Angola: "Preocupante declínio da liberdade de imprensa"
Lusa
29 de outubro de 2020
É um alerta da Associação Repórteres Sem Fronteiras (RSF), que classifica como um "retrocesso preocupante" a detenção e agressões a jornalistas, durante uma manifestação no sábado (24.10) em Luanda.
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Em comunicado divulgado esta quinta-feira (29.10), a RSF apela às autoridades angolanas para que não recorram a métodos de predação da informação que remetam aos "dias sombrios da ditadura".
Mais de cem manifestantes, que protestavam no sábado por melhores condições de vida e pela realização das eleições autárquicas, foram detidos sob acusação de crimes de arruaça e dano de bens públicos, estando o julgamento a decorrer esta semana.
No decurso da manifestação, dois jornalistas, Suely Moreno e Carlos Tomé, um fotógrafo, Santos Samuesseca, e o motorista, Leonardo Franciso, todos da Rádio Essencial, foram detidos e presos "sem justa causa pela polícia", sendo apenas libertados na segunda-feira (26.10).
Segundo a RSF, foram igualmente detidos e soltos algumas horas depois dois jornalistas da TV Zimbo, dois fotógrafos da Agência France Press, Georges Nsimba e Osvaldo Silva, este último relatou cenas de "agressão policial" referindo que foram "forçados a apagar as imagens".
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"Retrocesso lembra a ditadura"
"Ao cobrir uma manifestação, os jornalistas não estavam fazendo nada além do seu trabalho", afirma, no comunicado, o responsável pelo escritório da RSF para África, Arnaud Froger.
Essa "onda de prisões e agressões", refere, constitui "um retrocesso preocupante que lembra os momentos sombrios da ditadura".
"Três anos após a queda do Presidente José Eduardo dos Santos, a liberdade de imprensa continua ser uma conquista em grande parte inacabada em Angola", aponta a RSF.
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Reação das autoridades
Para Arnaud Froger, se as autoridades angolanas "desejam sinceramente virar a página de anos de predação das informações, elas não têm escolha a não ser condenar tais atos e punir seus infratores".
A RSF diz que já havia documentado, em outubro, as "graves ameaças" dirigidas a "vários meios de comunicação e jornalistas angolanos pela cobertura do caso Edeltrudes Costa", chefe do gabinete do Presidente angolano, João Lourenço, suspeito de ter desviado fundos públicos.
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"O 'site' de notícias independente Correio Angolense, bem como o jornalista 'freelance' e ex-correspondente da RSF, Siona Casimiro, foram alvos de ataques cibernéticos, e o jornalista Carlos Rosado de Carvalho foi censurado por vários canais com os quais colaborava", lê-se no comunicado.
Nesta quinta-feira, na abertura da quarta sessão ordinária do comité central do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA, no poder desde 1975), o Presidente angolano, João Lourenço, lamentou as detenções de jornalistas, "devidamente credenciados", augurando que tal situação "não volte a se registar no país".
Angola ocupa, atualmente, o 106.º lugar entre 180 países no Raking Mundial da liberdade de Imprensa estabelecido pela RSF em 2020.
Países africanos que mais violam a liberdade de imprensa
Gana é o país africano mais bem classificado no "<i>Ranking</i> Mundial da Liberdade de Imprensa" dos Repórteres sem Fronteiras. A Eritreia é o pior em África e, a nível mundial, só é melhor que a Coreia do Norte.
Foto: Esdras Ndikumana/AFP/Getty Images
Eritreia - posição 179º lugar
A liberdade de imprensa é considerada "não existente". Em 2001, uma série de medidas repressivas contra <i>media</i> independentes levaram a uma onda de detenções. O Presidente Isaias Afeworki é visto como um “predador” da liberdade de imprensa e usa os meios de comunicação nacionais como seus porta-vozes. Escritores, locutores e artistas são censurados e a informação é escondida dos cidadãos.
Foto: picture-alliance
Sudão - 174º lugar
Na capital Cartum, pratica-se a chamada “censura pré-publicação". O Governo detém jornalistas arbitrariamente e interfere abertamente na produção de notícias. A "Lei da Liberdade de Informação de 2015" é vista como uma outra forma de exercer controlo governamental sobre a informação pública. Os jornalistas têm de passar por um teste e obter uma permissão para trabalhar.
Foto: Getty Images/AFP/A. Shazly
Burundi - 159º lugar
Repressão estatal contra a liberdade de imprensa e intimidação de jornalistas é comum no país. <i>Media </i> controlados pelo Estado substituem cada vez mais estações de rádio independentes, depois de a maior parte delas ter sido forçada a fechar, após uma tentativa de golpe de estado há três anos. Centenas de jornalistas fugiram do país desde 2015. Na foto, protesto de jornalistas no país.
Foto: Esdras Ndikumana/AFP/Getty Images
República Democrática do Congo - 154º lugar
Defensores dos <i>media</i> falam em jornalistas mortos, agredidos, detidos e ameaçados desde que Joseph Kabila sucedeu ao pai na presidência do país em 2001. Orgãos de comunicação internacionais queixam-se que o Governo interfere nos sinais de rádio ou corta mesmo a transmissão. Protestos da oposição levaram as autoridades a interromper ou cortar o acesso à Internet.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Kappeler
Suazilândia - 152º lugar
Esta monarquia absoluta tem a reputação de obstruir o acesso à informação e impedir os jornalistas de fazerem o seu trabalho. Os <i>media</i> estão sujeitos a leis restritivas e repórteres são frequentemente chamados a tribunal pelo seu trabalho. Auto-censura é comum. Um editor saiu recentemente do país depois de fazer uma reportagem sobre negócios obscuros ligados ao Rei Mswati III (na foto).
Foto: picture-alliance/dpa
Etiópia - 150º lugar
O Governo tem uma mordaça sobre os órgãos de comunicação e os jornalistas trabalham sobre condições muito restritivas. Com a Eritreia, este país tem uma das mais altas taxas de jornalistas detidos na África subsariana. Na foto, o jornalista etíope Getachew Shiferaw, que foi condenado a 18 meses de prisão por ter falado com um dissidente.
Foto: Blue Party Ethiopia
Sudão do Sul - 144º lugar
Os jornalistas são obrigados pelo Governo a evitar fazer cobertura do conflito. Órgãos de comunicação internacionais denuciaram casos de assédio e foram banidos deste jovem país, onde pelo menos 10 jornalistas foram mortos desde 2011. Na foto, dois jornalistas do Uganda que tinham sido detidos por autoridades no Sudão do Sul.
Foto: Getty Images/AFP/W. Wudu
Camarões - 129º lugar
O Governo chamou às redes sociais uma “nova forma de terrorismo”, e bloqueia frequentemente o acesso às mesmas. Emissões de rádio e televisão foram bloqueadas duas semanas em março, durante o período eleitoral. Jornais que publicam conteúdos que desagradam políticos no poder são banidos e jornalistas e editores são detidos.
Foto: picture alliance/abaca/E. Blondet
Chade - 123º lugar
Os jornalistas arriscam-se a detenções arbitrárias, agressões e intimidações. Nos últimos meses, o Governo tem vindo a reprimir plataformas de <i>social media</i> e ciber-ativistas. A Internet tem estado bloqueada no país desde 28 de março, no seguimento de um “apagão” da Internet devido a manifestações da sociedade civil e protestos dos órgãos de comunicação num chamado “dia sem imprensa”.
Foto: UImago/Xinhua/C. Yichen
Tanzânia - 93º lugar
Críticos dizem que o Presidente John Magufuli tem vindo a atacar a liberdade de expressão deliberadamente, desde que tomou posse em 2015. Jornalistas foram presos ou dados como desaparecidos. Orgãos de comunicação social foram fechados ou impedidos de publicar durante longos períodos de tempo. Leis que podem ser usadas contra os <i>media</i> foram apertadas.