O Governo de João Lourenço prepara-se para acabar com a venda ambulante nas cidades angolanas com lançamento da "Operação Resgate". No entanto, analistas entendem que, estando o país em crise, este "não é o momento".
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Nas ruas de Luanda e de várias outras cidades angolanas é comum ver mulheres, jovens e crianças a venderem diferentes produtos e serviços, às vezes em locais não apropriados. Segundo o Plano Nacional de Desenvolvimento 2018/2022, mais de 70% das famílias angolanas sobrevivem do comércio informal.
Mas esta é uma atividade que tem os dias contados. Este mês, o Governo de Luanda anunciou que, até ao final do ano, quer colocar os vendedores ambulantes em locais próprios.
Orlando Bernardo, diretor do Gabinete de Comunicação Institucional e Imprensa do Comando Geral da Polícia, anunciou na semana passada a entrada em ação da "Operação Resgate", que visa combater, entre outros, a venda "desordenada", fora dos mercados, de bens e serviços nas cidades angolanas, que "atrapalha, e de que maneira, a circulação automóvel ao nível das cidades."
A "Operação Resgate" vai fiscalizar a venda de telemóveis, cartões de recargas telefónicas, venda de acessórios de viaturas e o garimpo da água em locais impróprios.
"Zunga" não é o problema
No entanto, e em entrevista à DW África, Agostinho Sicatu afirma que este fenómeno "não se pode resolver nem com decretos, nem com operações policiais". Para o politólogo, "este é um problema estrutural e social que derivou exatamente da má governação que tivemos durante muito tempo. Houve cidadãos que se apoderaram do erário público e a maioria ficou pobre, precisando de encontrar meios de subsistência".
Angola: Que futuro para as "zungueiras" de Luanda?
O jurista Albano Pedro acrescenta que a regulamentação da Lei nº 07/6, que normatiza a atividade comercial, incluindo a "zunga", e já foi aprovada há dois anos, não só vem tarde, como também não resolve o problema fundamental: a necessidade de melhorar a economia.
"Não é o momento"
"A atividade da zunga faz parte do chamado comércio desenvolvido pelas microempresas ou agentes comerciais informais, e essa atividade na nossa economia é muito importante, porque retira muita gente do desemprego, ajuda a combater a criminalidade e é hoje um dos eixos fundamentais para a tendência de se enfrentar a crise que o país vive", argumenta Albano Pedro.
Na opinião do advogado, este não é o momento mais oportuno para levar a cabo esta operação policial, porque "o país não está em boas condições de estabilidade económica".
"Estamos com grandes problemas de desemprego e não vejo como prioridade o combate a essa atividade. O que vejo como prioridade é o Estado desenvolver um conjunto de iniciativas, de modo a devolver o ambiente económico que o país precisa e proporcionar um ambiente de desenvolvimento da atividade empresarial normal", afirma.
Agostinho Sicatu também questiona: "como é que se vai deixar de vender na rua se as condições do país só favorecem ficar nas cidades capitais? Nós temos recursos humanos suficientes para poder trabalhar nas outras paragens do país, porque muita desta gente que vende nas ruas de Luanda, Malanje, Uíge, Huambo, Lubango, enfim, é exatamente por falta de descentralização administrativa do aparelho do Estado".
Angola: Os contrastes de um gigante petrolífero
O "boom" do petróleo ainda não é para todos. Ao mesmo tempo que Angola oferece oportunidades de investimento a empresas nacionais e estrangeiras, mais de um terço da população vive com menos de um dólar por dia.
Foto: DW/R. Krieger
Lama no cotidiano
O bairro Cazenga é o mais populoso de Luanda – ali, vivem mais de 400 mil pessoas numa área de 40 quilômetros quadrados. Em outubro de 2012, chuvas fortes obrigaram muitos habitantes a andar na lama. Do Cazenga saíram muitos políticos do partido governista angolano MPLA. "Uma das prioridades de políticos pobres é a riqueza rápida", diz o economista angolano Fernando Heitor.
Foto: DW/R. Krieger
Dominância do MPLA
Euricleurival Vasco, 27, votou no MPLA nas eleições gerais de agosto de 2012: "É o partido do presidente. Desde a guerra civil, ele tenta deixar o poder, mas a população não deixa". Críticos dizem que José Eduardo dos Santos não cumpriu nenhuma promessa eleitoral, como acesso à água e à eletricidade. Mas o governo lançou um plano de desenvolvimento em novembro para dar esses direitos à população.
Foto: DW/R. Krieger
Economia informal em Angola
Muitos angolanos esperam riqueza do chamado "boom" do petróleo. Mas grande parte da população é ativa na economia informal, como estas vendedoras de bolachas na capital, Luanda. Segundo a ONU, 37% da população vivem com menos de um dólar por dia. Elias Isaac, da organização de defesa dos direitos humanos Open Society, considera este um "contrassenso" entre "crescimento e desenvolvimento".
Foto: DW/R. Krieger
Uma infraestrutura de fachada?
A capital angolana Luanda é considerada uma das cidades mais caras do mundo. Um prato de sopa pode custar cerca de 10 dólares num restaurante, o aluguel de um apartamento mais de cinco mil dólares por mês. A Baía de Luanda é testemunho constante do "boom" do petróleo: guindastes e arranha-céus disputam quem é mais alto.
Foto: DW/Renate Krieger
O "Capitólio" de Angola
Próximo à Baía de Luanda, surge a nova sede do parlamento angolano. O partido governista MPLA vai ocupar a maior parte dos 220 assentos: elegeu 175 deputados em agosto de 2012. Por outro lado, o MPLA perdeu 18 assentos em comparação à eleição de 2008. A UNITA, maior partido da oposição, ganhou 32 assentos em 2012 – mas tem pouco espaço...
Foto: DW/R. Krieger
O presidente no cotidiano de Luanda
…porque, segundo críticos, o presidente José Eduardo dos Santos (numa foto da campanha eleitoral) "domina tudo": o poder Executivo, o Judiciário e o Legislativo, diz o economista Fernando Heitor. José Eduardo dos Santos também parece dominar muitas ruas de Luanda: em novembro de 2012, quase todas as imagens eram da campanha do partido no poder, o MPLA.
Foto: DW/R. Krieger
Dormir nos carros
Os engarrafamentos são frequentes em Luanda. Por isso, muitos funcionários que moram em locais mais afastados já partem para a capital angolana de madrugada. Ao chegarem em Luanda, dormem nos carros até a hora de ir trabalhar – juntamente com as crianças que precisam ir à escola. A foto foi tirada às 06:00h da manhã perto do Palácio da Justiça em novembro de 2012.
Foto: DW/R. Krieger
A riqueza em recursos naturais de Angola
Angola é o segundo maior produtor de petróleo da África, mas também tem potencial para se tornar um dos maiores exportadores de gás natural. A primeira unidade de produção de LNG – Gás Natural Liquefeito, em inglês – foi construída no Soyo, norte do país, mas ainda está em fase de testes. A fábrica tem uma capacidade de produção de 5,2 milhões de toneladas de LNG por ano.
Foto: DW/Renate Krieger
Para acabar com a dependência do petróleo...
A diversificação da economia poderia ser uma solução, diz o Fundo Monetário Internacional (FMI). O governo angolano criou um fundo soberano do petróleo para investir no país e no estrangeiro, e para ter uma reserva caso haja oscilações no preço do chamado "ouro negro". Uma alternativa, segundo especialistas, poderia ser a agricultura, já que o petróleo só deve durar mais 20 ou 30 anos.
Foto: DW/R. Krieger
Angola atrai estrangeiros
Vêem-se muitas placas em chinês e empresas chinesas em Angola. Os chineses são a maior comunidade estrangeira no país. Em seguida, vêm os portugueses, que em parte fogem à crise económica europeia. Depois, os brasileiros, por causa da proximidade cultural. Todos querem uma parte da riqueza angolana ou investem na reconstrução do país.
Foto: DW/R. Krieger
Homem X Asfalto
Para o educador Fernando Pinto Ndondi, o governo angolano deveria investir "no homem e não no asfalto". Há cinco anos, Fernando e sua famíla foram desalojados da ilha de Luanda por causa da construção de uma estrada. Agora vivem nestas casas precárias. O governo constrói novas casas para a população. Porém, os preços, a partir de 90 mil dólares, são altos demais para a maior parte dos angolanos.
Foto: DW/Renate Krieger
Para onde vai o dinheiro?
O que aconteceu com 32 mil milhões de dólares lucrados pela empresa petrolífera estatal angolana Sonangol entre 2007 e 2011? Um relatório do FMI constatou, em 2011, que faltava essa soma nos cofres públicos. A Sonangol diz ter investido o dinheiro em infraestrutura. Elias Isaac, da Open Society, diz que o governo disponibiliza mais informações – o que "não é sinônimo de transparência".