Moxico está isolado de Angola por causa das más estradas
24 de novembro de 2021Quase 500 quilómetros separam Luena, capital da província do Moxico, da comuna do Cazombo, município do Alto Zambeze. São cerca de 45 minutos de viagem de avião, mas mais de um dia por estrada. A razão da demora é só uma: as péssimas condições das vias.
A estrada nacional 250, que liga Alto Zambeze e Luau ao Moxico, encontra-se totalmente degradada: buracos e águas paradas caraterizam a via. "A estrada está muito mal, muito mal. Saímos de madrugada e até a essas horas... Sempre estamos na via a lutar", desabafa Norberto Samuel Matimba, um taxista que se cruzou com a DW na chamada estrada principal.
Durante a viagem, cruzámo-nos também com um motoqueiro. Sem se identificar, disse: "A estrada não está boa. Tem buracos. É muito sofrimento", asseverou.
Sofrimento na pele
As pessoas ouvidas pela DW no Moxico descrevem a situação com uma palavra: "sofrimento".
Anteriormente os automobilistas precisavam de apenas quatros horas para percorrem 200 quilómetros, mas agora são necessárias cerca de 11 horas para cumprir a mesma distância. Os carros não resistem aos buracos na estrada.
"É muito difícil, muito difícil e não sabemos a hora a que vamos chegar. Os acessórios [do automóvel] estão a estragar-se. Agora não sabemos mais o que fazer", diz Norberto Samuel Matimba.
As consequências da degradação desta via são várias. "É difícil a comida chegar aqui devido às estradas de Luau a Kazombo", explica Báuleno Cristino, de 60 anos, morador no Kazombo.
Às vezes, alguns produtos que sustentam os habitantes locais saem do país vizinho - a Zâmbia. "Nós vemos camiões que saem da Zâmbia e chegam aqui com milho. É o que está ajudar o nosso povo", acrescenta.
Os medicamentos também não chegam ao Alto Zambeze por causa das estradas. Anacleta Kassueca diz que a Zâmbia tem sido o refúgio para assistência médica. "Uma pessoa quando fica [doente] grave tem que ir à Zambia para buscar os medicamentos. Nós estamos a passar mal", resume.
Obras às moscas
As obras do Plano Integrado dos de Intervenção nos Municípios (PIIM) do Alto Zambeze estão paradas.
"Tu para construíres aqui tinhas que ser mesmo combatente... Se olhares para as estradas nunca vais conseguir construir nada. É sempre aquilo: estraga camião, repara camião", comenta Júlio Manuel, encarregado de obra de um dos projetos de construção.
"Daqui a mais dois meses ninguém passa nessa estrada. Quem passar nessa estrada é mesmo para partir o carro", adverte.
António Mukisse, administrador do Alto Zambeze, admite a existência de obras paradas e não apenas por péssimas estradas. "Muitos delas por falta de pontes. Logo que se ultrapasse a situação das pontes, poderemos ver essas obras no âmbito do PIIM a começarem. Refiro-me à comuna de Kaianda, Kalunda, Lumbala Kakengue", enumera.
Quanto aos populares que vão em busca de assistência médica até à Zâmbia, o governante diz que o que se passa, na maioria das vezes, é a falta de pessoal. "Nós não temos médicos especializados. Há aquelas questões pontuais, encaminhamos esses casos para o Luau", afirma.
Viver num país e trabalhar noutro
Luau e Alto Zambeze limitam-se pela República Democrática do Congo (RDC) e pela Zâmbia. A chamada Estrada Internacional da SADC liga Cazombo ao território zambiano e a linha férrea do Luau liga este município ao antigo Zaíre. A DW apurou que numa das fronteiras muitos cidadãos angolanos trabalham na Zâmbia e na RDC e vice-versa.
Há, inclusivamente, casamentos entre cidadãos dos três povos. Por isso, cidadãos acreditam que um investimento nas estradas impulsionaria o desenvolvimento e a reintegração da região.
Ativistas do Moxico convocam manifestações permanentes. Segundo Nelson Mucazo Euclides, objetivo é só um: ter estradas em condições. "Não se circula à vontade no interior da província. É por isso que nós convocámos uma manifestação permanente até que o Governo central nos dê uma resposta, com data, para a reabilitação destas vias. Se olhares bem, vais notar que o Moxico é como se fosse a ilha dos condenados", metaforiza.
Questionado sobre as manifestações resultariam em alguma coisa, Nelson é assertivo:
"Nós vamos fazer a nossa parte para mostrar que estamos insatisfeitos com essa situação, porque Angola é um todo. Se é um todo, a região leste não pode viver essa discriminação", conclui.