Angola: movimento denuncia prisão de 10 ativistas na Lunda
Júlia Faria
1 de março de 2019
Presidente do movimento, José Mateus Zecamutchimba afirma que detenções foram arbitrárias. Detidos estavam em casa quando foram levados pela polícia angolana. Grupo reivindica autodeterminação do Reino Lunda Tchowke.
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O Movimento do Protectorado Lunda Tchowke denuncia a prisão de dez ativistas pela polícia angolana em Cafunfo, no município de Cuango. Um dos presos, o ativista Henrique Manuel, teria sido infetado por uma seringa contendo veneno e encontra-se internado sob custódia policial, no Hospital de Cafunfo. Ao todo, 21 ativistas do grupo estão detidos, incluindo os que foram presos em uma manifestação que teve lugar em 17 de novembro.
Entre os presos, há três mulheres e dois adolescentes. Todos os detidos são membros do Movimento do Protectorado, que reivindica a autodeterminação do reino Lunda Tchowke. Em entrevista à DW África, o presidente do grupo, José Mateus Zecamutchima, afirma que os ativistas não se manifestavam nem realizavam atividade política quando foram presos.
"Estavam em casa. Foram encontrados em suas casas, não estavam em nenhuma atividade política. De acordo com as informações até agora, os sobas teriam coisas infundadas de dizerem que são feiticeiros, de que essas pessoas costumam enfeitiçar membros do Governo. São coisas caricatas, não é científico. São mitos. E até agora a polícia não conseguiu esclarecer porque está na cadeia, qual o crime. Não há crime”, disse.
Angola: movimento denuncia prisão de 10 ativistas na Lunda
Tentativa de envenenamento
Zecamutchima conta ainda que o ativista Henrique Manuel, infetado por uma seringa, está em recuperação no hospital, mas ainda corre perigo.
"Um grupo de indivíduos pertencentes a um núcleo do MPLA chegaram em casa do nosso membro, sem mais nem menos. Começaram a agredir o nosso membro e lhe espetaram a seringa. A polícia pode testemunhar porque a pessoa até agora está sob custódia da polícia também, mas no hospital, em tratamento. E os médicos testemunharam que tinha sido envenenado, que ele correu perigo entre a vida e a morte. Vai recuperando, mas enquanto se mantiver no hospital, significa que continua em perigo”, afirmou.
Sem diálogo
O presidente do Movimento do Protectorado não vê perspetiva para que todos os detidos sejam soltos. Zecamutchima considera as prisões arbitrárias e reclama da falta de diálogo com o Governo. Ele alega ter escrito uma carta ao Procurador-Geral da República em dezembro, pedindo a libertação dos ativistas presos no ano passado, mas que nunca obteve resposta.
"Nós continuamos a falar, a ir nos gabinetes deles a partir de Luanda para exigir conversa. Mas nunca há conversa. Estão sempre a colocar pessoas presas. E essas prisões não vão parar enquanto não houver diálogo. Para parar as prisões, o Governo deveria dignar-se a dialogar connosco. Se ele não está a dialogar, significa que as prisões vão continuar. É a forma que o Governo acha que vai intimidar o povo para recuar", disse.
Tumulto em Capenda Camulemba
Na mesma altura das prisões em Cafunfo, dez pessoas ficaram feridas, nove das quais membros das forças de defesa e segurança, em distúrbios causados por mais de 70 pessoas no município de Capenda Camulemba, na província angolana da Lunda Norte, segundo a agencia Lusa.
O incidente, informou a polícia, ocorreu na quarta-feira (27.02.) na localidade de Xamiquelengue, na barreira de contenção das forças de defesa e segurança no acesso único de entrada ao Projeto da Mina Lulo. As forças mistas compostas pela Polícia, Forças Armadas Angolanas (FAA) e Segurança privada encontram-se no local no âmbito da "Operação Transparência", que tem como um dos objetivos combater o garimpo ilegal de diamantes.
Segundo um comunicado de imprensa do comando provincial da Lunda Norte da Polícia Nacional, o grupo de populares, entre os quais se encontravam autoridades tradicionais, deslocou-se àquela localidade devido a reclamações dos autóctones sobre a falta de assistência social às comunidades, como previsto por lei. O grupo tentou entrar no Projeto da Mina Lulo e forçar a paralisação dos trabalhos, tendo sido impedido pelas forças de defesa e segurança.
Congoleses em fuga de Angola: RDC promete retaliação
Mais de 270 mil congoleses foram obrigados a abandonar Angola. Em retaliação, o ministro dos Negócios Estrangeiros congolês deu dois meses aos angolanos ilegais para abandonarem a RDC. ACNUR teme nova crise humanitária.
Foto: Reuters/G. Paravicini
Ao ritmo de 1.000 imigrantes por hora
Imigrantes congoleses chegam à localidade fronteiriça de Kamako, já do lado da República Democrática do Congo (RDC), ao ritmo de 1.000 pessoas por hora. Mais de 270 mil imigrantes ilegais congoleses foram obrigados a abandonar Angola, após um decreto do Presidente João Lourenço que visa acabar com a imigração ilegal no país, sobretudo nas regiões diamantíferas das Lundas.
Foto: Reuters/G. Paravicini
RDC promete retaliação
O Governo em Kinshasa utiliza o termo "expulsos" quando se refere aos imigrantes que Angola diz estarem a "sair de forma voluntária" do país. Como represália, o ministro dos Negócios Estrangeiros congolês definiu um prazo de dois meses para que todos os angolanos em situação irregular saiam da RDC. A tensão levou os Governos e representações diplomáticas dos dois países a iniciarem conversações.
Foto: Reuters/G. Paravicini
Detidos com documentos angolanos falsos
Em colaboração com o ACNUR e com organizações não-governamentais, as autoridades congolesas estão a vigiar a pente fino as entradas no país. Entre os cidadãos obrigados a abandonar Angola, há portadores de documentação da nação vizinha. Porém, o porta-voz da "Operação Transparência" anunciou a detenção de imigrantes com "documentos angolanos falsos" que serão julgados em Luanda.
Foto: Reuters/G. Paravicini
Congoleses dedicavam-se ao garimpo ilegal
O comandante da Polícia Nacional de Angola, António Bernardo, garante que os imigrantes que estão a abandonar o país "não se coíbem de dizer" que se deslocaram para Angola "para ganhar dinheiro na exploração ilegal de diamantes". Com o encerramento das cooperativas e casas ilegais de venda e compra de pedras preciosas, "os imigrantes decidiram voluntariamente sair do país", diz o responsável.
Foto: Reuters/G. Paravicini
ACNUR não confirma mortes
Apesar das denúncias de mortes e maus-tratos perpetrados por agentes da Polícia Nacional de Angola, no âmbito da "Operação Transparência", o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) não confirma essas informações "por falta de dados". Philippa Candler, representante do ACNUR em Angola, diz que os imigrantes estão a sair de Angola pelo próprio pé, mas sob pressão do Governo.
Foto: Omotola Akindipe
Cerca de 35 mil refugiados legais em Angola
Dados do ACNUR indicam que há 35 mil refugiados legais em Angola. Estão, sobretudo, na Lunda Norte, inseridos num assentamento em Lóvua ou distribuídos pelas povoações. No entanto, a ONU denunciou a expulsão de 50 migrantes com estatuto de refugiados. O ACNUR está a verificar a informação. A escalada do conflito tribal no Kasai levou milhares de congoleses a procurar refúgio fora de portas.
Foto: Reuters/G. Paravicini
A pé ou à boleia de motorizadas e bicicletas
Os migrantes congoleses que estão em viagem de regresso ao país de origem escolheram vários meios para fazê-lo. Alguns aceitaram a ajuda do Governo angolano que disponibilizou camiões para transportar os congoleses até à fonteira. Outros preferem fazê-lo pelo próprio pé ou socorrendo-se de bicicletas e motorizadas. Consigo carregam os seus pertences.
Foto: Reuters/G. Paravicini
De regresso às antigas rotinas
Ainda em viagem, mulheres e crianças lavam roupas nas margens do rio junto à localidade de Kamako, na província de Kasai. O objetivo é regressarem às suas povoações outrora ameaçadas ou reiniciarem uma nova vida longe da sua última morada na RDC. No entanto, a situação nesta província congolesa é instável. A falta de infraestruturas está também a preocupar as Nações Unidas.
Foto: Reuters/G. Paravicini
Nova crise humanitária iminente
A ONU expressou preocupação sobre a saída forçada de Angola nas últimas semanas de centenas de milhares de cidadãos. Para as Nações Unidas, as "expulsões em massa" são "contrárias às obrigações" da Carta Africana e, por isso, exortou os Governos em Luanda e em Kinshasa a trabalharem juntos para garantirem um "movimento populacional" seguro e evitarem uma nova crise humanitária.