Familiares de pacientes acomodados junto à morgue e aterro
José Adalberto (Huambo)
5 de dezembro de 2018
A zona indicada pela direção do hospital para a acomodação dos acompanhantes fica perto da morgue. E nesse local também é depositado e queimado o lixo hospitalar. O PRS acusa as autoridades de falta de humanismo.
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Maria de Fátima chegou do Longonjo, um dos nove municípios do Huambo, para acompanhar a filha, que está a recuperar de uma operação. E não vê a hora de a filha ter alta hospitalar. Maria de Fátima já não aguenta ter de passar as noites ao relento junto à morgue e à lixeira, no local que serve igualmente de cozinha improvisada.
"Colocaram-nos aqui porque não há espaço onde podemos ficar. Passamos as noites aqui todos os dias. Sentimos o perigo que a morgue representa, mas não temos outro locar onde possamos ficar", lamenta Maria de Fátima.
Os familiares dos pacientes chegam dos nove municípios do Huambo e das províncias vizinhas do Bié, Kwanza Sul e Benguela. Estão descontentes com a direção do Hospital do Huambo, um dos maiores do sul do país, que os pôs a pernoitar ao relento num local sem as mínimas condições de higiene, muito perto da morgue e onde se deposita e queima o lixo hospitalar.
Familiares de pacientes acomodados junto à morgue e aterro
Silvério Numa veio do município do Bailundo, para acompanhar a sobrinha. Está na zona de acomodação ao ar livre há mais de duas semanas. O cheiro é nauseabundo. E também não há casas de banho.
E ele conta: "Estamos a sofrer com a chuva e aqui é próximo da casa mortuária. E com a chuva não temos onde passar as noites, para além do lixo do hospital que pode nos trazer doenças. Aqui não há casas de banho para fazermos as necessidades fisiológicas."
PRS denuncia
A situação no Hospital do Huambo foi denunciada pelo secretário provincial do Partido de Renovação Social (PRS), António Soliya Selende, que considera deploráveis e desumanas as condições de alojamento dos familiares dos pacientes.
"Infelizmente, passam as noites ao relento, debaixo dos eucaliptos, ali próximo à morgue e também do aterro sanitário, e quando cai a chuva, têm que correr daqui e acolá, para encontrarem pelo menos uma varanda, a segurança do hospital não dá conta para se albergaram", confirma o secretário provincial do PRS.
E ainda segundo António Soliya, o partido solicitou encontros de trabalho com o gabinete provincial da Saúde e a direção do Hospital Geral do Huambo.
Mas as explicações dadas pela direção da unidade hospitalar não convenceram o PRS. E Soliya diz: "Nós pedimos uma audiência com o diretor provincial da saúde e com a diretora do Hospital Geral do Huambo, mas infelizmente a Direção da Saúde não nos atendeu. Apenas o diretor do hospital recebeu-nos, mas a justificação que nos deu é que ele, não se preocupa com os acompanhantes dos doentes, apenas os doentes."
A DW África tentou várias vezes contactar a direção do Hospital Geral do Huambo, mas ninguém aceitou comentar o assunto.
Friedensdorf em Angola
A Friedensdorf começou a viajar até Luanda há duas décadas para recolher crianças doentes para tratamento médico na Alemanha e levar de volta outras já recuperadas. A 56ª ação de ajuda aconteceu em 2014.
Foto: DW/M. Sampaio
20 anos de ajuda a crianças doentes
Já passaram duas décadas desde que a Friedensdorf International começou a viajar até Luanda para recolher crianças doentes para tratamento médico na Alemanha e levar de volta outras já recuperadas. Desde a sua criação, há 47 anos, a organização não-governamental já ajudou crianças doentes de mais de 50 países, incluindo cerca de 3 mil crianças angolanas. Em 2014, aconteceu a 56ª ação de ajuda.
Foto: DW/M. Sampaio
Ritmos angolanos na despedida
Kuduro e outras danças angolanas são uma constante na festa de despedida que a Friedensdorf organiza na sua sede em Oberhausen, no centro-leste da Alemanha, antes da partida para Angola das crianças já recuperadas. Depois de várias operações e tratamentos, as crianças estão ansiosas por voltar à terra natal e rever a família. Mas os amigos que fizeram na Alemanha também vão deixar saudades.
Foto: DW/M. Sampaio
Experiência única
Para casa as crianças levam também uma experiência única, afirma Hannah Lohmann, porta-voz da Friedensdorf. “Neste momento, temos connosco meninos e meninas de nove países. São cristãos e muçulmanos, brancos e negros, africanos e asiáticos. Em comum têm o facto de todos terem vindo para a Alemanha para se curarem e isso cria uma ligação entre eles, que ultrapassa fronteiras e idiomas”, explica.
Foto: DW/M. Sampaio
Regresso azul
Quando regressa, cada criança recebe um saco azul de desporto, onde, além de roupa e medicamentos, cabem pequenos presentes que elas mesmas fizeram para a família e lembranças da estadia na Alemanha – brinquedos em madeira ou saquinhos de pano feitos à mão, por exemplo. Partem do Aeroporto de Düsseldorf, num avião fretado pela Friedensdorf. A bordo segue uma equipa da ONG, que inclui um médico.
Foto: DW/M. Sampaio
Luanda à vista
Depois de quase dez horas de voo, o avião aterra finalmente na capital angolana. À espera no Aeroporto Internacional 4 de Fevereiro, em Luanda, costumam estar dois membros da ONG alemã, que viajam mais cedo para o país para tratar das formalidades da nova leva de doentes, e uma equipa da organização parceira angolana Kimbo Liombembwa, versão kimbundu da "Aldeia da Paz".
Foto: DW/M. Sampaio
Reencontro familiar
Do aeroporto as crianças que regressam da Alemanha seguem depois para a sede da Kimbo Liombembwa, um pequeno espaço situado no Hospital Pediátrico Dr. David Bernardino. É aqui que são oficialmente entregues aos pais, que voltam a abraçar os filhos depois de vários meses de ausência. A separação não é fácil, mas os resultados compensam, reconhecem muitos pais.
Foto: DW/M. Sampaio
Perda de Rosalino Neto
A Friedensdorf e a Kimbo Liombembwa lamentam a perda do médico Rosalino Neto, que dirigia a organização parceira. O fundador da Ordem dos Médicos de Angola morreu em junho passado, aos 63 anos, vítima de doença prolongada. Acompanhou as operações de ajuda desde o início e esteve várias vezes na Alemanha. As primeiras crianças chegaram à Alemanha em 1994, durante a guerra civil que durou 27 anos.
Foto: DW/M. Sampaio
Últimas recomendações
No dia da entrega das crianças aos pais, a equipa da Friedensdorf faz sempre um resumo dos tratamentos médicos realizados e deixa também uma série de recomendações. Muitas vezes é preciso continuar os exercícios de fisioterapia em casa ou trocar os sapatos ortopédicos quando estes deixarem de servir. Durante muitos anos, o médico Rosalino Neto traduziu as explicações da ONG aos pais.
Foto: DW/M. Sampaio
Alemanha, a última esperança
A Alemanha é a última esperança para muitos angolanos. O conflito no país terminou há 12 anos, mas a colaboração continua. Se antes se tratavam ferimentos causados pela guerra, hoje as doenças são causadas pela pobreza. A mortalidade infantil é uma das mais altas do mundo e metade da população vive abaixo do limiar da pobreza. O crescimento económico e os petrodólares não se refletem na saúde.
Foto: DW/M. Sampaio
Diagnósticos problemáticos
Os problemas de saúde das crianças são de vários tipos: infeções ósseas, malformações congénitas, queimaduras graves, luxações, fraturas expostas, subnutrição. Algumas sofreram acidentes e não foram devidamente tratadas na altura. E os pequenos corpos escondem também outros problemas não visíveis. Diagnósticos precisos sobre o seu estado de saúde também são um problema, segundo a Friedensdorf.
Foto: DW/M. Sampaio
Kimbo Liombembwa
Criada há 13 anos, a organização parceira angolana tem equipas de voluntários por todo o país para identificar crianças com doenças que não podem ser tratadas localmente. Já foram beneficiadas cerca de três mil crianças de várias regiões de Angola. A viagem das províncias até Luanda chega a durar três dias. Para as ações de ajuda a “Aldeia da Paz” conta também com o apoio da Embaixada da Alemanha.
Foto: DW/M. Sampaio
Comunicação sem fronteiras
A maior parte das crianças não sabe falar alemão, mas a comunicação não é um problema. "Sabemos algumas palavras em português, como 'tá fixe'. E quando querem ir à casa de banho, xixi todos entendem!", explica a porta-voz da Friedensdorf. Além disso, as crianças comunicam por sinais. A bordo costumam também seguir crianças que viajam para a Alemanha pela segunda vez e que servem de tradutoras.
Foto: DW/M. Sampaio
Ciclo da ajuda continua
No Aeroporto de Luanda, dois autocarros transportam as crianças até ao avião. Durante a viagem, redobram-se os cuidados com os novos pacientes. Quando chegam à Alemanha, os casos mais graves são imediatamente encaminhados para os hospitais. As restantes crianças seguem para a Friedensdorf, em Oberhausen. O ciclo da ajuda não fica por aqui. A próxima viagem já está agendada para maio de 2015.