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Província do Cunene aterrorizada com tráfico de órgãos

Lusa | ar
30 de janeiro de 2019

Padre católico angolano Félix Gaudêncio disse que população do Cunene "está assustada" com relatos de traficantes de seres humanos, sobretudo crianças.

Migranten aus Westafrika Symbolbild Menschenhandel
Foto: Getty Images/AFP/I. Sanogo

O padre católico angolano Félix Gaudêncio disse esta quarta-feira (30.01.) à agência de notícias Lusa, que a população da província do Cunene, no sul de Angola, "está assustada" com os "crescentes relatos" de traficantes de seres humanos, sobretudo crianças, quatro dos quais já detidos pela polícia.

"O quadro é de medo, a população está mesmo com medo, em pânico, porque se trata de uma população que, anteriormente, acolhia muitas pessoas, orientava quem estivesse perdido, mas hoje em dia há esse receio de orientar ou acolher estranhos", disse o padre Gaudêncio. 

A polícia da província do Cunene deteve quatro supostos traficantes de seres humanos, que tentavam aliciar crianças, situação que preocupa os moradores.

"Nas imediações do mercado Chamucuio [em Ondjiva, capital da província], foram detidos quatro supostos traficantes de seres humanos", no último fim-de-semana, na sequência de denúncias da população de que estariam a "aliciar crianças" com guloseimas, com o objetivo de as "levar para a Namíbia", país vizinho, relatou o comandante da polícia local, Tito Munana, à imprensa local. Após a audição dos quatro suspeitos, a polícia está "no encalço de mais uma senhora, que é a suposta mandante do grupo", referiu o responsável.

Mais policiamento

Diante do facto, que agitou a população de Ondjiva, os moradores e vendedores do Chamucuio manifestaram-se "apreensivos e aterrorizados" com a situação, e pedem "maior policiamento", afirmando temer que o "pior aconteça com as crianças" da localidade.

Esta quarta-feira, o também presidente da Associação Ame Naame Omuno, de defesa e promoção dos direitos humanos na província, defendeu ainda o "reforço do policiamento" no seio das comunidades, afirmando que o tráfico de seres humanos na província "é uma prática antiga". "Porém, agora ganha maior visibilidade por causa dos meios de comunicação e por causa do mediatismo, então, isso é uma realidade porque chama muito a atenção o facto de aparecerem pessoas assim mortas, de vez em quando", bem como "aparecerem pessoas a dizerem que estavam a ser aliciadas para serem levadas para a Namíbia", concluiu.

Em dezembro de 2018, um vídeo publicado nas redes sociais apresentava um suposto autor confesso desses crimes, relatando como terá matado uma mulher, a quem terá retirado os órgãos, que foram levados para a Namíbia.

Questionado sobre o assunto, o também delegado do Ministério do Interior de Angola no Cunene, Tito Munana, deu conta que as autoridades judiciais "ainda não provaram se os relatos do suposto traficante do vídeo divulgado eram verdadeiros".

"Preocupante situação de seca e fome" no Cunene

O padre Félix Gaudêncio lamentou, por outro lado a "preocupante situação" da seca e fome, na província angolana do Cunene, que afeta milhares de pessoas, defendendo "soluções urgentes" como construção de reservatórios de água.O padre católico deu conta que "maior parte" daquela província angolana, está afetada pela seca e "sem qualquer perspetiva" para o início do ano agrícola, "agudizando a carência de comida e água" para o consumo humano e dos animais.

Foto de arquivo: Campanha contra a seca e a fome no Cunene

"As perspetivas não são boas, na medida em que, normalmente, a esta altura as lavras estariam já verdes e teríamos já uma noção do que seria o ano agrícola, mas o que está a acontecer este ano é exatamente o contrário", disse. "É que até agora, temos pessoas que não cultivaram por falta de chuvas", adiantou.

Governo avalia situação

Entretanto, uma delegação multissetorial chefiada pelo ministro da Administração do Território e Reforma do Estado de Angola, Adão de Almeida, visitou na segunda e terça-feira (28/29.01)  a capital do Cunene, Ondjiva, para avaliar a situação da seca na região.

Adão de Almeida assumiu que a situação da província "é crítica, desafiante e exige mais pragmatismo", apontando entre as medidas a "reparação e abertura de furos de água" para atender as populações das zonas "mais críticas".

Abertura de furos de água não é suficiente

Para o padre Félix Gaudêncio, também presidente da Associação Ame Naame Omuno, de promoção e defesa dos direitos humanos, a abertura de furos de água "é uma alternativa viável mas insuficiente", defendendo também a "construção de 'chimpacas' [reservatórios]" de água.

"Acho que os furos não seriam suficientes, mas poderíamos apostar mais em 'chimpacas', encontrar alternativas que se adaptem à maneira de viver da população, porque um furo que fica a 10 quilómetros para lá as pessoas chegarem é difícil", sublinhou.

O líder da "Ame Naame Omuno", que na língua angolana Kwanyama significa "também sou pessoa", considera que uma outra alternativa para acudir à situação do Cunene seria as autoridades angolanas perceberam a experiência da vizinha República da Namíbia.

Segundo as autoridades, mais de 280.000 pessoas estão afetadas pela seca na província angolana do Cunene.

 

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