Uma manifestação de um grupo de moradores do bairro Boa Esperança, no município de Cacuaco, arredores de Luanda, culminou na morte de dois jovens após a intervenção policial. A esquadra da polícia foi vandalizada.
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Os populares do bairro Boa Esperança, no município angolano de Cacuaco, afirmam esta segunda-feira (29.03) que viveram momentos de terror na noite de domingo (28.03), quando protestavam contra uma ação policial, que resultou na morte de dois jovens. A polícia nega as acusações e diz que agiu em legítima defesa.
Para além das duas vítimas mortais, várias pessoas ficaram feridas, outras detidas e a esquadra da polícia foi vandalizada.
E tudo terá começado quando alguns moradores capturaram e decidiram levar ao posto policial, um jovem que terá furtado uma peruca da cabeça de uma mulher que se fazia transportar numa motorizada. A situação é recorrente no Bairro Esperança, caracterizado pelo elevado número de ocorrências policiais.
Segundo o relato do porta-voz da polícia de Luanda, Nestor Goubel, alguns munícipes pretendiam linchar o suposto marginal, o que resultou numa confusão diante da esquadra policial.
"Um deles atirou uma pedra contra o nosso agente de serviço, que foi atingido na cabeça. E como não se importava com o agente ferido, só queria forçar a entrada na esquadra, o agente apontou arma ao chão e disparou. Esse disparo fez ricochete e atingiu mortalmente um deles", disse o porta-voz do Comando Provincial de Luanda da Polícia Nacional.
Dois mortos e versões conflitantes
A polícia informa que há uma dezena de detidos que serão apresentados ao Ministério Público. Goubel disse que está a ser um hábito em Luanda as pessoas fazerem justiça por mãos próprias e confirmou a morte de duas pessoas na sequência dos confrontos.
"Uma foi o caso do incidente aqui na esquadra. Quando o nosso reforço chegou, eles começaram a dispersar a população. Um deles [dos manifestantes], ao atravessar a estrada, foi atropelado mortalmente. Foi o que aconteceu. Temos a lamentar esta postura reprovável de alguns populares".
À DW África, os moradores apresentaram uma versão diferente da polícia nacional. Os munícipes acusam as autoridades policiais de terem disparados à queima roupa contra os moradores no interior do bairro. O tiro teria resultado na morte do jovem Pedro Manuel conhecido por "M Stop".
"O próprio gatuno da peruca, que foi levado à polícia, fugiu. O polícia apertou no gatilho e atingiu o inocente que perdeu a vida no mesmo instante, à porta da esquadra. Quando viram que ele morreu, o povo se revoltou e a polícia voltou a disparar e causou a morte de outro miúdo. Assim, mataram duas pessoas. Não houve atropelamento. A polícia é quem os matou", disse à DW África uma das moradoras.
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Responsabilização pela violência policial
Pedro Neto foi um dos feridos no incidente. O jovem, que foi baleado no ombro, diz que a ação policial parecia ser de guerra.
"Aquilo praticamente foi guerra. Esse ferimento foi de um tiro de pistola. A bala entrou e ficou no corpo. E na mesma noite os meus amigos levaram-me ao hospital para retirarem a bala do meu corpo. Eu fui atingido quando fugia da confusão", explica Neto.
No interior do bairro, há vestígios de balas reais e de bombas de gás lacrimogéneo disparadas pela Polícia Nacional. Paulo Luamba, tio de uma das vítimas mortais, exige que a justiça seja feita, pela morte do seu sobrinho.
"Visto que ninguém pode pagar a vida do outro, mas têm de indemnizar. Porque existem leis para isso. Se o autor não aparecer, o comandante e a unidade que assumam as responsabilidades", disse.
Moradores de Luanda convivem com lixo e mau cheiro nas ruas
A época das chuvas começou e a água espalha os resíduos acumulados nas ruas para todos os cantos da capital angolana. O lixo a céu aberto aumenta o risco de paludismo, a principal causa de morte em Angola.
Foto: Manuel Luamba/DW
Cidadãos deitam lixo fora logo pela manhã
Logo pela manhã, cidadãos deitam resíduos sólidos em contentores. A expectativa desses moradores é de que as operadoras de recolha do lixo façam o seu serviço durante o dia ou à noite. O que acontece, entretanto, é que o dia seguinte chega e o lixo permanece intato nos contentores ou no chão. Fala-se em dívidas de milhões de kwanzas que o Governo Provincial de Luanda teria com as empresas.
Foto: Manuel Luamba/DW
Lixo transborda nos contentores
Os poucos contentores existentes nas ruas de Luanda - quer sejam na periferia, quer sejam na cidade - estão totalmente abarrotados de lixo. Por falta de espaço, os resíduos sólidos caem no chão.
Foto: Manuel Luamba/DW
Aproveitam-se das "montanhas de lixo"
Nem todas ruas de Luanda têm contentores para o depósito de lixo. Muitos cidadãos colocam-no no chão. Algumas pessoas aproveitam-se da existência do lixo como uma espécie de esconderijo para fazer as suas necessidades. É muito comum flagrar alguns citadinos a urinar atrás das "montanhas de lixo".
Foto: Manuel Luamba/DW
Zonas privilegiadas
Há zonas onde existe uma recolha tímida de lixo. Consequentemente, os contentores destas áreas encontram-se vazios. A DW África constatou isso no Bairro Popular, junto ao famoso Hospital da Fé. Aparentemente as autoridades precisam investir mais para ampliar significativamente a recolha a fim de beneficiar toda a capital, não somente algumas poucas zonas.
Foto: Manuel Luamba/DW
Um risco para a saúde pública
O lixo visto por todos os cantos poderá se transformar num problema de saúde pública. As chuvas já começaram a cair e algumas doenças já estão cada vez mais presentes. O paludismo, por exemplo, é a maior causa de morte em Angola e o número de casos desta doença poderá aumentar em consequência do lixo nas ruas. A chuva gera pequenos charcos de água em locais onde há lixo.
Foto: Manuel Luamba/DW
Um atentado ao meio ambiente
A inexistência ou escassez de recolha de lixo tem levado os cidadãos a uma velha prática: a queima do lixo. Ao incinerar os resíduos, o fumo acaba por se tornar nocivo à saúde e faz com que o ambiente à volta seja insuportável para alguns transeuntes. Apesar de não ser em grande quantidade, a queima de lixo não deixa de ser um atentado ao meio ambiente.
Foto: Manuel Luamba/DW
Até nas valas de drenagem
O lixo em Luanda não escolhe o local. Até nas poucas valas de drenagem que a capital angolana tem há resíduos sólidos. A vala do Kariango - que sai do município do Cazenga em direção à cidade - é um exemplo disso. O lixo acaba por obstruir o escoamento da água, o que pode provocar inundações nas ruas.
Foto: Manuel Luamba/DW
O "Senado da Câmara"
O "Senado da Câmara" é umas das maiores valas de drenagem à céu aberto de Luanda. O curso de água também é extremamente afetado pelos resíduos sólidos, que impedem o fluxo normal de água. A acumulação de poluentes neste local acaba por intoxicar o ambiente e colocar em causa a saúde pública.
Foto: Manuel Luamba/DW
Meio de sobrevivência
Se para alguns os amontoados de lixo constituem um risco para a saúde pública, para outros é um meio de sobrevivência. Idosos e jovens encontram no lixo comida, bidões e objetos para comercialização. É um sinal de que resíduos deitados nas ruas podem beneficiar as pessoas em projetos cuidadosos de reciclagem e de aproveitamento de comida. Mas aqui o lixo ainda não está relacionado à economia.