Estava previsto para começar esta segunda-feira (16.09.), mas o Governo da RDC pediu para postergar. Os motivos ainda não são oficialmente conhecidos, mas o ACNUR acredita que têm a ver com questões organizativas.
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Os refugiados da RDC, República Democrática do Congo, estão em Angola em busca de segurança. É que várias regiões do país são palco de confrontos armados. Mas em alguns lugares a situação começa a mudar, mesmo que não se saiba por quanto tempo. Sobre o assunto a DW África entrevistou a chefe das relações exteriores do ACNUR, uma das partes envolvidas no processo de repatriamento:
DW África: Como será feito o repatriamento desta vez?
Juliana Ghazi (JG): O repatriamento organizado foi aprovado durante a reunião tripartida, entre Angola, RDC e o ACNUR. A data inicial do primeiro comboio do repatriamento organizado seria amanhá, dia 17, no entanto recebemos um pedido no final de semana do Governo da RDC para que adiássemos por mais alguns dias e então foi adiado para a próxima semana. Na verdade ainda não temos a confirmação dos motivos que originaram o pedido deles, partilharam informalmente connosco que pediram uma semana para que acertem algumas condições para receberem os refugiados.
DW África: Então, do outro lado ainda não há as condições necessárias para receber os congoleses?
JG: Em termos de segurança sabemos que o conflito no Kasai cessou, por isso é que os refugiados se sentiram mais seguros para regressarem, mas as condições para o repatriamento voluntário, como os centros de trânsito e tudo o que precisa de ser feito e aprovado pelos colegas da RDC, o Governo do Congo prepararam todas as condições para que fosse iniciado o repatriamento esta semana. Então, não é que as condições não estejam prontas, mas uma parte do Governo prefere alguns dias a mais para que tudo esteja acertado do lado do Governo para receber esses refugiados.
Angola: Repatriamento de congoleses adiado
DW África: Entretanto, algumas regiões da RDC continuam a ser inseguras. Não há o risco dos congoleses retornarem a Angola?
JG: O risco sempre existe porque, de facto, algumas partes são inseguras e não temos como prever. O que temos a dizer é que estamos a preparar as condições para voltarem em segurança, dando a documentação necessária para retornem em segurança e que sejam desativados da nossa base de dados daqui. Agora, de facto, algumas regiões têm apresentado alguns conflitos e não temos como garantir que alguns deles não queiram retornar. Mas assim que acontecer vamos lidar com isso de acordo com a lei da melhor maneira possível, mas sim, existem chances deles retornarem.
DW África: Há cerca de uma semana perto de 8000 refugiados do assentamento do Lóvua decidiram marchar com destino ao seu país porque as aulas começaram a 2 de setembro. Como é que o ACNUR está a gerir este caso?
JG: Os refugiado que regressaram espontaneamente, a meio do caminho receberam assistência do Governo de Angola que mandou camiões para que retornassem ao Congo. Na verdade 8 mil é o número que tínhamos semanas atrás, mas esses números já subiram. Os números que o Governo de Angola dá-nos, não os nossos números do ACNUR, indicam que pouco mais do que 14 mil refugiados teriam regressado de forma espontânea e já estão no Congo. Uns estão ainda na fronteira a espera do transporte da RDC para os levar as suas vilas de origem. Nós estamos a acompanhar a situação, mas ele já são pessoas do interesse do lado da RDC e não mais do lado de Angola. O que estamos aqui a fazer é criar as condições para os refugiados que ainda estão aqui e que querem volta de forma organizada, da maneira mais segura e da melhor maneira possível para eles.
Congoleses em fuga de Angola: RDC promete retaliação
Mais de 270 mil congoleses foram obrigados a abandonar Angola. Em retaliação, o ministro dos Negócios Estrangeiros congolês deu dois meses aos angolanos ilegais para abandonarem a RDC. ACNUR teme nova crise humanitária.
Foto: Reuters/G. Paravicini
Ao ritmo de 1.000 imigrantes por hora
Imigrantes congoleses chegam à localidade fronteiriça de Kamako, já do lado da República Democrática do Congo (RDC), ao ritmo de 1.000 pessoas por hora. Mais de 270 mil imigrantes ilegais congoleses foram obrigados a abandonar Angola, após um decreto do Presidente João Lourenço que visa acabar com a imigração ilegal no país, sobretudo nas regiões diamantíferas das Lundas.
Foto: Reuters/G. Paravicini
RDC promete retaliação
O Governo em Kinshasa utiliza o termo "expulsos" quando se refere aos imigrantes que Angola diz estarem a "sair de forma voluntária" do país. Como represália, o ministro dos Negócios Estrangeiros congolês definiu um prazo de dois meses para que todos os angolanos em situação irregular saiam da RDC. A tensão levou os Governos e representações diplomáticas dos dois países a iniciarem conversações.
Foto: Reuters/G. Paravicini
Detidos com documentos angolanos falsos
Em colaboração com o ACNUR e com organizações não-governamentais, as autoridades congolesas estão a vigiar a pente fino as entradas no país. Entre os cidadãos obrigados a abandonar Angola, há portadores de documentação da nação vizinha. Porém, o porta-voz da "Operação Transparência" anunciou a detenção de imigrantes com "documentos angolanos falsos" que serão julgados em Luanda.
Foto: Reuters/G. Paravicini
Congoleses dedicavam-se ao garimpo ilegal
O comandante da Polícia Nacional de Angola, António Bernardo, garante que os imigrantes que estão a abandonar o país "não se coíbem de dizer" que se deslocaram para Angola "para ganhar dinheiro na exploração ilegal de diamantes". Com o encerramento das cooperativas e casas ilegais de venda e compra de pedras preciosas, "os imigrantes decidiram voluntariamente sair do país", diz o responsável.
Foto: Reuters/G. Paravicini
ACNUR não confirma mortes
Apesar das denúncias de mortes e maus-tratos perpetrados por agentes da Polícia Nacional de Angola, no âmbito da "Operação Transparência", o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) não confirma essas informações "por falta de dados". Philippa Candler, representante do ACNUR em Angola, diz que os imigrantes estão a sair de Angola pelo próprio pé, mas sob pressão do Governo.
Foto: Omotola Akindipe
Cerca de 35 mil refugiados legais em Angola
Dados do ACNUR indicam que há 35 mil refugiados legais em Angola. Estão, sobretudo, na Lunda Norte, inseridos num assentamento em Lóvua ou distribuídos pelas povoações. No entanto, a ONU denunciou a expulsão de 50 migrantes com estatuto de refugiados. O ACNUR está a verificar a informação. A escalada do conflito tribal no Kasai levou milhares de congoleses a procurar refúgio fora de portas.
Foto: Reuters/G. Paravicini
A pé ou à boleia de motorizadas e bicicletas
Os migrantes congoleses que estão em viagem de regresso ao país de origem escolheram vários meios para fazê-lo. Alguns aceitaram a ajuda do Governo angolano que disponibilizou camiões para transportar os congoleses até à fonteira. Outros preferem fazê-lo pelo próprio pé ou socorrendo-se de bicicletas e motorizadas. Consigo carregam os seus pertences.
Foto: Reuters/G. Paravicini
De regresso às antigas rotinas
Ainda em viagem, mulheres e crianças lavam roupas nas margens do rio junto à localidade de Kamako, na província de Kasai. O objetivo é regressarem às suas povoações outrora ameaçadas ou reiniciarem uma nova vida longe da sua última morada na RDC. No entanto, a situação nesta província congolesa é instável. A falta de infraestruturas está também a preocupar as Nações Unidas.
Foto: Reuters/G. Paravicini
Nova crise humanitária iminente
A ONU expressou preocupação sobre a saída forçada de Angola nas últimas semanas de centenas de milhares de cidadãos. Para as Nações Unidas, as "expulsões em massa" são "contrárias às obrigações" da Carta Africana e, por isso, exortou os Governos em Luanda e em Kinshasa a trabalharem juntos para garantirem um "movimento populacional" seguro e evitarem uma nova crise humanitária.