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Angola: Vítimas de demolições em Luanda processam Estado

5 de maio de 2022

Vítimas das demolições nos bairros adjacentes ao novo Aeroporto Internacional de Luanda decidiram processar judicialmente o Governo. Descontentes e ao relento, acusam o Estado de "vigarice" e de os tratar como "lixo".

Angola Zola Bambi und Rafael Morais
Foto: Borralho Ndomba/DW

A conferência de imprensa convocada esta quinta-feira (05.05) pela Associação SOS Habitat, pelo Observatório para Coesão Social e Justiça e pelas vítimas das demolições ficou marcada por choros e pelo desmaio de algumas idosas que perderam as suas habitações.

Antónica Sebastião, de 86 anos, diz que foi naquela região onde está a ser construído o novo Aeroporto Internacional de Luanda que viveu a vida toda.

"Agostinho Neto, primeiro Presidente de Angola, quando veio já nos encontrou [lá]. Quando o ex-presidente José Eduardo dos Santos começou o aeroporto, nós estávamos lá", conta.

Receberam dinheiro

Antónica Sebastião relata que, antes das demolições, foram contemplados com um apoio financeiro equivalente a 58 euros, no âmbito de um programa do Governo angolano - o Kwenda - que visa ajudar as famílias em situação de pobreza e vulnerabilidade.

Demolições já desalojaram centenas de famílias em vários bairros junto ao novo aeroporto da capital angolana, LuandaFoto: Ndomba Borralho/DW

"Nos meses passados recebemos 25 mil kwanzas do Kwenda e ficámos contentes pelo dinheiro que recebemos do Estado. Afinal estavam a comprar-nos os terrenos e as casas?", questiona a idosa.

"Para o nosso Estado angolano, o povo é lixo", critica, alertando para o facto de estarem a dormir ao relento.

Antónica Sebastião exige mais respeito para com o povo da região do Icolo e Bengo. "O Estado abusou muito. O João Lourenço está a abusar. Passámos por vários vigaristas, mas este é demais. Até tanque de água mandou partir", lamenta.

Zola Bambi, da ONG Observatório para Coesão Social e Justiça e um dos advogados constituídos pelas famílias desalojadas, diz que já avançou com um processo para responsabilizar as autoridades angolanas.

"Neste momento foi interposto uma providência cautelar no tribunal para garantir os interesses dos cidadãos afetados neste processo. A providência foi interposta contra a administração municipal do Icolo e Bengo, contra o Governo provincial de Luanda, contra os ministérios de tutela e contra o Estado angolano", avançou o advogado.

Zola Bambi (à esquerda), da ONG Observatório para Coesão Social e Justiça e um dos advogados constituídos pelas famílias desalojadas, e Rafael Morais (à direita), coordenador da SOS HabitatFoto: Borralho Ndomba/DW

Impedir que os "poderosos" se instalem

Segundo o jurista, muitos bairros de Luanda já demolidos, supostamente por serem reserva fundiária do Estado, estão hoje repletos de empreendimentos privados.

Zola Bambi explica que a providência cautelar visa impedir o surgimento de projetos comerciais na zona das demolições. "Vamos entrar com a providência para evitar que as pessoas poderosas, que têm meios financeiros, sejam os proprietários dessas áreas onde não se admite a presença do cidadão que não tem meios”, assevera.

Por sua vez, o coordenador da SOS Habitat, Rafael Morais, desafia o Governo a apresentar provas de que terá indemnizado as famílias que considera invasoras.

"Se algum dia, essas famílias foram indemnizadas, o Governo que apresente o comprovativo da indemnização e apresente a família que foi indemnizada", intimou.

Rafael Morais afirma que as demolições vão continuar e vão desestruturar muitas famílias, uma vez que os populares estão a ser reassentados a 90 quilómetros do local onde moravam.

"Lá não têm serviços que lhes permitam continuar com os seus trabalhos. São essas consequências que, no mínimo, o Estado devia acautelar antes de agir", concluiu.

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