Após 15 anos de paz, MPLA ainda cita conflitos armados para justificar problemas que o Governo não conseguiu resolver. UNITA diz que a questão precisa ser discutida no Parlamento.
Publicidade
O "fantasma da guerra" foi despertado novamente em Angola, desta vez durante a campanha eleitoral. O cabeça-de-lista do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), João Lourenço, disse que o conflito militar que durou quase 30 anos impediu que o Governo angolano resolvesse uma série de problemas.
O candidato do MPLA voltou a falar da guerra, após 15 anos de um acordo de paz, num dos seus discursos de campanha, na província do Bié. João Lourenço, sem citar nomes, disse que o país chegou a ter uma indústria que gerava muitos postos de trabalho, mas foi destruída pelos opositores durante o conflito.
"Deixamos de ter indústria porque aqueles que hoje dizem que são democratas destruíram a indústria que Angola teve num passado recente. Mas, enquanto a missão de uns foi destruir, a nossa missão é construir".
Este discurso não é novo, diz a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), o principal partido da oposição. Raúl Danda, vice-presidente do Galo Negro, minimiza as declarações do adversário de longa data e diz que a questão deve ser discutida no Parlamento.
"Já pedi várias vezes, vamos discutir aqui sem tabus, deixando que os cidadãos saibam e também ouçam com transmissão quais são as causas da guerra para evitar estas coisas". Para o vice-presidente da UNITA, o importante nesta fase é apresentar ideias para o futuro do país.
"Vamos dizer o que vamos fazer daqui para frente. Para a UNITA, a guerra deve servir apenas para ficar no passado onde está. Culpados da guerra somos todos, nós e o MPLA, vítimas fomos todos", defendeu Danda, lembrando-se da guerra que matou mais de 500 mil pessoas.
Estratégia de campanha
O "fantasma da guerra" é levantado sempre que se questionam os feitos da governação do MPLA. Durante a campanha eleitoral, o partido no poder apresentou o seu plano de Governo em algumas universidades em Luanda, e muitos estudantes não gostaram de ouvir falar no conflito. Um deles foi Francisco Fernandes, da Universidade Católica de Angola, que lembra que a maioria dos eleitores são jovens.
"São pessoas que não acompanharam o processo da guerra. Fazer recurso ao que foi guerra faz perder a massa eleitoral que é jovem e que quer saber quais são os planos que os partidos têm para 2017/2022", critica o estudante.
Além do discurso e da apresentação do programa de Governo, desde o início da campanha eleitoral está a ser exibido em alguns canais de televisão um documentário sobre a guerra em Angola. O filme "Caminho da paz" tem sido criticado nas redes sociais.
MMT 18.08.17 Fantasma da Guerra - MP3-Mono
Tempo de paz?
Há quem defenda que a prioridade deveria antes ser a reconciliação nacional – como José Patrocínio, coordenador da ONG angolana OMUNGA. Ele lembra que, apesar dos conflitos terem cessado há 15 anos, o país ainda vive situações de violência e insegurança.
"Nem tão pouco a situação da guerra tem agora efeitos em relação da situação do país. É uma tentativa de relação forçada sobre isso. Se todos nós lembramos esta situação da guerra, a maioria que é jovem lembra-se precisamente das atrocidades que temos vivido aqui. O caso Cassule e Kamulingue, os 15+2, o caso Mavungo, o do Ganga. Tudo isso aconteceu no tempo de paz".
Angola: Os contrastes de um gigante petrolífero
O "boom" do petróleo ainda não é para todos. Ao mesmo tempo que Angola oferece oportunidades de investimento a empresas nacionais e estrangeiras, mais de um terço da população vive com menos de um dólar por dia.
Foto: DW/R. Krieger
Lama no cotidiano
O bairro Cazenga é o mais populoso de Luanda – ali, vivem mais de 400 mil pessoas numa área de 40 quilômetros quadrados. Em outubro de 2012, chuvas fortes obrigaram muitos habitantes a andar na lama. Do Cazenga saíram muitos políticos do partido governista angolano MPLA. "Uma das prioridades de políticos pobres é a riqueza rápida", diz o economista angolano Fernando Heitor.
Foto: DW/R. Krieger
Dominância do MPLA
Euricleurival Vasco, 27, votou no MPLA nas eleições gerais de agosto de 2012: "É o partido do presidente. Desde a guerra civil, ele tenta deixar o poder, mas a população não deixa". Críticos dizem que José Eduardo dos Santos não cumpriu nenhuma promessa eleitoral, como acesso à água e à eletricidade. Mas o governo lançou um plano de desenvolvimento em novembro para dar esses direitos à população.
Foto: DW/R. Krieger
Economia informal em Angola
Muitos angolanos esperam riqueza do chamado "boom" do petróleo. Mas grande parte da população é ativa na economia informal, como estas vendedoras de bolachas na capital, Luanda. Segundo a ONU, 37% da população vivem com menos de um dólar por dia. Elias Isaac, da organização de defesa dos direitos humanos Open Society, considera este um "contrassenso" entre "crescimento e desenvolvimento".
Foto: DW/R. Krieger
Uma infraestrutura de fachada?
A capital angolana Luanda é considerada uma das cidades mais caras do mundo. Um prato de sopa pode custar cerca de 10 dólares num restaurante, o aluguel de um apartamento mais de cinco mil dólares por mês. A Baía de Luanda é testemunho constante do "boom" do petróleo: guindastes e arranha-céus disputam quem é mais alto.
Foto: DW/Renate Krieger
O "Capitólio" de Angola
Próximo à Baía de Luanda, surge a nova sede do parlamento angolano. O partido governista MPLA vai ocupar a maior parte dos 220 assentos: elegeu 175 deputados em agosto de 2012. Por outro lado, o MPLA perdeu 18 assentos em comparação à eleição de 2008. A UNITA, maior partido da oposição, ganhou 32 assentos em 2012 – mas tem pouco espaço...
Foto: DW/R. Krieger
O presidente no cotidiano de Luanda
…porque, segundo críticos, o presidente José Eduardo dos Santos (numa foto da campanha eleitoral) "domina tudo": o poder Executivo, o Judiciário e o Legislativo, diz o economista Fernando Heitor. José Eduardo dos Santos também parece dominar muitas ruas de Luanda: em novembro de 2012, quase todas as imagens eram da campanha do partido no poder, o MPLA.
Foto: DW/R. Krieger
Dormir nos carros
Os engarrafamentos são frequentes em Luanda. Por isso, muitos funcionários que moram em locais mais afastados já partem para a capital angolana de madrugada. Ao chegarem em Luanda, dormem nos carros até a hora de ir trabalhar – juntamente com as crianças que precisam ir à escola. A foto foi tirada às 06:00h da manhã perto do Palácio da Justiça em novembro de 2012.
Foto: DW/R. Krieger
A riqueza em recursos naturais de Angola
Angola é o segundo maior produtor de petróleo da África, mas também tem potencial para se tornar um dos maiores exportadores de gás natural. A primeira unidade de produção de LNG – Gás Natural Liquefeito, em inglês – foi construída no Soyo, norte do país, mas ainda está em fase de testes. A fábrica tem uma capacidade de produção de 5,2 milhões de toneladas de LNG por ano.
Foto: DW/Renate Krieger
Para acabar com a dependência do petróleo...
A diversificação da economia poderia ser uma solução, diz o Fundo Monetário Internacional (FMI). O governo angolano criou um fundo soberano do petróleo para investir no país e no estrangeiro, e para ter uma reserva caso haja oscilações no preço do chamado "ouro negro". Uma alternativa, segundo especialistas, poderia ser a agricultura, já que o petróleo só deve durar mais 20 ou 30 anos.
Foto: DW/R. Krieger
Angola atrai estrangeiros
Vêem-se muitas placas em chinês e empresas chinesas em Angola. Os chineses são a maior comunidade estrangeira no país. Em seguida, vêm os portugueses, que em parte fogem à crise económica europeia. Depois, os brasileiros, por causa da proximidade cultural. Todos querem uma parte da riqueza angolana ou investem na reconstrução do país.
Foto: DW/R. Krieger
Homem X Asfalto
Para o educador Fernando Pinto Ndondi, o governo angolano deveria investir "no homem e não no asfalto". Há cinco anos, Fernando e sua famíla foram desalojados da ilha de Luanda por causa da construção de uma estrada. Agora vivem nestas casas precárias. O governo constrói novas casas para a população. Porém, os preços, a partir de 90 mil dólares, são altos demais para a maior parte dos angolanos.
Foto: DW/Renate Krieger
Para onde vai o dinheiro?
O que aconteceu com 32 mil milhões de dólares lucrados pela empresa petrolífera estatal angolana Sonangol entre 2007 e 2011? Um relatório do FMI constatou, em 2011, que faltava essa soma nos cofres públicos. A Sonangol diz ter investido o dinheiro em infraestrutura. Elias Isaac, da Open Society, diz que o governo disponibiliza mais informações – o que "não é sinônimo de transparência".