Argélia exige a Paris o "respeito total do Estado argelino"
Lusa
11 de outubro de 2021
São as primeiras declarações do Presidente Abdelmadjid Tebboune, desde a crise diplomática desencadeada pelo seu homólogo francês. Macron questionou a existência da "nação argelina antes da colonização francesa".
Publicidade
O regresso do embaixador argelino em França, chamado no início deste mês a Argel após observações críticas do Presidente francês, Emmanuel Macron, está "condicionado ao respeito total do Estado argelino" por Paris, disse este domingo (10.10) o Presidente argelino, Abdelmadjid Tebboune.
O eventual regresso do embaixador da Argélia em França "está condicionado ao respeito da Argélia, ao respeito total do Estado argelino", afirmou Tebboune à comunicação social argelina, na primeira declaração pública em reação às observações do seu homólogo francês.
"Esquecemos que [a Argélia] foi uma colónia francesa (...). A história não deve ser falsificada", acrescentou.
O Presidente Tebboune, que é também comandante supremo das forças armadas e ministro da Defesa, sublinhou que "o Estado está de pé com todos os seus pilares, com o seu poder, o poder do seu exército e do seu povo valente".
Objetivos eleitorais escondidos?
O chefe de Estado sublinhou ainda, em relação à história argelina e à colonização francesa, que "não se pode fingir que nada aconteceu". Quanto ao "resto, são assuntos internos deles", afirmou, sugerindo a existência de eventuais objetivos eleitorais escondidos nas observações críticas de Macron.
Macron desencadeou uma crise diplomática com Argel através de comentários relatados no dia 2 de outubro, pelo jornal francês Le Monde, em que terá descrito o país como um "sistema político-militar" com uma "história oficial reescrita", durante um encontro com descendentes de figuras proeminentes da guerra de independência argelina.
De acordo com o Le Monde, o Presidente francês terá ainda declarado que "a construção da Argélia como nação é um fenómeno a ser observado".
"Havia uma nação argelina antes da colonização francesa? Esta é a questão (...)", afirmou Macron. Esta foi uma das passagens que mais ofendeu a opinião pública e oficial argelina.
A 2 de outubro, Argel decidiu chamar de "imediato" o seu embaixador em Paris e proibiu os aviões militares franceses da operação Barkhane - uma operação anti-insurgência radical islâmica no Sahel, constituída por forças francesas - de sobrevoarem o seu território.
Na terça-feira passada, o Presidente Emmanuel Macron afirmou a intenção de "apaziguar" o tema da memória entre a França e a Argélia e apelou a Argel para que "avance junto" com Paris e "reconheça todas as memórias".
Arte africana à espera de ser devolvida
Museus europeus mostram-se muitas vezes relutantes em devolver obras de arte africanas roubadas durante o tempo colonial. Presidente francês Emmanuel Macron anunciou que a França irá devolver 26 peças ao Benim.
Foto: picture-alliance/dpa/S. Glaubitz
Estátuas roubadas
Estes três totens - meio humanos, meio animais - fazem parte da coleção do Museu do Quai Branly, em Paris. São originários do reino do Daomé, onde fica hoje a República do Benim. A antiga colónia francesa declarou que os artefactos foram saqueados e, em 2016, pediu a sua devolução. A França negou. No entanto, voltou atrás na decisão: 26 peças do museu deverão ser agora devolvidas ao Benim.
Foto: picture-alliance/dpa/S. Glaubitz
Máscaras dos Dogon
Estas máscaras do povo Dogon também estão no Musée du Quai Branly, em Paris. São originárias de uma região onde está hoje o atual Mali e foram levadas para França na sequência de uma expedição nos anos 30. Máscaras como estas serviram de inspiração a pintores como Pablo Picasso ou Georg Baselitz. Documentos da altura detalham a crueldade com que os "exploradores" enganaram a população local.
Foto: picture-alliance/dpa/H. Kaiser
Afugentador de colonizadores
De olhos bem abertos e com pregos cravados no corpo, esta Mangaaka é uma figura de poder do Congo usada por volta de 1880 para proteger uma aldeia africana contra as forças coloniais. Em todo o mundo, há apenas 17 figuras destas. Uma delas está no Museu Etnológico de Berlim. Estima-se que 90% da herança cultural africana foi levada para a Europa.
Foto: Imago/ZUMA Press
Deus Gu
O general francês Alfred Amédée Dodds desempenhou um papel preponderante na colonização da África Ocidental. Em 1892, os seus homens saquearam o Palácio do rei Béhanzin em Abomei, a capital do reino do Daomé. Um dos objetos saqueados foi a estátua do deus Gu, em bronze.
Foto: Imago/UIG/W. Forman
Rei Ghezo
O general Dodds também levou tronos e portas com relevos para a Exposição Universal de Paris, em 1878, no Palácio de Trocadéro. São bens que o Benim também exige de volta.
Foto: Imago/United Archives International
Bens confiscados
O general francês Louis Archinard conquistou, em 1890, a cidade de Segu, a capital do reino de Toucouleur. Os bens saqueados na altura - jóias, armas e manuscritos - estão hoje em exibição nas cidades de Paris e Le Havre. Desde 1994 que os descendentes do fundador do Império 'Umar Tall pedem a devolução dos objetos. A região pertence hoje ao Mali.
Foto: picture-alliance/akg-images
Não foi só em África
Os saques não ficaram por aqui. Os europeus também roubaram muitas peças de outros continentes. Por exemplo, em 1880, o navegador norueguês Johan Adrian Jacobsen foi a mando do Museu Etnológico de Berlim à América do Norte, à procura de objetos de culturas indígenas. As peças saqueadas em túmulos do Alasca foram devolvidas em 2018.