Angola: Setor da saúde pede intervenção de João Lourenço
Lusa
8 de junho de 2021
Profissionais de saúde apelam ao PR para "travar" a escassez de materiais, medicamentos e de recursos humanos nas unidades sanitárias do país. Situação é mais crítica em Luanda, onde há mortes nos bancos das urgências.
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Segundo profissionais ouvidos esta terça-feira (08.06) pela agência de notícias Lusa, o sistema de saúde primário, sobretudo na capital angolana, "colapsou" e as unidades hospitalares estão a registar em "média entre seis e dez mortes" associadas à malária e anemia.
"Com todas as observações que temos feito não observamos melhorias nem de medicamentos, nem de recursos humanos e meios e o que me admira é o silêncio do Presidente da República, João Lourenço, em relação a isso", afirmou hoje o presidente do Sindicato Nacional dos Médicos de Angola (Sinmea), Adriano Manuel.
Para o médico Adriano Manuel, "é necessário que os altos dirigentes do país, sobretudo o Presidente da República, façam visitas surpresa aos hospitais públicos para observarem o que se passa verdadeiramente e quais as repercussões".
Malária
O lixo e as águas paradas, de esgotos a céu aberto e das últimas chuvas, referiu o dirigente sindical, "influenciam negativamente" o quadro sanitário de Luanda verificando-se um "elevado quadro de malária nos bancos das urgências", notou.
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"Estamos num quadro em que grande parte das crianças padecem de má nutrição crónica, por um lado, e de anemia crónica também, e quando a malária acomete esses pacientes encontra uma certa vulnerabilidade e daí surgem as mortes", disse.
Ao quadro de malária associam-se as anemias e insuficiências dos 'stocks' do banco de sangue. "Daí que muitas crianças que acorrem aos nossos hospitais morrem de malária", lamentou Adriano Manuel, em entrevista à Lusa.
O presidente do Sinmea estimou igualmente que, em média, o índice de mortalidade por malária nas unidades hospitalares "varia entre 06 e 10 mortes por dia, embora existam hospitais que tenham um nível superior e atingem mais de 18 mortes de crianças".
"Isso acontece porque os níveis secundários e primários não têm recursos humanos e medicamentos e, então, as pessoas acorrem aos hospitais terciários por falta de condições para a aquisição de medicamentos", sublinhou.
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Desgaste dos profissionais
Apontou ainda "um visível desgaste físico geral de médicos, enfermeiros e demais técnicos de saúde, em consequência da demanda de pacientes", o que também influencia, frisou, "o índice de mortalidade".
Porque, explicou o médico, "não se pode compreender como é que um médico sozinho num banco de urgência observa uma média de 150 doentes".
"É um cansaço terrível e infelizmente o Governo faz ouvidos de mercador", comentou.
O cenário de enchentes nas unidades hospitalares, a partir do nível primário, foi também relatado pelo secretário-geral do Sindicato de Técnicos de Enfermagem de Luanda, Afonso Kileba, afirmando que a procura dos doentes "contrasta com a escassez de técnicos de saúde".
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Hospitais sobrelotados
"Os hospitais estão muito cheios, centros de saúde muito cheios, principalmente do nível primário, onde está a maior parte da população e é o nível que está desfalcado em termos de técnicos", disse hoje Afonso Kileba.
Em declarações à Lusa, o responsável sindical e especialista em enfermagem lamentou também a "inexistência" de materiais descartáveis nas unidades sanitárias, referindo existir uma "redução de abastecimento do material gastável" nos hospitais de Luanda.
"Há hospitais a que estão a ser atribuídas cinco ampolas de dipirona [fármaco para a febre] para um mês, de tal maneira que agrava também o quadro de mortes, devido à ausência de uma resposta capaz", indicou.
Quanto a condições de trabalho, "já nem se fala, não existe alimentação ou condições de acomodação dos técnicos", atirou ainda Afonso Kileba.
Os médicos cubanos no mundo
Os profissionais de saúde cubanos saíram do Brasil, mas ainda trabalham em mais de 60 países do mundo, entre eles todos os países africanos de língua oficial portuguesa. Conheça aqui as missões mais importantes.
Foto: picture-alliance/dpa/W. Kenji
Cuba deixa o Brasil e o programa "Mais Médicos"
Depois de cinco anos de parceria entre Cuba e o Brasil, o governo cubano decidiu retirar os seus médicos do Brasil em finais de 2018. A decisão foi tomada devido às alterações nos termos de cooperação sugeridas pelo Presidente eleito do Brasil, Jair Bolsonaro. Más os médicos cubanos ainda trabalham em mais de 60 países no mundo.
Foto: Agência Brasil/José Cruz
Em Angola: a sanar e a ensinar
A cooperação entre Cuba e Angola começou em 1975, logo após a independência angolana. Os médicos cubanos em Angola ajudam a combater doenças, mas nas faculdades de medicina professores cubanos têm um papel importante na formação de pessoal de saúde. Em 2015, segundo o Governo angolano, 42% dos médicos no país eram cubanos. Mas muitos deixaram Angola após a quebra das receitas de petróleo.
Foto: Reuters/S. Eisenhammer
Tempestade tropical em Honduras
Uma médica cubana vacina uma criança hondurenha. Em 1998, o furacão Mitch passou pela América Central, causando a morte de 11.000 pessoas. Somente em Honduras foram 7.000 vítimas do que é considerado o furacão mais mortífero que jamais passou pela região.
Foto: picture-alliance/dpa
Furacão Katrina nos Estados Unidos da América
Em 2005, o furacão Katrina passou pela região litoral do sul dos EUA e atingiu principalmente a região metropolitana de Nova Orleães. 1.500 médicos cubanos reuniram-se em Havana para preparar-se para uma missão humanitária, mas a oferta foi rejeitada pelo governo norte-americano. O furacão causou mais de 1.800 mortes e mais de um milhão de pessoas tiveram que ser evacuadas.
Foto: picture-alliance/dpa
Terramoto no Paquistão
No ano de 2005, um terramoto matou 86.000 pessoas na Caxemira, uma região no norte do Paquistão. Cerca de 3,5 milhões de pessoas ficaram sem casa. Os médicos cubanos ajudaram os danificados.
Foto: picture-alliance/dpa/P. Hattori
Surto de cólera no Haiti
Em 2010, aproximadamente 200.000 pessoas no Haiti infectaram-se com cólera, segundo as Nações Unidas. A cólera é uma infecção do intestino que se transmite facilmente através de água sem tratamento para o uso humano. Tal como aconteceu no Haiti, um país que em janeiro de 2010 sofreu terramoto. Também ali não faltaram os médicos cubanos.
Foto: picture-alliance/dpa
Surto de ébola na África Ocidental
Em 2014, quando o surto de ébola ameaçava muitas zonas da África Ocidental, os médicos cubanos também não ficaram de braços cruzados. Aqui vemos à enfermeira Dalila Martinez, treinadora da equipa médica cubana em Havana para a missão na Serra Leoa. Desde que começou em 2013 o surto, a ébola matou cerca de 27.000 pessoas na África Ocidental e no mundo, a maioria delas na Libéria e na Serra Leoa.
Durante a missão humanitária na Serra Leoa em 2014, um dos médicos cubanos foi infectado com ébola. O doutor Félix Baez Sarria foi transportado para um hospital na Suiça e sobreviveu. Depois voltou à Serra Leoa para continuar a combater o surto de ébola.
Foto: picture-alliance/AP Photo/Julien Gregorio, Geneva University Hospital
Mais médicos ou menos médicos?
Em 2018, um cartaz na entrada dum ambulatório em Itaquaquecetuba no estado de São Paulo, Região Sudeste do Brasil, avisa que o programa "Mais Médicos" foi encerrado. Os mais de 8.300 profissionais de saúde cubanos que trabalhavam no Brasil já regressaram a ilha de Cuba.