Empresa Nacional de Pontes, em Angola, não paga salários aos seus trabalhadores há mais de quatro anos. Acordo concluído entre Ministério da Construção e empresa chinesa não foi respeitado.
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Persistem as "makas” do pagamento dos salários em atraso na Empresa Nacional de Pontes (ENP), em Angola. Há "fome” e "miséria” no seio das famílias de vários dos técnicos da ENP ouvidos pela DW África. Muitos trabalhadores deixaram de poder sustentar os seus familiares.
E a divulgação de uma lista de quadros que poderão ser demitidos só veio piorar a "dor de cabeça” dos chefes de família que há vários meses não têm dinheiro nas suas contas bancárias.
Em fevereiro deste ano, o diretor de Comunicação Institucional e Imprensa do Ministério da Construção e Obras Públicas, Samir Kitumba, em declarações ao diário estatal Jornal de Angola, disse que já havia solução para a questão dos atrasos salariais na Empresa Nacional de Pontes (ENP). O dirigente apontou a contratação de uma entidade privada chinesa que iria encarregar-se do relançamento da instituição. Mas, de lá para cá, "nem água vai e nem água vem”, dizem os trabalhadores.
Cartas enviadas mas sem resposta
Várias cartas foram endereçadas à Casa Civil do Presidente da República, Assembleia Nacional, ao gabinete da Presidência da República e ao próprio Ministério da Construção e Obras Públicas. Nenhuma delas teve resposta, de acordo com os funcionários.O secretário do sindicato dos trabalhadores da Empresa Nacional de Pontes, Mateus Alberto Muanza, afirma que na lista dos trabalhadores à beira do desemprego, divulgada pela administração da empresa, está o grosso dos sindicalistas:
"Em abril deste ano, numa reunião convocada pelo diretor-geral da empresa, que chamou três membros da comissão sindical, apresentou uma relação nominal de 82 trabalhadores suspensos. A mesma suspensão tinha o prazo de seis meses. Na referida lista consta toda comissão sindical e cerca de 16 trabalhadores doentes há mais dez anos, na sua maioria com doenças crónicas”, disse a esta emissora o sindicalista angolano.
Alberto Muanza sublinha que ninguém pode ser colocado no desemprego sem indemnização.
"Os trabalhadores têm com a empresa um contrato de indeterminado. A Empresa Nacional de Pontes é uma empresa pública. Por isso, a direção não pode de forma nenhuma suspender a comissão sindical. Esta suspensão surge para acabar com a comissão sindical”.
Pagamento dos salários em atraso
O que os técnicos desta empresa angolana pretendem neste momento é o pagamento da dívida de mais de 55 meses de salários em atraso.Gabriel Magalhães é um dos trabalhadores em risco de perder o emprego:
"Nós comemos, mas não nos alimentamos. Se a esposa não vender, as crianças vão passar fome.Tenho dívidas de propinas dos miúdos por pagar. Chutaram os meus filhos da escola por causa das propinas e não tenho como pagar. Por conta disso, já não somos respeitados dentro de casa”.
A dívida é um problema que continua a perseguir os mais de 400 funcionários da ENP, diz Mateus Muanza:
"Há duas semanas, o meu filho teve febre. Fui a uma farmácia buscar uma embalagem de comprimidos e que até agora não consigo pagar os dois mil kwanzas (7,10€) do medicamento. Até agora, a senhora bate à minha porta para eu fazer a devolução do dinheiro. Já solicitei aos meus amigos e familiares, ninguém quer emprestar-me o valor porque sabem que não tenho como pagar”.
55 meses a espera do salário: trabalhadores ENP
Dívida ultrapassa os 44 meses, confirma a ENP
A DW contactou o diretor-geral da Empresa Nacional de Pontes, José Henrique, que recusou gravar a entrevista, mas confirmou a existência de salários em atraso. José Henrique nega, no entanto, que sejam 55 os meses de ordenados em falta, sublinhando que a dívida não ultrapassa os 40 meses.
Ainda segundo o diretor da ENP, a falta de obras e a dívida que o Governo tem com a empresa são as principais causas das dificuldades que afetam os trabalhadores.
O pouco dinheiro que a empresa consegue através de pequenos contratos, diz o gestor da ENP, tem sido utilizado para apoiar algumas emergências dos funcionários.
Quanto à suspensão de 80 trabalhadores, José Henrique justifica a decisão com a falta de tarefas para os colaboradores dentro da empresa. E frisa que o objetivo "não é desempregar os funcionários”.
De acordo com o diretor-geral desta empresa angolana, ainda não há nenhum acordo com o consórcio chinês, mas "as negociações estão a bom ritmo".
Entretanto, a empresa precisa de cerca de dez milhões de dólares para pagar os salários em atraso e a segurança social dos trabalhadores.
China em África: maldição ou benção?
A China quer mudar a sua imagem: de país explorador das matérias-primas africanas, para agente de desenvolvimento. Fazemos uma viagem pela história das relações sino-africanas.
Foto: AFP/Getty Images
Parceiros igualitários?
A China leva estradas asfaltadas, grandes estádios de futebol e internet de banda larga para África. Ao mesmo tempo, pede ao continente petróleo e outras matéria-primas. A China já é o maior parceiro comercial de África. Até 2020, o país pretende duplicar o volume de negócios para 400 mil milhões de dólares. Os críticos temem que haja apenas um vencedor nestes negócios: a China.
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TAZARA: o primeiro grande projeto
A cooperação sino-africana começou nos anos 50 e 60. Como sinal da fraternidade socialista, a China financiou a construção de uma linha ferroviária que transportava o cobre da Zâmbia para a cidade portuária da Tanzânia, Dar es Salaam. O projeto baseava-se na amizade inter-étnica e no trabalho solidário. A ferrovia chamda TAZARA " Tanzania-Zambia Railway" funciona até aos dias de hoje.
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Chegaram para fazer negócios
Com a estratégia "Go Global", na década de 90, o Governo chinês muda a sua política para África, começando a apoiar empresas do próprio país a fazerem negócios com o continente. O objetivo: proteger os recursos naturais estratégicos e promover o desenvolvimento económico da China. Ou seja, ter África como um parceiro de negócios e mercado para os bens de consumo chineses.
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Críticas do Ocidente
Com a nova política, a China garante para si campos de petróleo e as minas de metais preciosos, não tendo medo de trabalhar com regimes autoritários e corruptos. O país não é bem visto na Europa e nos Estados Unidos. A China só estaria interessada na exploração de recursos naturais, mas não no bem das pessoas, é a crítica do Ocidente.
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Infraestruturas como moeda de troca
A China também faz negócios com o Presidente do Sudão, Omar al-Bashir, procurado pelo Tribunal Penal Internacional por genocídio. O país está a tornar-se o mais importante investidor na indústria de petróleo sudanês. Além disso, a empresa chinesa de petróleo estatal financia a construção da barragem de Merowe, no norte do Sudão.
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Oferta de 150 milhões de euros à União Africana
As boas relações com a África são bem pagas pela China. Em 2012, o país financiou a construção da sede da União Africana, em Adis Abeba. "A China vai ajudar os países africanos a ampliar a sua força e independência", disse o chefe da delegação chinesa na cerimónia de abertura.
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Líder do mercado de telecomunicações
Duas empresas chinesas dominam o mercado africano de telecomunicações: a ZTE e a Huawei. Foi a essas empresas que Governos de todo o continente fizeram as suas grandes encomendas. Na Etiópia, a Huawei e a ZTE constroem uma rede de 3G para todo o país por 1,7 mil milhões de dólares. Na Tanzânia, empresas chinesas instalaram cerca de 10 mil quilómetros de cabos de fibra ótica.
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Concorrentes desagradáveis
As esperanças de melhores oportunidades em África não atraem apenas as grandes empresas, mas também milhares de cidadãos comuns chineses . Eles abrem pequenas lojas onde vendem produtos chineses baratos: utensílios de cozinha, jóias, dispositivos elétricos. "Muitos comerciantes africanos não estão satisfeitos com a nova concorrência", diz o economista queniano David Owiro.
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À espera de novos postos de trabalho
Seja no comércio de retalho ou na construção de estradas "os africanos raramente lucram com investimentos chineses. As empresas trazem os seus próprios trabalhadores", diz Owiro. Agora, na África do Sul, onde a China acaba de inaugurar uma fábrica de camiões, isso pode mudar. O Governo sul-africano elogia o projeto como um marco para a industrialização africana e espera novos postos de trabalho.
Foto: Imago
De exportador a agente de desenvolvimento?
O primeiro-ministro chinês, Li Keqiang, ofereceu dois mil milhões de dólares para um fundo de desenvolvimento para África durante a sua visita ao primeiro-ministro da Etiópia, Hailemariam Desalegn, em maio de 2014. A liderança chinesa quer abrir um novo capítulo nas relações China-África, passando de país explorador das matérias-primas para agente de um desenvolvimento sustentável.
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Medo pela reputação
"A China teme pela sua reputação no mundo", diz Sun Yun do centro de pesquisa norte-americano "Brookings". As alegações nos média de que a China só estaria interessada nas matérias-primas de África levaram a esta mudança. O Governo publicou recentemente uma lista dos programas de ajuda ao desenvolvimento, que inclui 30 hospitais, 150 escolas, 105 projetos de energia e água renováveis.
Foto: AFP/Getty Images
O charme chinês
Para promover a sua missão em África, a China lançou uma grande campanha mediática. Os meios de comunicação do Governo para o estrangeiro focam claramente os negócios, África é retratada como o continente próspero. Algo que contrasta com décadas de cobertura negativa dos meios de comunicação ocidentais.