar a marca que os membros da casa das leis passarão a usar nos próximos cinco anos.
"É uma viatura oficial de apoio ao deputado enquanto ele estiver a cumprir o seu mandato. Temos Lexus e vamos fidelizar a marca. Estamos a estudar e também dar resposta à capacidade financeira que temos", disse Agostinho de Neri.
Luxo vs dificuldades económicas
O anúncio da compra de novas viaturas foi feito num momento em que está a ser discutida a proposta do Orçamento Geral do Estado (OGE) para 2018, que mais uma vez deve destinar mais recursos para a defesa e segurança do que para os setores da saúde e educação.
A informação causou indignação no seio da sociedade angolana que poderá continuar a enfrentar enormes dificuldades para ter assistência médica e ver a qualquer momento o custo de vida subir devido a uma possível revisão das tarifas dos combustíveis, água e energia. Os cidadãos continuam a denunciar a falta de medicamentos e materiais nos hospitais do país, bem como a falta de carteiras em algumas escolas cujos professores exigem melhores condições de trabalho.
Angola: Lexus para deputados em tempos de crise
O analista político Augusto Báfua Báfua considera que os deputados não devem ostentar bens luxuosos: "Estamos numa nova era e acho que cada pessoa deve receber o seu dinheiro e comprar o carro e casa da sua preferência. Não podemos ter deputados a viverem de vaidade, a andarem com viaturas de luxo."
"Coisa do partido único”
Para o analista, os legisladores e governantes deveriam comprar carros com os seus próprios salários para reduzir as despesas que o Estado faz anualmente com as regalias. "Sempre fui contra a política de o Estado dar carros e casas. Isso foi coisa do partido único", diz Báfua Báfua.
Na opinião do analista, este não é o único problema: "Existem muitos deputados que vivem em zonas de difícil acesso, não só aqui em Luanda mas inclusive fora, e estes carros poderão danificar-se em tempo recorde. E a manutenção é feita às custas da Assembleia Nacional".
Augusto Báfua Báfua entende que o Parlamento deve justificar a compra dos Lexus ao povo: "Como é que compram estas viaturas? Quem escolhe? Alguém tem de nos dar uma explicação. Não pode ser numa curta entrevista. Tem de ser numa conferência de imprensa ou uma declaração pública explicando a razão da compra daquele modelo, o preço e vantagens. Nós temos de saber, porque é dinheiro público."
Críticas ao OGE
Segundo o Presidente da Associação Construindo Comunidades, o padre Jacinto Pio Wacussanga, o OGE para este ano representa uma gota no oceano em relação às necessidades acumuladas da população. O sacerdote considera um absurdo a aquisição de mais 200 carros de luxo aos deputados.
"Se realmente se confirmar que os Lexus serão adquiridos para os deputados, espero que os Lexus venham resolver a questão da falta de medicamentos, o problema da falta de comida", diz o padre Wacussanga. "Ainda não temos, infelizmente, um orçamento que possa acudir às questões emergentes. É um absurdo comprar Lexus agora, em vez de carros mais simples."
Pobreza no meio da riqueza no sul de Angola
Apesar da riqueza em petróleo, em Angola vive muita gente na pobreza, sobretudo no sul do país. A região é assolada por uma seca desde 2011 e as colheitas voltaram a ser pobres neste ano. Muitos angolanos passam fome.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
Sobras da guerra civil
A guerra civil (1976 -2002) grassou com particular violência no sul de Angola. Aqui, o Bloco do Leste socialista e o Ocidente da economia de mercado livre conduziram uma das suas guerras por procuração mais sangrentas em África. Ainda hoje se vêm com frequência destroços de tanques. A batalha de Cuito Cuanavale (novembro de 1987 a março de 1988) é considerada uma das maiores do continente.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
Feridas abertas
O movimento de libertação UNITA tinha o seu baluarte no sul do país, e contava com a assistência do exército da República da África do Sul através do Sudoeste Africano, que é hoje a Namíbia. Muitas aldeias da região foram destruídas. Mais de dez anos após o fim da guerra civil ainda há populares que habitam as ruínas na cidade de Quibala, no sul de Angola.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
Subnutrição apesar do crescimento económico
Apesar da riqueza em petróleo, em Angola vive muita gente na pobreza, sobretudo no sul. A região sofre de seca desde 2011 e as colheitas voltaram a ser más no ano 2013. Muitos angolanos não têm o suficiente para comer. A Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) diz que nos últimos anos pelo menos um quarto da população passou fome durante algum tempo ou permanentemente.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
O sustento em risco
Dado o longo período de seca, a subnutrição é particularmente acentuada nas províncias do sul de Angola, diz a FAO. As colheitas falham e a sobrevivência do gado está em risco. Uma média de trinta cabeças perece por dia, calcula António Didalelwa, governador da província de Cunene, a mais fortemente afetada. O Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) também acha que a situação é crítica.
Foto: DW/A. Vieira
Semear esperança
A organização de assistência da Igreja Evangélica Alemã “Pão para o Mundo” lançou um apelo para donativos para Angola na sua ação de Advento 2013. Uma parte dos donativos deve ser reencaminhada para a organização parceira local Associação Cristã da Mocidade Regional do Kwanza Sul (ACM-KS). O objetivo é apoiar a agricultura em Pambangala na província de Kwanza Sul.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
Rotação de culturas para assegurar mais receitas
Ernesto Cassinda (à esquerda na foto), da organização cristã de assistência ACM-KS, informa um agricultor num campo da comunidade de Pambangala, no sul de Angola sobre novos métodos de cultivo. A ACM-KS aposta sobretudo na rotação de culturas: para além das plantas alimentícias tradicionais como a mandioca e o milho deverão ser cultivados legumes para aumentar a produção e garantir mais receitas.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
Receitas adicionais
Para além de uma melhora nas técnicas de cultivo, os agricultores da região também são encorajados a explorar novas fontes de rendimentos. A pequena agricultora Delfina Bento vendeu o excedente da sua colheita e investiu os lucros numa pequena padaria. O pão cozido no forno a lenha é vendido no mercado.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
Escolas sem bancos
Formação de adultos na comunidade de Pambangala: geralmente os alunos têm que trazer as cadeiras de plástico de casa. Não é só em Kwanza Sul que as escolas carecem de equipamento. Enquanto isso, a elite de Angola vive no luxo. A revista norte-americana “Forbes” calcula o património da filha do Presidente, Isabel dos Santos, em mais de mil milhões de dólares. Ela é a mulher mais rica de África.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
Investimentos em estádios de luxo
Enquanto em muitas escolas e centros de saúde falta equipamento básico, o Governo investiu mais de dez milhões de euros no estádio "Welvitschia Mirabilis", para o Campeonato Mundial de Hóquei em Patins 2013, na cidade de Namibe, no sul de Angola. Numa altura em que, segundo a organização católica de assistência “Caritas Angola” dois milhões de pessoas passaram fome no sul do país.
Foto: DW/A. Vieira
Novas estradas para o sul
Apesar dos destroços de tanques ainda visíveis, algo melhorou desde o fim da guerra civil em 2002: as estradas. O que dá a muitos agricultores a oportunidade de venderem os seus produtos noutras regiões. Durante a era colonial portuguesa, o sul de Angola era tido pelo “celeiro” do país e um dos maiores produtores de café de África.
Foto: Jörg Böthling/Brot für die Welt
Um futuro sem sombras da guerra civil
Em Angola, a papa de farinha de milho e mandioca, rica em fécula, chama-se “funje” e é a base da alimentação. As crianças preparam o funje peneirando o milho. Com a ação de donativos de 2013 para a ACM-KS, a “Pão para o Mundo” pretende assegurar que, de futuro, os angolanos no sul tenham sempre o suficiente para comer e não tenham que continuar a viver ensombrados pela guerra civil do passado.