Cresce a onda de intimidação contra os cidadãos que criticam publicamente a governação do MPLA. São vários os relatos de perseguições e detenções. Ativistas dizem que Angola caminha para uma "tirania".
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A noite de terça-feira foi de terror para a mulher e o filho do jornalista Cláudio Emanuel "In".
O profissional da Rádio Despertar não estava em casa; dois homens encapuzados arrombaram a porta; com uma faca quente, fizeram mais de 30 cortes nos membros inferiores e superiores da esposa, e ameaçaram matar o seu filho.
"Fizeram a minha esposa refém, amarraram-na, apontaram uma faca ao meu filho de um ano e disseram: 'se tu gritares, vamos matar o teu filho aqui'", conta Cláudio "In" em entrevista à DW África.
A tortura começou depois: "Começaram a fazer os cortes à minha esposa, deram-lhe várias chapadas, pontapearam-na, deram-lhe um murro no estômago. Está com as pernas e os braços todo cortados."
Especial DW: Tomada de posse e manifestações em Angola?
35:05
Os agressores deixaram uma nota com um aviso para Cláudio "In". As agressões têm a ver com o trabalho que tem feito na rádio, afirma.
"Tivemos lá um convidado que criticou muito o trabalho do serviço de inteligência. Só pode ser por causa disso. Eles não roubaram nada, não levaram nada de casa. Apenas destruíram tudo, desarrumaram tudo, partiram a loiça. Tinham uma chave-mestra que poderia abrir as portas. É trabalho profissional."
Perseguições e detenções de vozes críticas
O ataque aconteceu horas depois da libertação de vários ativistas angolanos, acusados de incitarem a rebelião.
Nas últimas semanas, muitos jovens foram detidos depois de criticarem a validação dos resultados eleitorais, que deram a vitória ao Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA). O Exército foi colocado nas ruas e está em "prontidão combativa".
Para o jornalista Cláudio "In", trata-se de "terrorismo" de Estado contra quem ousa opor-se ao partido no poder.
"Vão silenciar todos, porque não há quem aguente que se metam com a sua família, com a sua esposa e o filho de um ano. Ameaçar matar um bebé de um ano perante a sua mãe indefesa, isso é um ato de mais puro terrorismo que ouvi", afirma o jornalista.
A polícia esteve na residência de Cláudio "In", em Luanda, e ainda não se pronunciou sobre o assunto.
O ativista angolano Osvaldo Caholo conta que também tem sido ameaçado. Caholo diz que foi detido no dia da investidura do Presidente da República, a 15 de setembro, depois de ter criticado o Governo numa entrevista concedida à DW África.
"Na entrevista, eu dizia que a sociedade civil tem um plano para contornar os cinco anos de terrorismo de Estado que o MPLA vai exercer. Em conversa, o comandante da esquadra disse-me que o áudio da DW terá preocupado as autoridades de topo do MPLA, e a nível superior houve uma ordem para a minha detenção. Fiquei detido das 7h às 16h."
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A "tirania de João Lourenço"
Caholo acredita que Angola está a caminho de uma "tirania". "Isto ainda não terminou por aqui, penso que o pós-eleições está cada vez mais perigoso", comenta o jovem.
"O MPLA - apercebendo-se da evolução da consciência dos cidadãos, [que veem cada vez mais] a necessidade de pôr fim [à governação] deste partido maquiavélico - vai usar todas as armas para reiniciar o país."
Em declarações à DW África na semana passada, o porta-voz do Serviço de Investigação Criminal, Manuel Halaiwa, negou que as detenções tenham motivos políticos.
Os jovens detidos estavam a incitar a rebelião nas redes sociais, justifica o SIC: "Todos aqueles que estiverem a ser detidos estão envolvidos em atos que constituem crimes. Aliás, esta é a tarefa dos órgãos de defesa e segurança", disse Halaiwa.
Xitu Milongo, ativista da Plataforma Cazenga em Ação (PLACA), diz que escapou da detenção na semana passada com a ajuda da população, que o defendeu.
O ativista prevê que o novo mandato do Presidente João Lourenço será difícil para todos os que são "verticais" e criticam a governação. "Presume-se que haverá sumiços de críticos neste intervalo de cinco anos, que haja mortes misteriosas de críticos, daqueles que não se deixarem comprar pela tirania de João Lourenço."
Segundo Xitu Milongo, esses sumiços já começaram a acontecer, durante as últimas manifestações.
Detidos há nove meses, sem acusação formal, estão dois críticos da governação de João Lourenço - Luther Campos e Tanaece Neutro.
O secretário-geral do maior partido da oposição, a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), repudia estes atos. "Continuamos a apelar à libertação de Tanaece, Luther Campos e de outros presos políticos que ainda jazem nas cadeias do regime", afirmou Álvaro Chikwamanga Daniel.
O início do julgamento de Tanaece Neutro está marcado para 6 de outubro. Luther Campos começará a ser julgado a 9 de outubro.
Angola: As eleições em imagens
Esta quarta-feira é dia de Angola decidir quem será o próximo Presidente e os deputados da Assembleia Nacional. A DW compilou as imagens desta manhã de eleições, no dia em que 14 milhões de angolanos vão às urnas.
Foto: Adolfo Guerra/DW
Longas filas no dia de decidir
As mesas de voto só abriram às 07h00, mas as filas para votar nas eleições mais disputadas de sempre em Angola começaram a formar-se bem cedo. Cabe aos eleitores decidir se "a força do povo" continua do lado do MPLA, mantendo no poder o partido que governa o país desde a independência, ou se dizem "sim" ao apelo de mudança da oposição liderada pela UNITA.
Foto: John Wessels/AFP
Oito partidos na corrida
Além dos rivais Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) e União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), concorrem Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA), Partido de Renovação Social (PRS), Aliança Patriótica Nacional (APN), Partido Nacionalista para a Justiça (P-NJANGO), Partido Humanista de Angola e a coligação Convergência Ampla de Salvação de Angola (CASA-CE).
Foto: António Cascais/DW
Madrugar para votar
Aos 79 anos, Adélia Namalange exerce hoje o seu direito de voto pela quinta vez. A idosa chegou às 5h00 à assembleia de voto número 9658, no município do Lobito, em Benguela, e esperou duas horas pela abertura das urnas, no dia que 14 milhões de angolanos decidem o futuro político do país.
Foto: Daniel Vasconcelos/DW
João Lourenço apela ao voto: "É Angola que ganha"
"Acabámos de exercer o nosso direito de voto, é rápido e é simples", disse João Lourenço, na assembleia de voto n.º 105, em Luanda, convidando os eleitores a fazerem o mesmo. No meio de uma enorme confusão de jornalistas que queriam registar o momento, o candidato do MPLA salientou que todos saem a ganhar: "É a democracia que ganha, é Angola que ganha."
Foto: AP Photo/picture alliance
Adalberto Costa Júnior critica processo
O líder da UNITA votou no bairro 28 de Agosto, em Luanda, onde foi fortemente aplaudido pelos eleitores presentes. "Fiquei satisfeito e votei no meio do meu povo e constatei que a votação está a ser feita sem cadernos eleitorais aos fiscais, apenas um caderno eleitoral na mesa", afirmou Adalberto Costa Júnior, que defendeu mais uma vez a afixação dos resultados nas assembleias de voto.
Foto: John Wessels/AFP
Manuel Fernandes "plenamente" confiante na vitória
Manuel Fernandes, o candidato da coligação Convergência Ampla de Salvação de Angola - Coligação Eleitoral (CASA-CE), votou esta manhã no Bairro Militar, em Talatona, Luanda. Depois de votar, manifestou "plena confiança" no resultado eleitoral do atual terceiro partido com mais assentos no parlamento angolano.
Foto: Borralho Ndomba/DW
"Grande expetativa" de Nimi Ya Simbi é ganhar eleições
Nimi Ya Simbi, candidato da Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA), votou em Viana, um dos mais populosos municípios de Luanda. Minutos depois, Nimi disse que a sua "grande expetativa é ganhar as eleições." O líder da FNLA acredita que o seu partido "vai vencer" as eleições, "porque quem vai para o combate não vai para perder", tendo enaltecido o cumprimento do seu dever cívico.
Foto: Nelson Francisco Sul/DW
Benedito Daniel exorta à afixação das atas
O candidato do Partido de Renovação Social (PRS) exerceu o seu direito de voto no Instituto Superior Politécnico do Bita, em Luanda. Após votar, Benedito Daniel manifestou um "sentimento de alegria e de dever cumprido", exortando à afixação das atas sínteses nas assembleias. Disse também esperar que a CNE possa corresponder às expetativas dos eleitores.
Foto: DW/M. Luamba
Bela Malaquias insite em "humanizar" Angola
A líder do Partido Humanista de Angola (PHA), Florbela Malaquias, manifestou um "sentimento de realização" após votar e reiterou a promessa de humanizar Angola, "que se encontra completamente desumanizada em todos os sentidos", sublinhou a única mulher a liderar um partido político em Angola, depois de votar no bairro do Maculusso, distrito urbano da Ingombota, em Luanda.
Quintino Moreira, líder da Aliança Patriótica Nacional (APN), sem assento no Parlamento angolano, manifestou-se "otimista" em relação à obtenção de uma "bancada parlamentar vasta", para que não haja maiorias absolutas na "casa das leis", afirmou esta manhã, depois de depositar o seu voto numa assembleia de voto, em Talatona, perto da capital angolana.
Foto: Borralho Ndomba/DW
Dinho Chingunji contra "Votou, Sentou"
O candidato do Partido Nacional para a Justiça em Angola (P-Njango) considerou hoje as eleições como "ocasião soberana" para escolha dos governantes e exortou os eleitores a esperarem os resultados em casa, contrariando o movimento "Votou, Sentou". Chingunji, que votou no município do Kilamba Kiaxi, em Luanda, exortou "os cidadãos a regressarem para as suas casas e a esperar pelos resultados".
Foto: Borralho Ndomba/DW
CNE diz que está tudo a funcionar
A Comissão Nacional Eleitoral (CNE) anunciou que as 13.238 assembleias de voto espalhadas pelos 164 municípios angolanos "estão abertas e em perfeito funcionamento" e "não há registo de qualquer incidente" que possa beliscar a votação. Também foram constituídas 45 mesas de voto no estrangeiro, para as quais foram recrutados 105.952 membros.
Foto: António Cascais/DW
UNITA denuncia irregularidades no Bengo
No Bengo, a UNITA chamou os jornalistas para denunciar supostas irregularidades na votação. De acordo com o partido do "galo negro", a CNE local está a proibir que os delegados de lista suplentes exerçam o direito de voto nas assembleias para as quais estão destacados, contrariando, desta forma, uma circular da própria Comissão Nacional de Eleições.
Foto: António Ambrósio/DW
Queixas de eleitores em Cabinda
A votação em Cabinda está a decorrer com alguma normalidade, mas com várias queixas por parte dos eleitores que dizem desconhecer as suas mesas de voto. Os cidadãos são obrigados a percorrer longas distâncias para votar, já que foram colocados em pontos longínquos da província e da capital. E há delegados de lista de partidos que não foram credenciados.
Foto: Simão Lelo/DW
Delegados monitorizam processo
Delegados de lista dos partidos políticos controlam o processo de votação no Bairro da Cuca, em Luanda, a capital. Durante a campanha eleitoral, o polémico movimento "Votou, Sentou", propalado por alguns partidos e membros da sociedade civil, também pediu aos eleitores para permanecerem nas imediações das assembleias de voto.
Foto: Manuel Luamba/DW
O voto da diáspora em Portugal
O ator Daniel Martinho, a viver há cerca de 40 anos em Portugal, foi ao Consulado Geral de Angola em Lisboa votar, feliz por ser a primeira vez que foi dada à comunidade radicada no exterior a possibilidade de exercer o direito de voto. "Era uma aspiração que nos incomodava", contou à DW. "É uma forma de contribuirmos para um país melhor, porque nós na diáspora também fazemos Angola", precisou.