Analista angolano afirma que a iniciativa do maior partido da oposição é um “balão de ensaio” para possível governação do “Galo Negro”.
Publicidade
A UNITA, o principal partido na oposição em Angola, criou um "governo sombra” com a finalidade de fiscalizar as actividades do Executivo sustentado pelo MPLA. O seu vice-presidente, Raúl Danda, desempenha a função de primeiro-ministro.
Criado pelo atual líder dos "maninhos”, Isaías Samakuva, a estrutura é composta por vários departamentos ministeriais: saúde, meio ambiente, justiça, educação entre outros.
O deputado Joaquim Nafoia, que ocupa a pasta dos Direitos Humanos, disse à DW África o que faz o "governo sombra”.
"Nós procuramos acompanhar as atividades do Governo de facto, neste caso, o Governo do MPLA que está no poder. Eu acompanho as políticas setoriais do atual Governo nesta área, ou seja a desenvoltura no que diz respeito aos direitos fundamentais, ali onde devem ser preservados e onde são violados”, explicou o parlamentar angolano.Na qualidade de ministro dos Direitos Humanos, Joquim Nafoia liderou no mês passado, a delegação dos deputados do partido do Galo Negro, que se deslocou a Cabinda onde se inteirou da situação dos ativistas independentistas detidos em fevereiro último.
O que faz o Governo sombra da UNITA?
Joaquim Nafoia afirma que depois da visita efetuada ao enclave, "houve alguma movimentação das próprias autoridades a partir de Luanda. Neste momento estamos a espera porque estamos a fazer pressão a todos os níveis. Não há razões que justifiquem essas detenções”, garantiu o "ministro sombra”.
Fiscalização e denúncias
O "governo sombra” também faz denúncias. Em janeiro deste ano, o seu "primeiro-ministro”, Raúl Danda, denunciou em conferência de imprensa, a gritante escassez de água que provocava em resposta a comercialização de líquido impróprio para consumo, com consequências gravíssimas para a saúde pública.
Por seu turno e também no princípio do corrente mês de abril, o departamento do "governo sombra" liderado por Nafoia denunciou o que considerou ser a "escravidão moderna” contra alguns camponeses que desenvolvem atividade agrícola na chamada cintura verde de Luanda, município de Icolo e Bengo (Catete), localidade de Bom Jesus.
Depois de constatar as condições de trabalho dos camponeses, Nafoia disse que, "chegamos a conclusão de que há uma nova escravatura moderna”.
Em 2011, ano da sua criação, o "governo sombra” tinha como "primeiro-ministro” o economista Fernando Heitor, que acumulava também a pasta de ministro de Economia e Finanças.Em 2016, o presidente da UNITA, Isaias Samakuva empossou Raúl Danda como chefe do "governo”.
Depois de fiscalizar, a estrutura produz relatórios. O deputado Joaquim Nafoia sublinha que o Governo angolano é o principal beneficiário das fiscalizações.
"As constatações e conclusões fazem parte do relatório, mas também fizemos recomendações com propostas para que o Governo melhore aquilo que não estiver a ser tratado devidamente. As próprias autoridades ganham muito com a nossa intervenção. O governo sombra tem um papel construtivo e não um papel de mera constatação e críticas gratuitas”.
Um "balão de ensaio" para UNITA
Para o analista angolano Agostinho Sikato, a iniciativa é um "balão de ensaio” com vista a uma eventual governação da UNITA nos próximos anos.
"A partir do governo sombra, a UNITA já pode ensaiar tecnicamente como é que poderá compor a sua estrutura administrativa e como poderá exercer o poder executivo. Esperamos, até porque, atarde ou cedo, a UNITA terá de ser poder... A ver vamos como é que esse ensaio lhes vai valer".
O também diretor do Centro de Debates e Assuntos Académicos explicou as vantagens e desvantagens da iniciativa do "Galo Negro”.
"Tem a responsabilidade de constatar, de alertar, aquilo que determinados departamentos ministeriais deviam fazer e não o fazem. Estão ali para opor-se a esta realidade. Mas também "ajudar” que o executivo esteja atento sobre determinados assuntos que a dada altura lhe passe a vista”, afirmou o politólogo Agostinho Sikato.
Angola: Os contrastes de um gigante petrolífero
O "boom" do petróleo ainda não é para todos. Ao mesmo tempo que Angola oferece oportunidades de investimento a empresas nacionais e estrangeiras, mais de um terço da população vive com menos de um dólar por dia.
Foto: DW/R. Krieger
Lama no cotidiano
O bairro Cazenga é o mais populoso de Luanda – ali, vivem mais de 400 mil pessoas numa área de 40 quilômetros quadrados. Em outubro de 2012, chuvas fortes obrigaram muitos habitantes a andar na lama. Do Cazenga saíram muitos políticos do partido governista angolano MPLA. "Uma das prioridades de políticos pobres é a riqueza rápida", diz o economista angolano Fernando Heitor.
Foto: DW/R. Krieger
Dominância do MPLA
Euricleurival Vasco, 27, votou no MPLA nas eleições gerais de agosto de 2012: "É o partido do presidente. Desde a guerra civil, ele tenta deixar o poder, mas a população não deixa". Críticos dizem que José Eduardo dos Santos não cumpriu nenhuma promessa eleitoral, como acesso à água e à eletricidade. Mas o governo lançou um plano de desenvolvimento em novembro para dar esses direitos à população.
Foto: DW/R. Krieger
Economia informal em Angola
Muitos angolanos esperam riqueza do chamado "boom" do petróleo. Mas grande parte da população é ativa na economia informal, como estas vendedoras de bolachas na capital, Luanda. Segundo a ONU, 37% da população vivem com menos de um dólar por dia. Elias Isaac, da organização de defesa dos direitos humanos Open Society, considera este um "contrassenso" entre "crescimento e desenvolvimento".
Foto: DW/R. Krieger
Uma infraestrutura de fachada?
A capital angolana Luanda é considerada uma das cidades mais caras do mundo. Um prato de sopa pode custar cerca de 10 dólares num restaurante, o aluguel de um apartamento mais de cinco mil dólares por mês. A Baía de Luanda é testemunho constante do "boom" do petróleo: guindastes e arranha-céus disputam quem é mais alto.
Foto: DW/Renate Krieger
O "Capitólio" de Angola
Próximo à Baía de Luanda, surge a nova sede do parlamento angolano. O partido governista MPLA vai ocupar a maior parte dos 220 assentos: elegeu 175 deputados em agosto de 2012. Por outro lado, o MPLA perdeu 18 assentos em comparação à eleição de 2008. A UNITA, maior partido da oposição, ganhou 32 assentos em 2012 – mas tem pouco espaço...
Foto: DW/R. Krieger
O presidente no cotidiano de Luanda
…porque, segundo críticos, o presidente José Eduardo dos Santos (numa foto da campanha eleitoral) "domina tudo": o poder Executivo, o Judiciário e o Legislativo, diz o economista Fernando Heitor. José Eduardo dos Santos também parece dominar muitas ruas de Luanda: em novembro de 2012, quase todas as imagens eram da campanha do partido no poder, o MPLA.
Foto: DW/R. Krieger
Dormir nos carros
Os engarrafamentos são frequentes em Luanda. Por isso, muitos funcionários que moram em locais mais afastados já partem para a capital angolana de madrugada. Ao chegarem em Luanda, dormem nos carros até a hora de ir trabalhar – juntamente com as crianças que precisam ir à escola. A foto foi tirada às 06:00h da manhã perto do Palácio da Justiça em novembro de 2012.
Foto: DW/R. Krieger
A riqueza em recursos naturais de Angola
Angola é o segundo maior produtor de petróleo da África, mas também tem potencial para se tornar um dos maiores exportadores de gás natural. A primeira unidade de produção de LNG – Gás Natural Liquefeito, em inglês – foi construída no Soyo, norte do país, mas ainda está em fase de testes. A fábrica tem uma capacidade de produção de 5,2 milhões de toneladas de LNG por ano.
Foto: DW/Renate Krieger
Para acabar com a dependência do petróleo...
A diversificação da economia poderia ser uma solução, diz o Fundo Monetário Internacional (FMI). O governo angolano criou um fundo soberano do petróleo para investir no país e no estrangeiro, e para ter uma reserva caso haja oscilações no preço do chamado "ouro negro". Uma alternativa, segundo especialistas, poderia ser a agricultura, já que o petróleo só deve durar mais 20 ou 30 anos.
Foto: DW/R. Krieger
Angola atrai estrangeiros
Vêem-se muitas placas em chinês e empresas chinesas em Angola. Os chineses são a maior comunidade estrangeira no país. Em seguida, vêm os portugueses, que em parte fogem à crise económica europeia. Depois, os brasileiros, por causa da proximidade cultural. Todos querem uma parte da riqueza angolana ou investem na reconstrução do país.
Foto: DW/R. Krieger
Homem X Asfalto
Para o educador Fernando Pinto Ndondi, o governo angolano deveria investir "no homem e não no asfalto". Há cinco anos, Fernando e sua famíla foram desalojados da ilha de Luanda por causa da construção de uma estrada. Agora vivem nestas casas precárias. O governo constrói novas casas para a população. Porém, os preços, a partir de 90 mil dólares, são altos demais para a maior parte dos angolanos.
Foto: DW/Renate Krieger
Para onde vai o dinheiro?
O que aconteceu com 32 mil milhões de dólares lucrados pela empresa petrolífera estatal angolana Sonangol entre 2007 e 2011? Um relatório do FMI constatou, em 2011, que faltava essa soma nos cofres públicos. A Sonangol diz ter investido o dinheiro em infraestrutura. Elias Isaac, da Open Society, diz que o governo disponibiliza mais informações – o que "não é sinônimo de transparência".