Angola, RDC e ACNUR analisam regresso de refugiados
Lusa
22 de agosto de 2019
Uma delegação tripartida reuniu-se esta quinta-feira, em Luanda, para encontrar uma "forma simplificada" de apoio aos mais de 8 mil refugiados congoleses, na província angolana da Lunda Norte, que querem regressar à RDC.
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No encontro desta quinta-feira (22.08) participaram o secretário de Estado das Relações Exteriores de Angola, Téte António, a secretária permanente da Comissão Nacional dos Refugiados da RDCongo, Bertha Zinga, e a representante regional do Alto Comissariado das Nações Unidos para os Refugiados (ACNUR) na RDCongo, Ann Encontre.
Segundo o governante angolano referiu que o encontro previsto para "há muito tempo" tem lugar depois de milhares de refugiados congoleses terem decidido, de forma voluntária, abandonar o assentamento do Lóvua, na Lunda Norte, para as suas zonas de origem.
"Pensamos que estamos entre dois cenários, o primeiro é esta situação de emergência de milhares de pessoas em direção à RDC e o outro cenário de alguns que ficaram ainda no campo", referiu Téte António.
Regresso com "dignidade e segurança"
A secretária da Comissão Nacional dos Refugiados da RDC agradeceu o apoio dado por Angola aos seus compatriotas, que em 2017 procuraram refúgio em território angolano, devido a um conflito violento no processo de sucessão da liderança na província de Kasai.
A mesma responsável revelou que a RDC pretende encontrar um processo simplificado para o repatriamento dos cidadãos que espontaneamente manifestaram o desejo de regressar ao seu país, com a perspetiva do início das aulas, fixadas para 2 de setembro.
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"Estamos muito sensíveis a esta vontade expressa para a saída voluntária dos refugiados", referiu Bertha Zinga, solicitando que fosse fixada na reunião "os acordos e modalidades práticas de acompanhamento dessas pessoas vulneráveis, afim de permitir regressarem às suas zonas de origem em condições de dignidade e segurança".
Por seu lado, a representante regional do ACNUR na RDC lembrou que a primeira vaga de refugiados começou em 2017, com um total de 35 mil refugiados de Kasai, que vivem atualmente em Angola.
"Agradecemos o vosso apoio e as medidas de proteção tomadas. Entre estes refugiados 85% deles exprimiu a vontade de regressar à RDCongo, esperando o momento do seu regresso ao seu país", salientou Ann Encontre.
Documentos e assistência do ACNUR
A representante do ACNUR manifestou a disponibilidade da organização para coordenar com os dois países o apoio no regresso espontâneo dos refugiados que já saíram de Lóvua, com a emissão de documentação, bem como assistência.
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"Também estamos prontos para trabalhar com os dois governos na organização do repatriamento dos refugiados que ainda se encontram no campo de Lóvua", frisou a Ann Encontre, sublinhando que o processo deverá garantir "toda a dignidade e segurança e a criação de condições de reintegração".
Uma nota do ACNUR indica que, no domingo passado (18.08), cerca de 5.000 refugiados começaram a abandonar o assentamento de Lóvua, numa tentativa de retorno e a caminhar em direção à RDC. "A maioria deles percorreu apenas uma curta distância e instalou-se com as suas crianças à beira da estrada ou na municipalidade de Lóvua", refere a nota.
O ACNUR realça que, desde 19 de agosto, o Governo de Angola vem providenciando camiões para transportar os refugiados até à fronteira com a RDC e, até terça-feira, 520 refugiados foram transportados até à fronteira do Tchikolondo.
De acordo com a organização das Nações Unidas, o ACNUR e parceiros estão mobilizados para apoiar através da provisão de água, saneamento (latrinas), disponibilização de uma equipa de profissionais de saúde e registo.
A delegação composta pelas partes poderá, nos próximos dias, deslocar-se à Lunda Norte para observar a situação e o resultado do regresso espontâneo dos refugiados.
Congoleses em fuga de Angola: RDC promete retaliação
Mais de 270 mil congoleses foram obrigados a abandonar Angola. Em retaliação, o ministro dos Negócios Estrangeiros congolês deu dois meses aos angolanos ilegais para abandonarem a RDC. ACNUR teme nova crise humanitária.
Foto: Reuters/G. Paravicini
Ao ritmo de 1.000 imigrantes por hora
Imigrantes congoleses chegam à localidade fronteiriça de Kamako, já do lado da República Democrática do Congo (RDC), ao ritmo de 1.000 pessoas por hora. Mais de 270 mil imigrantes ilegais congoleses foram obrigados a abandonar Angola, após um decreto do Presidente João Lourenço que visa acabar com a imigração ilegal no país, sobretudo nas regiões diamantíferas das Lundas.
Foto: Reuters/G. Paravicini
RDC promete retaliação
O Governo em Kinshasa utiliza o termo "expulsos" quando se refere aos imigrantes que Angola diz estarem a "sair de forma voluntária" do país. Como represália, o ministro dos Negócios Estrangeiros congolês definiu um prazo de dois meses para que todos os angolanos em situação irregular saiam da RDC. A tensão levou os Governos e representações diplomáticas dos dois países a iniciarem conversações.
Foto: Reuters/G. Paravicini
Detidos com documentos angolanos falsos
Em colaboração com o ACNUR e com organizações não-governamentais, as autoridades congolesas estão a vigiar a pente fino as entradas no país. Entre os cidadãos obrigados a abandonar Angola, há portadores de documentação da nação vizinha. Porém, o porta-voz da "Operação Transparência" anunciou a detenção de imigrantes com "documentos angolanos falsos" que serão julgados em Luanda.
Foto: Reuters/G. Paravicini
Congoleses dedicavam-se ao garimpo ilegal
O comandante da Polícia Nacional de Angola, António Bernardo, garante que os imigrantes que estão a abandonar o país "não se coíbem de dizer" que se deslocaram para Angola "para ganhar dinheiro na exploração ilegal de diamantes". Com o encerramento das cooperativas e casas ilegais de venda e compra de pedras preciosas, "os imigrantes decidiram voluntariamente sair do país", diz o responsável.
Foto: Reuters/G. Paravicini
ACNUR não confirma mortes
Apesar das denúncias de mortes e maus-tratos perpetrados por agentes da Polícia Nacional de Angola, no âmbito da "Operação Transparência", o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) não confirma essas informações "por falta de dados". Philippa Candler, representante do ACNUR em Angola, diz que os imigrantes estão a sair de Angola pelo próprio pé, mas sob pressão do Governo.
Foto: Omotola Akindipe
Cerca de 35 mil refugiados legais em Angola
Dados do ACNUR indicam que há 35 mil refugiados legais em Angola. Estão, sobretudo, na Lunda Norte, inseridos num assentamento em Lóvua ou distribuídos pelas povoações. No entanto, a ONU denunciou a expulsão de 50 migrantes com estatuto de refugiados. O ACNUR está a verificar a informação. A escalada do conflito tribal no Kasai levou milhares de congoleses a procurar refúgio fora de portas.
Foto: Reuters/G. Paravicini
A pé ou à boleia de motorizadas e bicicletas
Os migrantes congoleses que estão em viagem de regresso ao país de origem escolheram vários meios para fazê-lo. Alguns aceitaram a ajuda do Governo angolano que disponibilizou camiões para transportar os congoleses até à fonteira. Outros preferem fazê-lo pelo próprio pé ou socorrendo-se de bicicletas e motorizadas. Consigo carregam os seus pertences.
Foto: Reuters/G. Paravicini
De regresso às antigas rotinas
Ainda em viagem, mulheres e crianças lavam roupas nas margens do rio junto à localidade de Kamako, na província de Kasai. O objetivo é regressarem às suas povoações outrora ameaçadas ou reiniciarem uma nova vida longe da sua última morada na RDC. No entanto, a situação nesta província congolesa é instável. A falta de infraestruturas está também a preocupar as Nações Unidas.
Foto: Reuters/G. Paravicini
Nova crise humanitária iminente
A ONU expressou preocupação sobre a saída forçada de Angola nas últimas semanas de centenas de milhares de cidadãos. Para as Nações Unidas, as "expulsões em massa" são "contrárias às obrigações" da Carta Africana e, por isso, exortou os Governos em Luanda e em Kinshasa a trabalharem juntos para garantirem um "movimento populacional" seguro e evitarem uma nova crise humanitária.